Paulo Rocha é sócio-diretor do Demarest Advogados há dez anos. O advogado de 49 anos é especialista na área de fusões e aquisições, private equity e capital de risco, setores que estão aquecidos e que prometem ter um grande volume de operações neste segundo semestre.
Em uma conversa com LexLatin o CEO falou dos impactos do home office, importância da diversidade e sobre o aumento da concorrência e especialização do mercado legal nos próximos anos.
Como foi a entrada do escritório em home office?
Passamos a ter um monte de ações de recursos humanos voltadas ao bem estar das pessoas. As equipes tiveram que se organizar para ter as suas comunicações e conference calls diários, semanais e quinzenais, além da comunicação entre os sócios, áreas, equipes e back office. O escritório passou a oferecer uma série de coisas que até então não existiam, como sessões de yoga online e apoio psicológico para quem quisesse.
Como foi a decisão de deixar o escritório inteiro em home office até o fim do ano?
O escritório se mostrou plenamente capaz de continuar funcionando com comunicação ininterrupta com clientes, com produção e colaboração entre as pessoas.
Eu mesmo era uma pessoa que considerava que na nossa área não ia dar, mas me provei errado: é plenamente possível, a produção e qualidade de entrega continuam inalteradas e os clientes satisfeitos.
Se fossemos voltar para o escritório físico hoje teríamos que tomar medidas sanitárias muito duras que iam causar um desconforto no dia a dia das pessoas. Elas teriam que ir de máscara, viseira, não poderia haver mais do que duas ou três pessoas na sala nem reunião com mais de três pessoas. Se houvesse movimentação de um andar para o outro e alguém ficasse doente teria que fechar o escritório inteiro por duas semanas. Foram estas as razões.
Como lidar neste momento com a insatisfação do cliente?
É preciso conhecer o business do cliente, fazer um staffing adequado das suas transações e casos. Existe insatisfação em qualquer atividade e ela está ligada à questão da qualidade. O cliente está pagando por um serviço e que é de certa forma subjetivo, porque é totalmente intelectual. No final do dia, ele tem que enxergar que você agregou valor àquela demanda que ele tinha.
Outros CEOs de grandes escritórios falaram sobre a necessidade de empatia e contato e que os profissionais do futuro precisarão ser mais que advogados e entender o negócio do cliente. Como você analisa essas afirmações?
O cliente espera ter que explicar cada vez menos o negócio dele para o advogado. Haverá uma especialização jurídica cada vez maior e isso tem relação com o tipo de negócio que o cliente se dedica. É o foco no negócio e no cliente. E isso se traduz na compreensão mais profunda do que o cliente faz e não mais simplesmente em você dizer: eu sou um excelente advogado, entendo das leis, qualquer indústria vou entender profundamente. Os clientes querem que você já saiba de cara, antes deles te contratarem.
No mercado jurídico o cliente tem que ter empatia e confiança com o advogado, algo necessário em muitos momentos de negociações complicadas.
Dá para manter o ambiente virtual em todos os tipos de negócio, especialmente as operações financeiras?
Temos conseguido fazer M&As sem reuniões presenciais, o que é uma novidade. É natural continuar existindo aquela relação pessoal. Se você é um cliente estrangeiro e está vindo conhecer a empresa que quer comprar tem que entrar naquela indústria, conversar com as pessoas pessoalmente e isso envolve o advogado.
O home office vai existir dentro de um limite: dois dias por semana, por exemplo, mas eu não vejo ainda o escritório indo totalmente para um ambiente “cloud”, onde o escritório não exista fisicamente.
Como sócio-diretor de uma grande firma qual seu modelo de administração? No que ele difere de outros modelos de administração?
O modelo de gestão tem que ser colaborativo, participativo e logicamente que não dá para todo mundo ter voz sobre tudo, mas é preciso estar atento aos anseios das pessoas. O nosso principal ativo vai embora pelo elevador todo dia. Eu não tenho estoque, não tenho máquina, não tenho nada. Tenho as pessoas que fazem parte, que compõem o escritório.
Então é importante envolver as pessoas, entender o que está na cabeça delas, porque é preciso todo mundo engajado. A geração mais nova quer fazer parte de um projeto, quer que o escritório tenha um propósito e isso é muito importante, inclusive porque isso faz com que a gente tenha muito foco para as nossas atividades de inclusão de gênero, a questão de promoção de mulheres no ambiente de trabalho, a preocupação com pro bono, enfim a atuação social.
