O setor jurídico está passando por uma verdadeira “sacudida” na forma como os serviços jurídicos são entendidos. Desde a crise de 2008, grandes escritórios de advocacia em todo o mundo têm tentado começar a se adaptar às demandas dos clientes do século XXI. Da mesma forma, advogados independentes e os pequenos escritórios viram como são obrigados a aprender novas tecnologias ou a estarem presentes nos “novos espaços” de oferta de serviços, como os Marketplaces jurídicos.
Por outro lado, outros setores baseados em informação mudaram radicalmente desde o surgimento de negócios disruptivos, digitalmente maduros e em crescimento exponencial. No setor jurídico não somos alheios ao aparecimento desses tipos de negócios que, seja na forma de consultoria interdisciplinar, empresa emergente ou ALSP - Provedores de Serviços Jurídicos Alternativos, sigla em inglês - está claro que eles contribuirão para que a prática da advocacia não volte a ser como antes.
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Todos os provedores de serviços jurídicos tradicionais agora têm a tarefa de manter a eficiência competitiva no mercado, e o instrumento para fazer isso é a chamada “inovação”. Visto de um ponto de vista pragmático, os escritórios de advocacia têm pelo menos três razões possíveis para inovar: o surgimento de novos modelos de negócios, o papel da tecnologia nos serviços e as mudanças nas atividades comerciais.
Novos modelos de negócios
O paradigma da estabilidade no mercado do modelo tradicional de negócios dos escritórios de advocacia está em questão. A indústria jurídica não é mais estável e não tem fronteiras claras com outros setores digitais. Plataformas e negócios baseados em sistemas de digitalização maduros podem oferecer serviços jurídicos disruptivos. Ao que se acrescenta que os hábitos dos clientes estão mudando: exigem serviços de informação mais eficientes, adaptados e a um custo menor.
Maior competitividade
O uso da tecnologia por novos concorrentes tem como foco a geração e captura de valor para o cliente. Por isso, os negócios jurídicos tradicionais devem ser reconfigurados e reorganizados para fazer o uso mais otimizado da tecnologia. Incorporando recursos e perfis profissionais que possam tornar essa tarefa uma realidade e dando espaço para tentativa e erro.
Novas atividades comerciais
A atividade comercial dos advogados e escritórios de advocacia mudou radicalmente, hoje a presença nos meios digitais é fundamental, assim como a forma como prestamos este serviço aos nossos clientes. Isso tem implicações profundas na forma de organização e no papel da Diretoria e dos gerentes intermediários. A criação de negócios através dos meios digitais e de novos canais comerciais exige a atualização formativa e a mudança organizacional adaptativa dos escritórios, possível graças a uma cultura organizacional de “inovação”.
Neste artigo, vou revisar as concepções, tipos de inovação e estratégia de inovação que os provedores de serviços jurídicos fazem e podem fazer uso.
No passado, os escritórios de advocacia podiam ser bem-sucedidos maximizando a proposta de valor por meio de seus recursos (que geralmente se traduziam em mais profissionais no escritório) e obtendo eficiências ao longo do tempo. No entanto, de agora em diante, os negócios jurídicos também precisam desenvolver uma compreensão de como garantir que o sucesso de hoje se traduza no sucesso de amanhã. Isso se traduz em diferentes formas de abordar a inovação: concepção de exploração e concepção de exploração.
Uma concepção baseada plenamente na exploração tem muito a ver com a crença de que os resultados financeiros da empresa hoje permitem o mesmo sucesso no futuro. No entanto, essa crença não é fácil de sustentar no ambiente competitivo e tecnológico em que atuamos. Portanto, o ideal é combinar as duas percepções e, acima de tudo, dar mais relevância às atividades que permitam explorar novas ideias e formas de criação de valor a longo prazo (não apenas com base na eficiência).
Partindo dos escritórios de advocacia podemos realizar ao menos três tipos diferentes de inovação: nos serviços, no modelo de negócio e no sistema de colaboração.
Inovação em serviços
Trata-se de aproveitar ao máximo as capacidades existentes no escritório. Inovações podem ser feitas em serviços, processos e treinamentos. Essas inovações geralmente melhoram a oferta de serviço atual e se concentram em atender às necessidades do cliente.
Neste tipo de inovação podemos inferir todas as iniciativas relacionadas com a melhoria dos processos internos (automação, redesenho, sistematização...), melhoria da infraestrutura (tecnologia IP, trabalho remoto, melhoria de aplicativos...) e atendimento (implementação de CRM , adoção de plataformas colaborativas, plataformas de automação de fluxo de informação, assinatura digital...), entre muitos outros cujo denominador comum é a melhoria da eficiência.
