Judiciário não está pronto para permitir menor intervenção do Estado na atividade econômica

Mario Roberto
Mario Roberto
Para Mario Roberto Villanova Nogueira, juízes brasileiros entendem que cabe ao Estado dirigir a economia
Fecha de publicación: 14/08/2019
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O Judiciário brasileiro não está pronto para lidar com maior liberdade econômica, como a prevista na medida provisória cujo texto-base foi aprovado pela Câmara esta semana, avalia o advogado Mário Roberto Villanova Nogueira, em entrevista ao LexLatin.

Sócio do NHMF Advogados com três décadas de atuação no mercado, Nogueira formou-se na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo e é especialista em Economia de Empresas pela Administração de Empresas para Graduados (CEAG), da Fundação Getúlio Vargas. 

Qual a principal mudança que a MP da liberdade econômica traz para a forma de fazer negócios no Brasil?

Ela coloca como princípio norteador da atividade econômica a liberdade dos agentes econômicos na sua atuação, reduzindo o papel do Estado a agente normativo e regulador. O artigo 7º traz reais modificações a textos legais, trazendo efetividade aos princípios elencados nos artigos anteriores. Mas sempre há que se aguardar qual será a interpretação desses dispositivos quando houver qualquer conflito que os envolva.

Qual o principal impacto para a atuação de advogados na sua área?

Na medida em que o judiciário, de fato, venha a interferir menos na interpretação e execução de dispositivos contratuais, esses acordo ganharão maior peso e a redação de cláusulas claras e precisas será ainda mais importante. As partes terão que cumprir o pactuado, sem que possam se socorrer do poder do Estado para alterar os termos do acordo.

Você tem alguma crítica ou ressalva ao texto final da MP?

Há alguns princípios que podem dar azo a interpretações que resultem em ataque a certos valores hoje caros à nossa sociedade, como proteção ao meio-ambiente, liberdade e igualdade de orientação sexual. Por exemplo, poderia um estabelecimento comercial, valendo-se dos princípios de liberdade de contratar, deixar de atender clientes por conta de sua orientação sexual (fato ocorrido nos EUA em passado recente)? Poderia o judiciário interferir em casos semelhantes?

Há algum aspecto que deve gerar questionamento na justiça?

Como boa parte dos dispositivos trata de questões genéricas de princípios e não de regras objetivas, certamente muito se poderá se questionar se determinada regra se aplica àquele caso concreto ou não, ou seja, se o princípios expostos na MP deverão se considerado pela autoridade pública, do executivo ou do judiciário, quando da avaliação da situação real do agente econômico.

Em sua visão, o Judiciário está pronto para permitir uma menor intervenção do Estado na atividade econômica. Se não, o que é preciso mudar? 

Entendo que o judiciário brasileiro não está pronto para permitir menor intervenção do Estado na atividade econômica. Nossos juízes tem uma grande formação de intervenção nas atividades econômicas e entendem, em sua maioria, que cabe ao Estado dirigir a economia do País. O nosso código civil de 2002 é cheio de dispositivos que permitem ao judiciário alterar acordos entre as partes, passando por cima do que foi entre elas livremente pactuado. Esses dispositivos são atacados, de forma genérica, com a nova redação do parágrafo único do artigo 421 e o novo artigo 421-A que traz a MP. Mas, nossa tradição judicial é que o Estado é mais sábio para gerir os negócios que os próprios agentes econômicos. E acho que nossa sociedade se sente confortável com essa tutela estatal, embora será geradora de grande instabilidade jurídica e enormes ineficiências.

 

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