Eduardo Leite: “Para liderar há que escutar”

Eduardo Leite: “Para liderar hay que escuchar”
Eduardo Leite: “Para liderar hay que escuchar”
Fecha de publicación: 06/12/2016
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Eduardo Leite
Eduardo Leite

Eduardo Leite foi o primeiro latino-americano em ser eleito Chairman Global de Baker & McKenzie. Presidiu a firma durante 6 anos, mas recentemente saiu do cargo dando passo a Paul Rawlinson como sucessor. Seus planos como presidente emérito e sócio sênior se situam em Nova Iorque, cidade desde a que quer seguir potenciando o desenvolvimento de negócios e a conexão de duas regiões às que tem dedicado sua vida, EE.UU. e América Latina

Poderia identificar a principal qualidade que lhe permitiu chegar a converter-se no primeiro Chairman latino-americano de BM?

É uma pergunta que me faço desde há anos. Acho que esta foi a primeira vez que um latino assumia a presidência duma firma global. Foi uma responsabilidade muito grande porque a gente sempre quer deixar um legado e abrir fronteiras para outros. Acho que teve que ver com o momento que vivia a firma, que era o seguinte: Vinha uma tendência muito lógica desde 1999, quando elegemos Christine Lagarde -  a atual Diretora-Gerente do FMI - como nossa Presidente. Ela era sócia no escritório de Paris. A Europa estava em ebulição, era o centro de operações. Era o tempo em que a Espanha e a Itália cambiavam ao euro. Acho que fizemos muito bem em escolhê-la, não somente por ser mulher – o qual foi importante no sentido de abrir nossa mente e espaço a outras mulheres, Christine era um bom exemplo a seguir – mas também porque a Europa mostrava o caminho do futuro.

Em 2004, quando Christine termina seu mandato, é o tempo de Bush nos EE. UU. mercado que estava em pleno desenvolvimento, e o mais relevante naquele momento. A firma, então, se dirigiu aos EE.UU. e escolhemos um sócio de Chicago, John Conroy, que era responsável do Comitê Executivo.

O 2010, contudo, ano no que começo meu mandato como Chairman, é o período dos BRICS. Estavam a todo vapor e a firma então se dirige à América Latina, buscando alguém que tenha uma visão diferente. Acho que esse foi o fator externo.

Desde o ponto de vista pessoal, eu acho que as qualidades, segundo dizem os sócios, foram empatia e inteligência emocional. Para mim, isso é muito importante, colocar-se os sapatos dos outros, respeitar a diversidade e a cultura. É muito difícil, por exemplo, chegar a China e ser bem recebido se a gente ainda pensa como ocidental. Essa adaptabilidade é muito importante. Em segundo lugar, naturalmente, o conhecimento do negócio e da firma foi algo essencial. Diria que outra qualidade é um pouco de firmeza. Talvez por minha posição sênior, transmiti empatia ao mesmo tempo que firmeza, o qual é essencial. E por último, uma “pitadinha” de bom humor, porque se a gente não aproveitar o cargo, a vida fica muito pesada.

Quando falava de inteligência emocional, o dizia sobre tudo pela condução dos grupos dentro da firma, ou liderança e a inspiração. Para liderar a gente tem que primeiro saber escutar e entender muito bem o que preocupa os empregados. O mesmo acontece com os clientes. Quanto mais a gente se colocar os sapatos do cliente, entende melhor sua indústria, sua dinâmica interna e o mercado no que concorre, o qual faz mais efetivo a liderança.

Sobre as vivências destes últimos seis anos como Chairman, poderia assinalar os momentos mais difíceis que tem tido que enfrentar? De igual maneira, poderia assinalar os mais satisfatórios?