Isso não era algo tão presente há dez anos, mas hoje em dia tem uma importância monumental. O escritório precisa ter importância na sociedade, tentar promover valores, e você tem que fazer o que fala.
O Demarest é reconhecido no mercado pela questão da diversidade. Mas ao olharmos o conselho diretor temos basicamente homens brancos. Porque a diversidade ainda não chegou ao topo?
Eu acho que esta não é uma questão, infelizmente, exclusiva do nosso escritório, mas da imensa maioria dos escritórios do Brasil. É uma situação que trabalhamos muito para mudar, especialmente a questão racial.
Nós já tivemos mulheres no conselho e, por acaso, nesta formação não tem. É algo que precisamos continuar trabalhando. Não tem nada que impeça, temos vários reconhecimentos das nossas iniciativas de diversidade, como o D Mulheres, D Raízes, D Mais. Realmente fazemos força para que isso seja não só absorvido dentro do escritório como fora inclusive.
Falando em retenção e atração de talentos. As novas gerações estão exigindo protagonismo. Os sócios seniores estão preparados para ceder espaço?
A ansiedade é muito maior hoje, eles têm muito mais informação e estão mais preparados do que a nossa geração. Mas isso não quer dizer que você não coloque um valor na experiência que continua tendo um valor.
Você tem que abrir espaços para que essas pessoas passem a participar e ter mais visibilidade. Acho importante haver reconhecimento de uma geração que preza valores e propósito. Muitas vezes o novo profissional não está preocupado com remuneração, mas em saber se ele e a empresa fazem diferença no mercado.
Alguns CEOs de outros escritórios afirmam que o ano de 2020 não está perdido e que, para muitas firmas, vai empatar com 2019. Teremos um grande número de operações neste segundo semestre para justificar isso?
Nosso volume de trabalho está maior que o ano passado e a quantidade de operações continua muito grande. Teremos uma conjunção de várias indústrias por causa da crise econômica, uma consolidação. São duas empresas do mesmo setor que vão se juntar e alguns tipos de indústrias que terão uma concentração.
Quais seriam?
É só você olhar uns três ou quatro seguimentos que estão sofrendo mais. O Brasil voltou a ficar barato, o investidor estrangeiro estava aguardando um momento em que a moeda dele ficasse mais forte. Esse é momento, o dólar já bateu a R$5,60, agora esta a R$5,15 e continua sendo um dólar forte.
Há uma liquidez enorme no mercado e no mundo. Os fundos estão com uma enorme liquidez e eles precisam fazer o deployment, precisam gastar o dinheiro. E o Brasil continua sendo um lugar bom para isso. Temos dimensão continental, um agrobusiness fortíssimo, talentos e mercado consumidor.
Então essa conjuntura continua fazendo com que apareçam boas oportunidades para negócios. Isso sem falar nos IPOs. Há muitos anos não víamos um pipeline tão grande de IPOs e follow-ons.
Quantos IPOs o mercado vai ter nos próximos meses?
Entre 20 e 30. É uma janela curta até outubro. Então teremos meses intensos de trabalho aí para a área de mercado de capitais e de equity.
O que o Paulo Rocha, sócio-diretor do Demarest, agrega ao mercado legal brasileiro?
O escritório é subescritor de várias associações, ONU mulheres, o Fórum das Empresas LGBTQ+, coisas que realmente você precisa colocar o seu nome para compartilhar desses valores. Temos que contribuir com o desenvolvimento empresarial do Brasil, promovendo treinamentos, mais trabalhos pro bono e coisas que vão além da mera prestação dos serviços jurídicos para os clientes.
Qual o futuro do mercado legal do Brasil?
Os advogados terão que buscar conhecimento mais especifico. Teremos uma concorrência maior, porque haverá mais gente especializada no mercado. Talvez tenhamos mais boutiques especializadas em um setor e isso vai fazer uma frente forte para os escritórios full service. Estou ainda muito curioso para ver como vamos estar daqui a cinco anos, o resultado dessa experiência que estamos passando e o que isso vai fazer com a nossa forma de atuar.
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