"O advogado, por natureza, é um péssimo gestor"

Luiz Augusto Azevedo Sette fala como CEOs podem otimizar processos nos escritórios
Luiz Augusto Azevedo Sette fala como CEOs podem otimizar processos nos escritórios
Luiz Augusto Azevedo Sette fala como CEOs podem otimizar processos e as barreiras que firmas brasileiras enfrentam para entrar nos países do mercado latino-americano.
Fecha de publicación: 16/09/2020

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Ele é líder da firma que leva o seu nome e o da família, um dos principais escritórios de advocacia brasileiros. Luiz Augusto Azevedo Sette é sócio e coordenador da equipe de societário e fusões e aquisições no escritório de São Paulo. O advogado, que tem mais de 20 anos de experiência na assessoria jurídica, também é especialista em contratos comerciais, investimentos estrangeiros e propriedade intelectual, especialmente para os setores de telecomunicações, internet e tecnologia da informação.

Num momento em que a tecnologia ganha mais importância na atuação das firmas em todo o mundo o managing partner aproveita seu know-how dos tempos em que foi general counsel da Microsoft Brasil e lead regional general counsel da Microsoft Latin America, liderando um grupo de mais de 160 advogados, em dezenas de subsidiárias, no suporte jurídico de transações comerciais ao redor do mundo no valor de US$ 58 bilhões.

Em entrevista à LexLatin, Luiz Sette fala da atuação dos CEOs frente aos escritórios do país, modelo de negócio e analisa as barreiras e desafios que as firmas brasileiras enfrentam para entrar no mercado latino-americano.

O que a experiência na Microsoft tem te ajudado com o escritório nesse momento em que as empresas estão usando mais tecnologia?

LS: Fiquei 11 anos e meio na Microsoft e aprendi muito sobre gestão em um emprego que a gente vivia tecnologia 24 horas por dia. Passei muitos anos nos Estados Unidos morando e trabalhando lá, liderava a função jurídica da Microsoft toda fora dos EUA, então tinha responsabilidade direta em quase todas as subsidiárias do mundo inteiro.

Tudo que estamos vivendo hoje, como integração das equipes, era muito comum para nós. Esse uso intensivo de tecnologia que estamos fazendo hoje veio como algo muito natural para mim. Acho que todos os escritórios tiveram um ganho de produtividade com esse uso intenso de tecnologia.

Que tipo de uso da tecnologia você trouxe para esse momento que estamos vivendo?

LS: Nos adaptamos a usar softwares de comunicação e de vídeo, de uma hora para outra passou a ser essencial. Existem outras ferramentas de gestão e de cooperação que as pessoas estão passando a usar mais.

Fizemos um curso interno de legal thinking e legal design e realizamos uma competição interna de legal design. Hoje as pessoas estão se ambientando, estão abertas ao uso de tecnologia. Temos que aproveitar os momentos de crise, de ansiedade e de mudança e plantar a semente para que as pessoas pensem fora da caixa.

Uma mudança que demorava anos hoje está sendo feita em quanto tempo?

LS: O serviço jurídico é um pouco mais tradicional e o mercado ainda demanda contato pessoal. Não vejo uma disrupção, mas acho que talvez em três meses vamos fazer uma mudança que demoraria três anos.

Que princípios administrativos você trouxe da Microsoft para o escritório?

LS: A primeira coisa foi gestão. O advogado, por natureza, é um péssimo gestor. Há algumas raras exceções e eu me incluo como uma dessas exceções. Gestão obviamente você aprende na escola e aprende fazendo. Como advogados, nos preocupamos com nossos deveres perante ao cliente. Mas olhar para dentro é importante, os escritórios têm pouco apego a processos internos. Processos externos temos muito, principalmente com o cliente. É preciso criar mentalidade de gestão de empresa, não só grupo de profissionais.

O Brasil, por ser um país continental e com um grande mercado interno, muitas vezes fica de costas para os outros países da América Latina. Existe ainda a barreira da língua. Por que as firmas brasileiras não estão presentes em outros países da região?

LS: Três pontos devem ser considerados para responder sua pergunta. O primeiro é a barreira da língua, ela é óbvia. O segundo é a barreira do número limitado de clientes brasileiros que estão investindo na América Latina.

Escritórios americanos e londrinos têm uma língua universal. As empresas deles nascem multinacionais, abrem operações no mundo inteiro e acompanham os clientes.

É difícil os escritórios brasileiros pensarem em investir no Peru, na Colômbia ou no México, porque o mercado brasileiro olha para dentro. E esse é o terceiro ponto: é mais fácil olhar para dentro do que para fora.

Essa tendência é difícil transpor, a não ser que o Brasil passe realmente a ser uma potência e que tenhamos diversos players no mercado, empresas, clientes e que passem a usar o Brasil como hub para a América Latina como um todo.

