Advocacia deve ter divulgação como qualquer outra profissão

Marili Requia - Crédito Divulgacao
Marili Requia - Crédito Divulgacao
Marili Réquia comenta discussão sobre mudança no código de ética da OAB
Fecha de publicación: 11/11/2019

A atividade de divulgação da advocacia deve ser tratada da mesma forma que acontece com outras profissões, afirma Marili Réquia, defendendo que advogados também possam divulgar seu trabalho, pois precisam ser vistos e lembrados por seus clientes. A advogada respondeu a perguntas do LexLatin em meio às discussões de mudanças no código de ética da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 

Formada em ciências jurídicas e sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, ela é pós-graduada em compliance pela mesma instituição. Faz parte do Grupo de Excelência em prevenção à lavagem de dinheiro e ao combate do financiamento do terrorismo do Instituto ARC de São Paulo e é integrante da Associação Internacional do Direito do Seguro no Brasil. 

O que levou a OAB a abrir a consulta pública para mudança no código de ética?

O grande número de pedidos dos jovens advogados por mudanças e pela modernização na área que insiste em manter hábitos conservadores e tradicionais que destoa do atual cenário de novas tecnologias e de informação rápida, moderna e com atualizações diárias.

Como avalia as mudanças propostas?

De grande valia para o mercado, pois é importante para os advogados serem vistos e lembrados por seus clientes. Além do mais, a advocacia deve ser vista como uma profissão como qualquer outra e como de fato é, que precisa de clientes e de recursos financeiros para sua manutenção e permanência e, sobretudo, a subsistência dos profissionais que dela fazem parte e que dependem economicamente como fonte de renda.

O Brasil possui mais de 1,3 milhão de advogados hoje, num mercado altamente competitivo. Não parece anacrônico regular a divulgação da atividade?  

A atividade da advocacia é altamente regulada e fiscalizada pela Ordem dos Advogados, que procura ter controle sobre as atividades de atuação e divulgação dos advogados determinando o que pode ou não ser feito em termos de opiniões, publicidade, notícias, críticas, publicações, divulgações, etc., se assemelhando muito à censura tão condenada por limitar a atuação de jornalistas, artistas e outros profissionais em décadas passadas. O advogado não tem o livre-arbítrio de divulgar seu trabalho da forma que entender conveniente segundo os critérios e necessidades do profissional ou do escritório.

Os advogados além de enfrentarem a alta complexidade jurídica e o excesso de burocracia por parte do judiciário, também enfrentam as regras impostas pela OAB que dificultam o exercício da advocacia, em função do controle e limitação exercidos pela entidade sobre a categoria, interferindo nas regras de divulgação e publicidade da atividade, impedindo enormemente o crescimento dos profissionais e impactando nos resultados financeiros dos mesmos bem como de seus escritórios.

Já no inicio, o Código de Ética e Disciplina da OAB, no capítulo que trata especificamente sobre a  Ética do Advogado, no Art. 5º, afirma que o exercício da advocacia é incompatível com qualquer procedimento de mercantilização. Entendemos que a atividade medica também não é mercantilista, mas os médicos fazem a divulgação da sua especialidade bem como de seus consultórios profissionais sem ferir a ética profissional e nem por isso incitam as pessoas a ficarem doentes para procura-los.

Já no  art. 7º, o referido código veda o oferecimento de serviços profissionais que impliquem, direta ou indiretamente, inculcação ou captação de clientela. O advogado é impedido de sair a campo para buscar clientes bem como de fazer publicidade para atrair clientela para seu escritório profissional.

Sabemos que os meios de comunicação sempre tiveram um papel fundamental para o crescimento, divulgação e popularização de produtos e serviços em qualquer setor da economia mundial, e na área da advocacia não pode ser uma exceção, insistindo em permanecer na contramão das demais atividades, ignorando o que os demais  atividades fazem para serem contratadas.

Como o advogado deve proceder para divulgar seu trabalho sem ferir as regras da OAB?