Acho que o momento mais difícil foi durante a invasão da Criméia, administrando as ansiedades e as angústias de nossa gente em Kiev (Ucrânia), que estava muito vinculada à equipe de Moscou, na Rússia. Faziam parte duma unidade administrativa única. Nós nos organizamos em unidades administrativas porque como empresa tem mais sentido. Em meio da guerra, isto foi muito difícil. Administramos as coisas o melhor que pudemos e a relação de nossa gente se manteve acima de toda a ansiedade e disputas entre países. Esse tipo de situações é muito difícil. São inesperadas, por mais que a gente se preparar como líder e administrador. Nesse momento se põe à prova a capacidade e o endurecimento de cada um.

Como momentos agradáveis penso que sempre aproveitei a camaradaria que se vive na firma. BM mistura um pouco de amizade com o negócio e a comunicação entre amigos é muito forte. Os momentos mais interessantes os tenho tido quando por exemplo visito um cliente e nos reconhecem isto mesmo. Essa satisfação é inigualável.

Uma vez terminado seu período como Chairman de Baker & McKenzie, considera que tem deixado uma marca particular? Qual é seu legado?

Em alguns aspectos tem sido um legado do negócio. Crescemos muito nos 6 anos que estive a cargo da firma. Abrimos 10 escritórios novos em diversos países, desde a Turquia até a Coreia do Sul, ademais de um centro de serviços em Belfast que é um sucesso. Crescemos muito, tanto em talento como em nossa relação com os clientes.

Tal vez o que mais me orgulha é o trabalho que temos feito em diversidade e nosso rol nas comunidades onde atuamos. Para mim isso é muito importante. Acho que a firma não pode ser somente um negócio. Há que buscar as utilidades, sem utilidades não há investimento. Fizemos um lindo trabalho, desde colaborar em projetos com as Nações Unidas até em países como Nepal em questões de desigualdade de gênero. São coisas muito emocionantes e que me orgulham mais que outros sucessos profissionais. Mas a firma também se institucionalizou muito. Temos ajudado a melhorar a visão que os advogados têm da profissão. Acho nos membros que são profissionais, não somente advogados, e cujo papel vai desde gerenciar equipes de clientes até dirigir a firma para discutir estratégias de alto nível.

Também gosto de falar da profissão em 3D. Ser advogado hoje é um desafio muito importante, mas ao mesmo tempo é uma oportunidade única para o que queira investir em sua carreira e em seu futuro. Minha visão da profissão em 3D é a de primeiro ser um praticante com uma especialidade. Ser advogado generalista é um luxo que a gente se pode dar depois de muitos anos, mas a carreira há que começar com uma especialidade. A segunda é conhecer uma indústria específica e entendê-la muito bem. Interessou-me muito a indústria das energias desde faz muitos anos. Fui entendendo-a cada vez mais, trabalhando mais de perto com os clientes na área. Isso nos dá umas vantagens frente a outros advogados, porque alguns clientes esperam e exigem que conheças os detalhes. A terceira é entender o cliente e dedicar-se a alguns em concreto. Se eu gostasse da indústria informática, meus clientes preferivelmente teriam que ser os clientes que vêm do Silicon Valley, os startups, entender muito bem sua indústria... Acho que também existe uma quarta dimensão que para o advogado jovem é inovação e tecnologia. Se eu começasse minha carreira hoje, acho que o primeiro que faria é um curso em programação de computadores, porque há que entender como funciona a inteligência artificial, o software que vai utilizar — em certa maneira isto vai me substituir como profissional, mas vai me servir como trampolim para ser muito mais eficiente.

Quê conselho daria a seu sucessor, Paul Rawlinson?

O único conselho que lhe daria é que faça algo que já faz com frequência, sorrir principalmente. Quando a gente chegar no escritório e entrar no elevador o primeiro que há que fazer é pôr um sorriso no rosto. Se o Chairman não vier com um sorriso e com postura de “tudo está bem, somos fortes, somos otimistas”, isso é muito arriscado. Por isso sempre digo que o melhor conselho é “smile in the elevator, don't forget to do so”.

Quê lhe tem o futuro? Quê planos tem para esta nova etapa profissional?