Cabe ressaltar que este tipo de inovação tem grande impacto no curto prazo, como muitos escritórios de advocacia já experimentam. No entanto, esse tipo de inovação está sujeito a expiração marcada por mudanças/avanços tecnológicos ou regulatórios.
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Inovação no modelo de negócio
Talvez um tipo de inovação pouco explorado pelos escritórios de advocacia tradicionais. As novas capacidades que possuímos graças às tecnologias nos permitem, agora e não antes, incorporar estratégias de melhoria do modelo de negócios.
Os escritórios que pretendem agregar novas atividades comerciais através de atividades comerciais novas ou adaptadas estão realizando inovação no modelo de negócio (por exemplo: incorporação de novos serviços como consultoria tecnológica, novas formas de faturação a clientes a preço fixo, LPO - Outsourcing de Processos Legais, sigla em inglês -, serviços alternativos ou empresas de serviços jurídicos).
Existem poucos casos em todo o mundo, mas podemos começar a sentir que é uma tendência ascendente e que provavelmente irá diferenciar alguns escritórios de outros no futuro. Porém, por se tratar de um tipo de inovação que em si é um processo de tentativa e erro, os escritórios têm que assumir a realização de protótipos dos elementos do novo modelo de negócios e ser capazes de criar e capturar valor de uma forma melhor do que seus concorrentes.
É verdade que esse ponto pode ser um desafio para os negócios hierárquicos tradicionais, com aversão ao risco, inflexíveis com os processos, baseados no status quo e focados na inovação interna. Porém, provavelmente vale a pena o esforço, pois é esse tipo de inovação que visa a sobrevivência no longo prazo.
Inovação no sistema
É também um tipo de inovação que visa agregar valor a longo prazo. No entanto, este tipo de inovação reside nas modificações a introduzir pelo escritório para alterar as interdependências na prestação do serviço jurídico (relações internas e externas de todos os envolvidos).
As mudanças afetarão a forma como o trabalho é organizado (por exemplo: passar de um sistema de comando hierárquico para um sistema colaborativo e baseado em funções, mais próximo daquele de projetos de desenvolvimento ágil de software) e as relações entre os diferentes atores (novas formas de interagir com fornecedores de tecnologia, start-up Legal Tech, hubs ou Think Tanks para o desenvolvimento de projetos conjuntos com startups ou clientes).
Trata-se de assumir novas formas de possibilitar a criação de diferentes conexões entre diferentes grupos e indivíduos que promovam uma cultura mais adaptativa e voltada para a criação e captura de valor.
Dado que nos dirigimos a sistemas de inovação abertos e modelos de negócios de digitalização avançados, o melhor marco para isso é a participação em ecossistemas de inovação. Essa é uma das estratégias que as empresas emergentes do Vale do Silício têm adotado e que pode ser de grande valor para a gestão da inovação dos escritórios de advocacia.
Ecossistemas de inovação são compostos por empresas que buscam obter resultados inovadores, dos quais participam empresas de diversos setores e seus resultados buscam oferecer soluções inovadoras para diferentes mercados. A ideia é que existam redes formais e informais de inovação contínua, uma maior movimentação de recursos pessoais e materiais, uma visão de expansão global (não local) e de colaboração interna e com outras empresas do ecossistema.
Neste ponto, não posso dar exemplos de escritórios de advocacia tradicionais que estão imersos nesse tipo de estratégia em um sentido ideal, mas poderíamos falar de start-ups LegalTech que acabam oferecendo serviços para empresas RegTech ou Insur-Tec, a chave em este aspecto é adaptabilidade. Ainda temos muito que trabalhar neste campo.
Em conclusão, pode-se dizer que o desenvolvimento da inovação dos prestadores de serviços jurídicos tradicionais está em pleno auge. Veremos se os operadores legais finalmente darão o salto do foco principalmente nas atividades de exploração para verdadeiras atividades de exploração do modelo de negócios.
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É claro que ainda há muito o que trabalhar em termos dos tipos de inovação e da expansão e participação dos atores do setor jurídico em ecossistemas de inovação que ofereçam não só soluções jurídicas, mas também de empresas de outros setores.
*Ana Burbano, manager na KPMG Legal Operations Transformation Services (Lots).
Nota: este artigo foi publicado originalmente no e-book Un Futuro Digital. El entorno legal y el rol del abogado por Lawit Group.
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