As atuais regras impostas pela OAB aos advogados são extremamente básicas e primarias, pois autoriza aos advogados coisas simples como  dar cartões aos clientes, divulgar seu currículo profissional, palestrar ou ministrar cursos, etc. Não permite divulgação ou propaganda do profissional ou do escritório. Segue a descrição de alguns artigos da norma:

Art. 28. O advogado pode anunciar os seus serviços profissionais, individual ou coletivamente, com discrição e moderação, para finalidade exclusivamente informativa, vedada a divulgação em conjunto com outra atividade.

Art. 29. O anúncio deve mencionar o nome completo do advogado e o número da inscrição na OAB, podendo fazer referência a títulos ou qualificações profissionais, especialização técnico-científica e associações culturais e científicas, endereços, horário do expediente e meios de comunicação, vedadas a sua veiculação pelo rádio e televisão e a denominação de fantasia.

§ 1º Títulos ou qualificações profissionais são os relativos à profissão de advogado, conferidos por universidades ou instituições de ensino superior, reconhecidas.

§ 2º Especialidades são os ramos do Direito, assim entendidos pelos doutrinadores ou legalmente reconhecidos.

§ 3º Correspondências, comunicados e publicações, versando sobre constituição, colaboração, composição e qualificação de componentes de escritório e especificação de especialidades profissionais, bem como boletins informativos e comentários sobre legislação, somente podem ser fornecidos a colegas, clientes, ou pessoas que os solicitem ou os autorizem previamente.

§ 4º O anúncio de advogado não deve mencionar, direta ou indiretamente, qualquer cargo, função pública ou relação de emprego e patrocínio que tenha exercido, passível de captar clientela.

§ 5º O uso das expressões "escritório de advocacia" ou "sociedade de advogados" deve estar acompanhado da indicação de número de registro na OAB ou do nome e do número de inscrição dos advogados que o integrem.

§ 6º O anúncio, no Brasil, deve adotar o idioma português, e, quando em idioma estrangeiro, deve estar acompanhado da respectiva tradução.

Art. 30. O anúncio sob a forma de placas, na sede profissional ou na residência do advogado, deve observar discrição quanto ao conteúdo, forma e dimensões, sem qualquer aspecto mercantilista, vedada a utilização de outdoor ou equivalente.

Art. 31. O anúncio não deve conter fotografias, ilustrações, cores, figuras, desenhos, logotipos, marcas ou símbolos incompatíveis com a sobriedade da advocacia, sendo proibido o uso dos símbolos oficiais e dos que sejam utilizados pela Ordem dos Advogados do Brasil.

§ 1º São vedadas referências a valores dos serviços, tabelas, gratuidade ou forma de pagamento, termos ou expressões que possam iludir ou confundir o público, informações de serviços jurídicos suscetíveis de implicar, direta ou indiretamente, captação de causa ou clientes, bem como menção ao tamanho, qualidade e estrutura da sede profissional.

§ 2º Considera-se imoderado o anúncio profissional do advogado mediante remessa de correspondência a uma coletividade, salvo para comunicar a clientes e colegas a instalação ou mudança de endereço, a indicação expressa do seu nome e escritório em partes externas de veículo, ou a inserção de seu nome em anúncio relativo a outras atividades não advocatícias, faça delas parte ou não.

Art. 32. O advogado que eventualmente participar de programa de televisão ou de rádio, de entrevista na imprensa, de reportagem televisionada ou de qualquer outro meio, para manifestação profissional, deve visar a objetivos exclusivamente ilustrativos, educacionais e instrutivos, sem propósito de promoção pessoal ou profissional, vedados pronunciamentos sobre métodos de trabalho usados por seus colegas de profissão.

Parágrafo único. Quando convidado para manifestação pública, por qualquer modo e forma, visando ao esclarecimento de tema jurídico de interesse geral, deve o advogado evitar insinuações a promoção pessoal ou profissional, bem como o debate de caráter sensacionalista.

