O caso Djokovic e as opções contra a exigência de vacinação

Na América Latina, “cada país escolheu, de acordo com suas próprias circunstâncias, as medidas que considera mais convenientes”, explica Rodolfo Barreda, diretor de Basham, Ringe y Correa, S.C. / Carine06 - Flickr.
Na América Latina, “cada país escolheu, de acordo com suas próprias circunstâncias, as medidas que considera mais convenientes”, explica Rodolfo Barreda, diretor de Basham, Ringe y Correa, S.C. / Carine06 - Flickr.
Para Rodolfo Barreda, da firma mexicana Basham, Ringe y Correa, é fundamental a proteção do bem coletivo.
Fecha de publicación: 14/01/2022

Nesta história o tempo é fundamental. Dez minutos antes de Novak Djokovic admitir irregularidades em sua documentação de viagem para a Austrália, o ministro da Imigração, Alex Hawke, solicitou uma prorrogação para emitir uma decisão final sobre o visto do tenista. Agora que o caso segue uma investigação criminal contra o atleta, o melhor a fazer é não perder o foco neste episódio tão relevante para a elaboração de um marco legal que defina o alcance da exigência de vacinação como medida administrativa.

Vamos tirar do caminho os interesses da indústria esportiva, os milhões negociados em patrocínios e a ampla cobertura midiática que teria a aparição do tenista número um do Slam, com o qual esse esporte inaugura 2022. Visto assim, a princípio — quando não foram admitidos “erros” na sua documentação – o caso de Djokovic foi o de um cidadão estrangeiro que chega a um país onde é obrigado a cumprir determinadas normas para exercer a sua atividade profissional.

O contraponto ocorre quando a normativa solicita -ou exige - atestar que a vacina completa contra a Covid-19 foi aplicada, o que torna válido investigar, sem que isso seja uma frente 'antivacina', se a medida pode se tornar discriminatória ou se, na falta disso, é um dos poucos que testa a capacidade dos países de defender a soberania de seus marcos regulatórios.

Com a deportação de Djokovic definida na Austrália, o futuro legal do ganhador por 20 vezes de um título de Slam também pode ser complicado na Sérvia e na Espanha, ao haver violado suas medidas sanitárias e migratórias diante da crise sanitária.


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Rodolfo Barreda
Rodolfo Barreda

Para Rodolfo Barreda, conselheiro da firma mexicana Basham, Ringe y Correa. S.C., este caso se soma ao debate em torno da proporcionalidade das medidas sancionatórias em caso de não cumprir as normas do país.

"O elemento de proporcionalidade reside no fato de que a busca de um objetivo constitucional não pode ser feita à custa de afetar desproporcionalmente outros direitos constitucionais."

Conversamos com o especialista para entender, diante do que está acontecendo na região latina, quais são os alcances das normas sanitárias sobre vacinação e como elas podem ser gerenciadas para que ambas as partes, o Estado e os cidadãos, não sejam prejudicadas.

Quais são suas considerações sobre a decisão favorável para Djokovic?

Rodolfo Barreda. Devemos ter em mente que a decisão do juiz Anthony Kelly aponta para uma questão processual e não para o fundo da questão, ou seja, a justiça australiana não resolveu a questão da liberdade do tenista que não se vacinou para entrar na Austrália.

A liberação do atleta teve a ver com o período de tempo em que ele foi notificado pela autoridade australiana de seu direito de se manifestar sobre o aviso de cancelamento de seu visto. Posteriormente, esse tempo foi reduzido pela própria autoridade, ato que o juiz considerou uma violação dos direitos de defesa de Djokovic, deixando-o em liberdade.

Que opções tem um atleta contra um governo que exige a vacinação como medida administrativa?

Tem 2 opções: contestar a medida administrativa ou cumpri-la.

A contestação seria sobre o direito do atleta à liberdade de decidir sobre sua própria saúde (vacinar-se ou não), em detrimento de um direito coletivo à proteção da saúde. Em última instância, a questão seria decidida por um Tribunal Constitucional.