Temos ainda problemas diversos: de imposto, de migração, de visto e de segurança. Os grandes escritórios daqui quando abrem operação fora fazem isso para captar clientes. Desde meados dos anos 1980 os grandes abriram sedes em Nova Iorque, Londres, mas com intuito maior de ter contato com clientes lá de fora e trazê-los para o Brasil.

Se você, que conhece bem a América Latina, mostrasse para os escritórios de advocacia brasileiros onde estão as oportunidades nesses países o que destacaria?

LS: A melhor oportunidade é network. Há um movimento de multilatinas e de investimentos regionalizados. Hoje prefiro desenvolver investimentos de network com os escritórios da América Latina do que abrir uma filial do Azevedo Sette em algum desses países.

As operações financeiras estão crescendo. Temos um número de IPOs enorme acontecendo neste momento, por exemplo. Mas esse é um clube fechado e vocês fazem parte dele. É difícil hoje para outros escritórios médios e pequenos entrarem nesse grupo?

LS: O escritório trabalha com um número de operações de M&A muito grande. Em IPO fazemos pouco, não somos um escritório peer 1. É um mercado de acesso mais restrito, porque o IPO no Brasil passa por ups and downs. Há grandes momentos sem abertura de capital, até períodos de um ano.

Para o escritório manter uma equipe dedicada a essa matéria sem ter operação é muito difícil. Alguns mantêm e na época de grande número de operações obviamente são mais competitivos que outros. E aí o mercado vira um círculo, vai referendando aqueles mesmos escritórios que vão fazendo um maior volume de operações.

Hoje no mercado brasileiro há um volume de dinheiro disponível impressionante e temos a menor taxa de juros da história. Então é natural que o número de operações cresça. Com o número de IPOs aumentando o de M&As cresce também, uma coisa está interligada à outra. Muitos dos IPOs são feitos para consolidações, para as empresas continuarem crescendo e esse é o grande target para continuar comprando empresas menores.

Os escritórios têm que investir em profissionais já reconhecidos nesse setor e trabalhar com uma diversificação de áreas maior?

LS: Têm que investir em capacitação interna ou pessoas com familiaridade na área, porque o mercado financeiro, de capitais e M&A você é reconhecido pelo número de transações, pelo histórico. Quanto mais você faz, mais fácil resolve o problema do cliente. Não é uma tarefa simples para que faz da primeira vez, mas é uma tarefa corriqueira para quem já fez 80 vezes. A melhor forma de começar é num escritório grande.

Com o dólar se valorizando frente ao real vamos ter empresas estrangeiras comprando empresas nacionais. Isso vai gerar mais trabalho para os escritórios?

LS: Vai. As empresas brasileiras estão baratas e são atraentes ao capital estrangeiro. O que precisa agora é uma definição de política econômica mais de longo prazo, porque esse capital só vai entrar quando tiver essa definição, se conseguirmos diminuir essa volatilidade. Temos recebido muitos clientes estrangeiros interessados na área de infraestrutura, com bilhões de dólares investimentos no longo prazo.

Fazendo um exercício de futurologia, como será o mercado jurídico em 2030 no Brasil? A legislação tributária será mais simples? As empresas que quiserem investir terão mais segurança jurídica? Como vai caminhar a indústria legal na sua visão?

LS: Teremos um investimento maior dos escritórios em tecnologia, algumas tarefas serão feitas em menos tempo e com mais facilidade por isso. E obviamente nessa janela de 10 anos algumas áreas vão ser mais valorizadas e outras menos. 

Quais áreas? 

LS: Tecnologia, diversidade e compliance serão valorizadas, o Brasil tem que se enquadrar nisso com o resto mundo. Teremos consumo de serviços jurídicos especializados em tecnologia, telecomunicações e mídia.

M&A vai continuar muito forte e a própria área de IPO, o que será uma vitória para o Brasil e vai gerar um volume muito grande de serviços.

Há uma demanda menor trabalhista. O número de processos deste tipo no Brasil é absurdamente alto, assim como os de consumidores. Não faz sentido termos uma Justiça lenta como temos hoje, o ideal seria uma Justiça menor e mais rápida.

Qual o diferencial do Luiz Sette no mercado jurídico brasileiro?

LS: Aposto no Brasil e no mercado jurídico brasileiro, é o que eu agrego e o que o escritório agrega. Fazemos uma advocacia de cliente, atendendo a necessidade dele. Esse é o nosso objetivo primordial. E tenho amor ao direito, paixão pelo que faço. Essa é a minha maior aspiração. 

Quem serão os advogados do futuro?

LS: O advogado do futuro é aquele colaborativo, que consegue ligar as pontas, entender rapidamente a necessidade do cliente. Ele será multidisciplinar para resolver os problemas dos clientes. Hoje para as firmas a melhor forma de crescer a base de clientes é ter diversidade e colaboração. Todos entenderam isso e devem estar fazendo o seu dever de casa.

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