Porém, o advogado que está em início de carreira não concorre em condições de igualdade no mercado com os advogados veteranos porque ainda não têm um currículo robusto com especializações,  pós-graduação ou com doutorado. Também não são convidados a dar aulas ou palestras, pois o mercado não os conhecem, e a cada dia se torna mais difícil a atuação do profissional. Com isso, o advogado em inicio de carreira  não está em  igualdade de condições de trabalhar em relação aos advogados mais antigos, pois estão galgando os primeiros passos profissionais. Contudo, nota-se que os profissionais que têm conhecimento e experiência de mercado  não querem abrir espaço para a  concorrência de outros profissionais, fazendo dessa forma reserva de mercado.

Percebe-se que essas regras limitadoras são impostas à massa de  advogados medianos, no entanto, quem demonstra levar ampla vantagem em relação aos colegas são os advogados que atuam como membros dentro da instituição. Usam diariamente as redes sociais para autopromoção,  fazendo propaganda e marketing direto usando a máquina institucional como pano de fundo para divulgação do seu nome e dos escritórios jurídicos dos quais fazem parte. Usam os cargos e títulos que lhes foram conferidos para promoverem seu trabalho, mostrando para a sociedade que são advogados, e com isso fazem direta e indiretamente captação de clientela, fazendo jus a máxima que profere  "quem não é visto, não é lembrado". 

Com isso, esses membros da OAB se destacam entre os demais colegas sem pagarem nada por isso, e melhor, sem serem censurados, pois além de se autopromoveram são os mesmos que são convidados e indicados a palestrar dentro da própria instituição e fora dela. Através dessas ações, fazem captação de clientela e seus nomes e escritórios são divulgados com frequência.

Um advogado não pode ter dentro do seu escritório o símbolo ou a bandeira da OAB para fazer uma foto e postar nas redes sociais, já os membros de ordem usam a bandeira da instituição como pano de fundo até para comemorarem aniversários e se promoverem nas redes sociais, pois é obvio que um membro da OAB é um advogado.

Apesar da OAB ser um conselho de classe e pertencer a todos os advogados indistintamente, não são todos os advogados que querem ou que podem fazer parte da mesma, pois é o presidente  que determina a entrega de portarias para que um advogado possa ou não fazer parte da entidade e trabalhar em prol da coletividade de advogados. Via de regra, quem está dentro da OAB fazem parte da mesma chapa eleitoral e que passam a ocupar cargos de confiança, pois pagaram para fazer parte da chapa eleitoral e com isso passam a  usar a instituição para se autopromoverem.

Se aos demais advogados é proibida a exposição em redes sociais, para os membros integrantes da política institucional também deveria ser.

Quais os riscos para o mercado de uma regulação pouco eficiente desta questão?

Os riscos já vêm sendo sentindo no mercado há muitos anos, importante lembrar que, segundo divulgação, nos últimos dez anos foram abertos 11 mil novos escritórios de advocacia somente em São Paulo. Desse total, cerca de 40% não existe mais. Os escritórios fecharam por falta de clientes e dificuldades financeiras para arcar com as despesas da empresa ou encontraram outras atividades menos burocráticas e mais dinâmicas para atuar. Estamos perdendo colegas em função do excesso de regulamentação e burocracia características da atividade.

Se continuarmos nesse ritmo, em pouco tempo essa estatística irá dobrar, pois a cada dia existe um número maior de advogados desistindo da profissão e trabalhando em outras atividades profissionais simultaneamente com a advocacia para complementar seus rendimentos, isso quando não se dão por conta e desistem definitivamente de atuar.

Em função dessa e de outras regulamentações restritivas à publicidade dos advogados, estamos prejudicando a classe, fechando escritórios por falta de clientes, vendo advogados sem condições de pagar a anuidade da própria entidade de classe e, com frequência, encontramos advogados trabalhando como motoristas de aplicativos, desistindo da advocacia, e usando a publicidade e a tecnologia a seu favor para sobreviver.

 

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