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No México, o meio de defesa ideal para a análise judicial desses direitos conflitantes é o processo de amparo. Nessa área, seria necessário considerar os tempos judiciais para se chegar a uma resolução substantiva, pois muito provavelmente o campeonato, torneio ou competição esportiva terminaria antes que as instâncias judiciais fossem resolvidas.

O cumprimento da medida administrativa que consiste na vacinação não causaria problema jurídico em si, uma vez que estaria agindo de acordo com o disposto na legislação.

Independentemente do tema jurídico em questão, devemos considerar que atualmente existem atletas que são verdadeiras empresas esportivas: Lionel Messi, Cristiano Ronaldo, Tom Brady, etc., cuja renda econômica não inclui apenas os pagamentos que ganham por jogar em seus equipamentos, mas uma quantidade muito significativa de sua renda é recebida da publicidade que fazem para determinados produtos; portanto, seu “marketing” deve ser consistente com a imagem do produto de seus patrocinadores. Diante disso, a recusa em serem vacinadas por essas pessoas em um mundo assolado pela pandemia, com perdas humanas, prejuízo econômico e deterioração da saúde mental, deve ser considerada pelo atleta como uma muito provável deterioração de sua imagem pública e diminuição do seu rendimento econômico.

Agora, que opções pode ter uma administração pública? Que avanços nesta matéria são detectados na América Latina?

Em toda a América Latina, a autoridade central de saúde que está sob a administração pública optou por várias medidas. Estas vão desde as mais restritivas, como a impossibilidade de entrada no país para pessoas que vêm de determinados destinos ou que não estão vacinadas, até a não exigência de certificado de vacinação ou teste de COVID-19 negativo.

Hoje não há uma posição clara e definida como região em relação à questão das medidas administrativas da autoridade sanitária, cada país adotou - de acordo com suas próprias circunstâncias - as medidas que considera mais convenientes.

Como poderia ser resolvido no futuro?

A medida administrativa deve ser clara pela autoridade sanitária e específica quanto à sua exigibilidade. Quando apropriado, exceções válidas podem ser consideradas, por exemplo: pessoas com doença de imunodeficiência, menores de idade, entre outras. É conveniente que, em algum momento, levando em conta os tempos judiciais, os Supremos Tribunais, como autoridade máxima na interpretação das Constituições, definam a validade dessas restrições.

Existe um futuro que não beira a discriminação para quem se recusa a ser vacinado?

No caso do México, de acordo com precedentes jurisprudenciais estabelecidos pela Corte Suprema de Justiça da Nação e tendo como ponto de partida o princípio constitucional da igualdade, que se traduz em um direito de não discriminação, temos que: em situações iguais, deve haver o mesmo tratamento e em situações diferenciadas deve ter um tratamento diferenciado, atendendo a cada caso particular.

Do exposto, surgiria a seguinte questão: o tratamento diferenciado é válido entre pessoas vacinadas em relação a pessoas não vacinadas?

Em atenção a um maior interesse pela proteção da saúde da comunidade, que tem o próprio Estado como garantidor, consideramos que esta diferenciação de tratamento entre vacinados e não vacinados é válida, desde que seja adequada para alcançar o objetivo constitucional, ou seja, a proteção da saúde pública. Na medida em que esse tratamento não atende ao objetivo deste último, o tratamento diferenciado torna-se discriminatório.

Enquanto aguarda a determinação da deportação de Djokovic, o sérvio já foi incluído no sorteio final do torneio. Trata-se de um sonhado encontro para os fãs de Rafael Nadal e do sérvio. Os atletas não dividem a arena desde as semifinais de Roland Garros, em junho de 2021, na qual Djokovic venceu.

Por enquanto, o comitê organizador do Open Australia já anunciou o primeiro jogo com o qual abrirá sua participação no torneio. Embora a programação ainda não tenha sido definida, a data de domingo, 16 de janeiro, já está definida.

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