O plano agora é minha mudança a Nova Iorque. No 1 de janeiro estarei lá. Desde ali, ajudarei a firma em vários aspectos, primeiro na conexão latino-americana. Somos a maior firma na América Latina, temos quase 900 advogados se não estou errado. Temos que aproveitar esse potencial, que é enorme, e as sinergias, que são importantíssimas. Alguém com conhecimento do negócio, da firma, dos clientes e das instituições, tem um papel muito importante em Nova Iorque. Esse é o plano imediato, seguir com o foco no desenvolvimento dos negócios e a relação com os clientes. O segundo é crescer ali porque temos muito espaço para isso. Baker não tem a força que deveria ter num centro como Nova Iorque. Nisso pretendo ajudar, também em recrutamento, integração e outros trabalhos ao longo prazo. Sempre gostei da conexão EE.UU. – América Latina, é o que tenho feito toda minha vida. Agora é mais poder ajudar na conexão da Europa com a região e a Península Ibérica tem muito que ver nisto. Já veremos a presença de algumas grandes firmas espanholas.

Poderia compartilhar alguma lembrança especial ou algum momento que tenha um significado importante de seus primeiros anos em BM?

Tive mentores muito bons. Quem me recrutou para vir trabalhar em BM foi uma sócia do escritório de São Paulo. Naquele tempo não era sócia, ela fazia seu mestrado e eu estava ainda na Faculdade, mas assistia os cursos de nível de mestrado convidado por um professor. Como soube que eu falava espanhol, inglês e português lhe pareceu que tinha bom perfil desde o princípio. Meus mentores têm sido fantásticos. Alguns me jogaram na água, outros me ensinaram muito. Mas de tudo se aprende. Acho que a lembrança mais significante foi nos primeiros anos de minha carreira. Tinha um cliente que tinha um processo fiscal que todos davam por perdido. Tive a ideia de que seria uma boa oportunidade para fazer uma apresentação oral junto ao Tribunal Administrativo. Preparei-me tanto que acabamos ganhando com 8 votos de 10 a favor. Quando saí da sessão da Audiência, não sei porque, me invadiu a insegurança. Senti que não o tínhamos ganho. Foi um momento de euforia e ao tempo de grande dúvida pessoal. Mas isso é típico do princípio da carreira e nunca vou esquecer.

Implementar uma agressiva estratégia de preços a nível global - como o está fazendo BM - lhes permite posicionar-se melhor para concorrer e captar novos clientes, bem como mais trabalho a nível global e internacional. Quais são os desafios que têm enfrentado para homologar esta política?

Eu não classificaria nossa estratégia de preços como agressiva. Eu diria que é criativa e que se ajusta às necessidades de nossos clientes e do mercado. Pode que seja um pouco agressiva se pensarmos em que há firmas que não têm cambiado nada, o qual creio que é um erro muito grave. Os advogados são, por educação e por formação, muito conservadores. Custa-lhes entender os possíveis benefícios duma vantagem que em princípio é para os clientes. Demonstrar aos advogados que a vezes um preço fixo, como o fazem nossos expertos em pricing – equipe fantástica, liderado por Stuart J T Dodds – é uma tarefa árdua, cambiar essa mentalidade custa muito. Mas uma vez que os advogados entenderem, abraçarem e adotarem o novo conceito, se convertem nos mais fiéis seguidores.

Por outro lado, treinar a nossa gente é importante. Até 2007, antes da crise, a questão de preços era de taxa única por norma geral. O desafio maior foi cambiar a mentalidade de nossos advogados. A grande vantagem foi trazer grandes profissionais. Uma das grandes coisas que minha equipe pôde lograr foi profissionalizar ainda mais a firma, e respeitar os outros profissionais que têm muito que ensinar-nos. Os advogados por formação cremos que sabemos de tudo e esse é um erro muito grave.

Entendemos que BM se enfocará em crescer na China, Londres e Nova Iorque. Considera que América Latina é um mercado “maduro”?

