Mulheres em carreiras STEM: Maribel Dos Santos, da Oracle, fala sobre políticas para alcançar a paridade

O conteúdo é fundamental para diminuir a diferença de gênero e alcançar a verdadeira paridade.
O conteúdo é fundamental para diminuir a diferença de gênero e alcançar a verdadeira paridade.
Não se trata de incluir a palavra “mulheres” em discursos oficiais, mas sim da postura organizacional de desenvolver seus talentos.
Fecha de publicación: 17/01/2023

Como tornar a paridade e a inclusão da mulher no ambiente de trabalho metas alcançáveis? A resposta ainda está sendo construída nas organizações. De acordo com o estudo Uneven Parity - Women Matter Mexico 2022, da McKinsey & Company, as grandes apostas são a adoção de políticas de inclusão e diversidade com objetivos quantitativos de representação de gênero, bem como o impulso de esforços nos diferentes momentos da organização.

Esse tema tem suas particularidades para cada setor. Na advocacia, verifica-se que há maiores percentuais de mulheres cursando faculdades de direito, porém, ainda há um teto de vidro para ocupar altos cargos. No setor de TI, aliado de qualquer organização, um dos indicadores mais difundidos sobre a participação de mulheres em ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) é o da UNESCO: 35% dos que cursam o ensino superior em STEM são mulheres. Com um olhar mais direcionado, a Organização global para mulheres tecnólogas AnitaB.org, registrou, em 2020, que no mundo apenas 28,8% da força de trabalho no setor de tecnologia eram mulheres. 

Nesse contexto, surge a discussão sobre o que é funcional e suficiente para fechar a lacuna de gênero. Para Maribel Dos Santos Fernández, diretora geral e vice-presidente da Oracle México, não se trata de incluir a palavra "mulheres" nos discursos oficiais, mas da posição organizacional de desenvolver seus talentos. A Oracle é uma das 10 maiores empresas de infraestrutura em nuvem do mundo.

“Deve ser um objetivo da organização desenvolver até mesmo as soft skills das mulheres que ingressam no mercado de trabalho”, comenta.


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Para aprofundar esse tema, a LexLatin conversou com Maribel Dos Santos Fernández. Conversamos com ela sobre quais seriam os elementos-chave para construir uma cultura inclusiva no mundo corporativo, além de cobrir um percentual, aplicável a qualquer organização, em qualquer setor.

Números x Conteúdo

Você acredita que a diversidade obrigatória é a chave para estabelecer uma cultura de inclusão e alcançar a paridade de gênero?

Maribel Dos Santos:  Até que haja uma verdadeira igualdade percentual de gênero nas empresas, acredito que a obrigatoriedade da diversidade deve ser formalizada por meio de políticas ou programas internos das organizações. 

Se esse for o enfoque, é importante considerar a diversidade obrigatória como uma meta por meio de determinados KPIs (indicadores chave de desempenho) específicos. Além disso, deve-se notar que esses KPIs ou programas de inclusão não devem visar apenas cobrir uma porcentagem dentro da organização, mas também construir uma geração de "mulheres com conteúdo".  

O que você quer dizer com “conteúdo”? Você acha que essa é a abordagem necessária para falar sobre a verdadeira paridade de gênero?

Acredito que não se trata apenas de dizer "mulheres, mulheres, mulheres" para preencher uma lacuna e atingir um objetivo, mas que realmente nos ocupemos como empresa com o desenvolvimento da mulher. Também deve ser um objetivo da organização desenvolver as habilidades interpessoais das mulheres que entram no mercado de trabalho. 

É preciso mostrar que, profissional e academicamente, a trajetória de um homem e de uma mulher é igual, para podermos chamar de “luta justa” por qualquer cargo dentro da organização.

Por esse motivo, “conteúdo” é tão relevante. O conteúdo é fundamental para diminuir a diferença de gênero e alcançar a verdadeira paridade.

Como a Oracle promove o desenvolvimento da mulher na empresa? Como é essa sinergia entre gênero e conteúdo?

