Somente a entrada de novos players pode aumentar concorrência no setor financeiro

Mario Villanova Nogueira - Crédito Divulgação
Mario Villanova Nogueira - Crédito Divulgação
Mario Roberto Villanova Nogueira acredita que BC deve estudar medidas para limitar ação de grandes bancos
Fecha de publicación: 05/11/2019

O Banco Central deve estudar medidas para ampliar a competição no setor financeiro pela limitação à atuação dos grandes bancos e facilitação à entrada de novos agentes no mercado, única forma de aumentar a concorrência no setor, avalia Mario Roberto Villanova Nogueira.

Sócio do NHMF Advogados, Nogueira graduou-se em direito pela Universidade de São Paulo e tornou-se especialista em Economia de Empresas pela Administração de Empresas para Graduados (CEAG) da Fundação Getúlio Vargas.

O advogado conversou com o LexLatin após a divulgação de dois estudos pelo governo federal sobre a alta concentração de mercado nas mãos de poucas instituições financeiras. Segundo o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), os bancos conseguiram compensar restrições impostas nos últimos anos e capturaram o setor de meios de pagamentos. Por outro lado, o BC concluiu que a redução no número de instituições no mercado eleva o custo do crédito e reduz a oferta de empréstimos

Como o sr. vê o destaque dado pelo BC ao estudo que aponta prejuízos à sociedade causados pela concentração bancária? 

A concentração dos mercados de instituições financeiras começou no Brasil ao final da década de 1990, quando os grandes bancos começaram a comprar bancos médios e pequenos.  Essa concentração ganhou impulso com a privatização de vários bancos estaduais.  Na ocasião, havia uma discussão se operações no mercado financeiro estavam sujeitas a exame pelo Cade, quanto a questões de concentração de mercado, ou ao Banco Central, quanto a questões regulatórias, ou a ambos.  Na ocasião, a grande maioria das operações não foi submetida ao Cade e não teve análise do ponto de vista concorrencial.  Bem mais recentemente é que o Banco Central passou a preocupar-se também com a questão de concorrência nos mercados financeiros.  É interessante notar que agora o BC está considerando que a concorrência é fator importante, que também deve ser considerado, ao lado de outros, como questões de solidez das instituições financeiras, sua quase única preocupação até então.  O BC reconhece que certas políticas monetárias têm muito menos efeito do que se imaginava ou que se pretendia por conta a rigidez do mercado financeiro, pouco sujeito à concorrência.

O BC analisou as últimas operações de M&A envolvendo instituições financeiras, inclusive firmando ACCs, sem manifestar preocupações com a concentração que resultaria das operações. Como vê essa questão nos casos específicos e agora com o estudo?

A acentuada queda nas taxas de juros pagos pelo governo brasileiro (SELIC) nos últimos meses não correspondeu ao mesmo movimento dos juros cobrados pelos bancos de seus clientes, pessoas naturais ou jurídicas.  Segundo a análise do BC essa ausência de correlação se explicaria pela concentração do mercado bancário em meia dúzia de instituições.  Portanto, este mercado não estaria sujeito a políticas financeiras do governo federal e do próprio BC.  O ponto é que a grande concentração já é um fato no Brasil de hoje e não há como o BC desfazer as operações aprovadas no passado.

O Cade publicou, recentemente, um estudo apontando que os bancos sequestraram o setor de meios de pagamento com a verticalização de suas operações, compensando, inclusive, restrições impostas pela autoridade antitruste. O que esperar do Cade após essas declarações?

Deve-se esperar que os atos de concentração envolvendo empresas atuantes no mercado de meios de pagamento estejam sujeitas a maior controle, seja porque venham a ser simplesmente negadas ou por que seja lhes imponham condicionantes importantes, como venda de certas atividades, obrigatoriedade de manutenção de entidades administradas separadamente ou outros remédios que venham a ser considerados pelo Cade como necessárias para manter um razoável grau de competição.  O Cade deve ter aprendido com a concentração no mercado bancário que um razoável grau de competição é importante para que se alcance o bem estar do consumidor.

O Executivo manifestou, por diversas vezes, o seu incômodo com a concentração bancária no Brasil. Do ponto de vista regulatório, devemos esperar mudanças para imposição de maior concorrência no mercado? O que você espera?
 

Não há como se desfazer operações já aprovadas pelas autoridades e devidamente implementadas.  Assim, somente a entrada de novos players, sejam bancos internacionais ou mesmo as fintechs, é que poderá trazer mais concorrência a este mercado.  O BC, ao regular os bancos, poderá elaborar normas que tenham a função de aumentar a concorrência entre as atuais instituições e limitar a ação das grandes instituições, forçando a transferência de parcelas de mercado para os já existentes bancos médios e pequenos. Acho que o BC estudará algumas medidas neste sentido.

Ao mesmo tempo em que poucos bancos mantêm grandes participações de mercado, como você avalia a entrada de novos atores – sejam bancos estrangeiros ou fintechs – para aumento da competição no setor financeiro?

A entrada de novos players no mercado deverá resultar em maior concorrência e, provavelmente, condições mais atrativas para os clientes de produtos financeiros, como empréstimos ou títulos.  Parece-me que a entrada de grandes bancos internacionais teria um efeito mais imediato, pois seriam participantes de grande capacidade financeira e experiência em atuação nesses mercados e ofereceriam produtos já conhecidos pelos clientes, em modalidades por eles já dominadas.  As fintech apresentam-se como a esperança disruptiva, que veio para alterar as práticas atuais nesses mercados.  Mas, na sua maioria são empresas pequenas, com menor capacidade de, em curto prazo, incomodar, de maneira importante, as grandes instituições financeiras.  E, neste último caso, há que se evitar que os controles das fintechs venham parar nas mãos dos grandes bancos ou de seus próprios controladores.

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