Não. O foco na China depende puramente e exclusivamente da estratégia com relação aos clientes. Essas três jurisdições são importantíssimas em termos de futuro. Londres o é por sua capacidade de seguir sendo o centro para negócios que venham do Oriente médio e da África, que são lugares estratégicos para BM. Nova Iorque por ser a conexão mundial e por sua importância nos EE.UU. e América Latina. No caso da China o é pelo futuro da Ásia Pacífico. Não quer dizer que estejamos deixando de lado outras regiões. O crescimento no Sudeste Asiático segue sendo importantíssimo e seguimos investindo. Mas a definição de três centros principais se faz para demonstrar que este é o foco e que aqui temos espaço para crescer. Na China, conseguimos a primeira licença como firma estrangeira - o que se chama o “joint cooperation” - para exercer a prática do direito chinês, que é uma grande vantagem, um investimento muito grande. Em Londres temos crescido de forma importante. Em Nova Iorque nos últimos 20 meses se incorporaram à nossa equipe uns 16 advogados sêniores que vêm de várias firmas.

Eu não diria que o mercado latino-americano é um mercado maduro, todo o contrário, tem muito potencial e muitas oportunidades. Quando a gente pensa num mercado maduro, também o vê algo saturado. Na América Latina, temos muito espaço para crescer. Ao mesmo tempo, a sinergia entre países da região não se aproveita muito bem. Digo-o sobre tudo pelo Brasil, Uruguai e por outros, que olham muito para os EE.UU. e a Europa. Recentemente olham muito para a China também. Esquecem-se então de observar seus irmãos e as oportunidades que têm em sua casa. Ainda é muito tímido o investimento que existe do Chile no Brasil, do Brasil no Peru, etc. As firmas regionais estão ainda em fase de “adolescência”. Acho que isso é um grande filão de trabalho e oportunidades.

Qual tem sido o impacto do Brexit para seus escritórios de Londres e o continente europeu?  Na mesma linha, quê impacto crê que terá a eleição de Donald Trump como presidente dos EE. UU.?

Com relação a Londres, sem dúvida quando se votou o Brexit, cada grupo de prática esteve trabalhando muito de cerca com os clientes sobre o que pode acontecer e sobre quais são as alternativas. Acho que fizemos um bom trabalho. O quê nos aconteceu ou o quê nos pode acontecer em Londres não muda nossa estratégia. O foco lá segue vivo e igual, mas logicamente com mais cautela. Neste momento não temos cambiado nossa estratégia nem pensamos diminuir o padrão de crescimento. A diferença de BM com outras firmas que são mais inglesas e estão mais integradas no Reino Unido, é que nosso escritório de Londres não depende tanto dos negócios do Reino Unido, senão que tem sobre tudo conexões com empresas de até 200 países. A diversificação de nossa firma nos permite mitigar o impacto do Brexit.

O mesmo ocorre com a eleição de Trump nos EE.UU. Nova Iorque vai seguir sendo um centro muito poderoso, à margem de que os acordos multilaterais de comércio possam cambiar. Seguirá sendo um centro financeiro importante. É muito difícil fazer um prognóstico por agora. Mas Trump tem dito que há coisas que vão ver-se afetadas, claro. Sua equipe vai revisar acordos como o TTP o o NAFTA. Esperamos que não seja tão grave. É isto ruim para nós? Ao fim e ao cabo não o é tanto, porque isto nos dá mais trabalho. Pode ser problemático e criar certo momento de instabilidade para os negócios globais, porque os planos de um empresário se fazem a 10 ou 20 anos. Talvez mudem o âmbito regulatório, um tratado de comércio, etc., mas os empresários sabem ajustar-se e às vezes adiantar-se aos câmbios.

Eu diria que o empresário latino-americano tem uma peculiaridade que o faz especial, e é que na América Latina em geral a gente vive sempre num sobressalto, de crise em crise. Um dia tudo está muito bem e logo tudo se torna um problema. Isto faz que o empresário seja muito adaptável e maleável. Eu acho que isso oferece uma oportunidade aos empresários latinos, ora em seus negócios como diretores ora como executivos de companhias de outros países. Acho que essa adaptabilidade e maleabilidade são uma vantagem, se a aproveitarmos bem.

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