Na Oracle, temos diversos programas e iniciativas para desenvolver o conhecimento das mulheres e incentivar sua participação dentro da empresa. Uma das principais é a OWL (Oracle Women Leadership). Esse programa é orientado para criar conexões dentro de uma comunidade de mulheres, para que se relacionem com o  conteúdo. Ou seja, que o conteúdo acompanhe 100% a incorporação da mulher ao mundo da tecnologia.

Uma vez que as mulheres ingressam na empresa, nosso trabalho é mantê-las e potencializá-las, oferecendo-lhes as ferramentas certas, como cursos de conhecimento técnico, programas de treinamento, mentoria, coaching, entre outros. 

Treinamos e capacitamos centenas de talentos femininos para liderar histórias de sucesso a qualquer momento dentro da organização. 

Uma trajetória de aprendizado e conscientização

Como mulher em posição de liderança em uma empresa líder em tecnologia, como tem sido sua experiência nesse setor? Você tem percebido alguma resistência à incursão de mulheres no ambiente STEM?

Eu não sou um engenheiro. Minha formação acadêmica começa na área de marketing, mas tenho mais de 30 anos de experiência na indústria de tecnologia ou no setor STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática).

Durante esse tempo, aproveitei as circunstâncias para me preparar e adquirir os conhecimentos necessários para continuar avançando profissionalmente. 

Se houvesse tanta resistência à incursão feminina na indústria de tecnologia eu nem teria tido a oportunidade de seguir carreira nessa área, nem de chegar ao cargo que estou agora. 

Acredito que as mulheres às vezes se tornam seus próprios obstáculos ao se candidatar a uma vaga, por considerar que não atendem a todos os requisitos. A verdade é que provavelmente você nunca estará 100% pronta para assumir determinada função, mas é preciso ter a intenção de aprender e manter uma atitude positiva para ousar em novos desafios profissionais, independente do setor. 

As mulheres precisam entender que, se tiverem a atitude e a preparação corretas, podem produzir resultados. A realidade é que a maioria das mulheres e homens em cargos de liderança têm esses mesmos componentes. Mas se elas começarem a adicionar componentes diferentes, elas mesmas estão criando um viés.


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O estudo Uneven Parity – Women Matters 2022 aponta que, embora as empresas tenham dado passos para alcançar a paridade de gênero, no ritmo atual, levará 100 anos para atingir essa paridade. Dito isto, que ingredientes adicionais você acha que são necessários para acelerar a paridade de gênero?

Não sei se isso tem a ver com o meu desejo de ser advogada quando era mais jovem, mas acrescentaria como ingrediente adicional: as leis. 

Acredito que a promulgação de mais regulamentações em nível nacional e regional é muito importante para permitir a incorporação das mulheres na força de trabalho. Dessa forma, as metas de diversidade e inclusão podem ser legalmente aplicáveis ​​e abrir caminho para uma maior conscientização sobre a paridade de gênero. 

Às vezes, defendemos a conscientização e o critério das lideranças da organização para que a inclusão de gênero no ambiente de trabalho se concretize. No entanto, talvez essa consciência não seja suficiente. O apoio regulatório dos governos é necessário para acelerar essa mudança, porque, caso contrário, pode levar mais 100 anos.

Finalmente, você acha que houve uma mudança real na percepção da paridade de gênero na América Latina? Alguma reflexão a esse respeito?

Nos meus 30 anos no mundo da tecnologia, houve uma diferença. Eu acho que hoje estamos muito mais conscientes do que significa paridade de gênero. 

Desenhar métricas para atingir metas de diversidade e fomentar uma cultura de inclusão representam grandes avanços. Por exemplo, antes, poderia se passar um ano inteiro sem que o Recursos Humanos entrevistasse uma única mulher. Isso, hoje, é inadmissível. 

Dito isso, acredito que as próximas gerações acharão menos complexo incorporar tanto as mulheres quanto outros tipos de grupos vulneráveis ​​ao ambiente de trabalho. Antes, não se falava da comunidade LGBTQIAPN+ e menos ainda se considerava a opção de ela ser realmente aceita dentro da organização. 

Acho que o mundo está mudando quando se trata de consciência de gênero e diversidade. É hora de mostrar que inclusão não é apenas uma opção, mas uma obrigação.

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