Começa a valer no país o sandbox regulatório

Bolsa de Valores de São Paulo/Hugo Arce / Fotos Públicas
Bolsa de Valores de São Paulo/Hugo Arce / Fotos Públicas
Mecanismo tem o potencial de gerar um grande diferencial no mercado de capitais.
Fecha de publicación: 04/06/2020
Etiquetas: Brasil

No início do mês entrou em vigor a Instrução Normativa Comissão de Valores Mobiliários (CVM) nº 626 (ICVM 626), que disciplina o sandbox regulatório para negócios inovadores ligados ao mercado de capitais. Aliada a medidas como a Resolução Conjunta Bacen/CMN nº 1, que regulamenta o open banking no Brasil, a norma denota o movimento das entidades do sistema financeiro nacional para incentivar a inovação. Resta, porém, a dúvida: um ambiente regulado é capaz de trazer segurança jurídica e desenvolvimento ao setor ou inibirá a inovação?

O conceito de sandbox regulatório remete a um ambiente controlado, em que empresas que desenvolvam negócios inovadores são livres, por um período determinado, para testar seus modelos de negócios sem risco e custo de um sistema regulatório rígido, por meio de autorizações temporárias, em regime diverso daquele ordinariamente previsto na regulamentação aplicável. Isso ao mesmo tempo em que os órgãos regulatórios estudam os modelos de negócios inovadores destas empresas e seus respectivos impactos no mercado.

O sanbox regulamentado pela CVM prevê a dispensa de requisitos regulatórios e autorização concedida em caráter temporário para o desenvolvimento de atividade regulamentada específica, além da fixação prévia de condições, limites e salvaguardas voltadas à proteção dos investidores e ao bom funcionamento do mercado de valores mobiliários.

O processo de admissão dos participantes se iniciará por meio de comunicado ao mercado, divulgado na página de internet da CVM. O comunicado indicará o cronograma de recebimento das propostas, os critérios de elegibilidade e o número máximo de participantes.

Para se inscrever, as empresas devem possuir, necessariamente, um modelo de negócio inovador relacionado ao mercado de valores mobiliários, com uso de tecnologia inovadora ou desenvolvendo produto ou serviço ainda não oferecido. Tal “modelo de negócio inovador” deve ter o potencial de promover ganhos de eficiência, reduzir custos ou ampliar o acesso do público ao mercado de valores mobiliários.

O modelo do sandbox regulatório já é praticado pela Financial Conduct Authority (FCA) britânica desde junho de 2016 e é considerado um grande sucesso. O Regulatory Sandbox Lessons Learned Report, publicado em outubro de 2017, reporta que “o acesso à experiência em regulamentação que o sandbox oferece reduziu o tempo e custo para obter ideias inovadoras ao mercado”, além de “criar salvaguardas de proteção do consumidor em novos produtos e serviços”.

A iniciativa pretende abranger projetos relacionados a blockchain, criptomoedas e “tokenização”. Apesar de o modelo da ICVM 626 preterir negócios muito incipientes, as portas estão abertas para as fintechs e empresas cujas atividades estejam relacionadas à criptoativos.

A potencial alta na demanda de produtos financeiros mais acessíveis e de obtenção de crédito, bem como a valorização dos criptoativos durante a pandemia da Covid-19, aliadas às normativas emitidas, como a do sandbox regulatório e do open banking, tendem a criar um cenário mais favorável para que as empresas que empreguem tecnologia em serviços financeiros inovadores ganhem força no mercado brasileiro.

Antonio Berwanger, superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM, declarou que “se você pretende criar uma plataforma, por meio de um contrato inteligente, que vai permitir que um terceiro faça uso da plataforma para emitir um valor mobiliário que ele possui, bom, isso pode ser um exemplo interessante que podemos analisar no ambiente do sandbox (...)  Temos que estar abertos à inovação e olhar para ela em função daquilo que é nosso ambiente como regulador”.

Apenas saberemos se o sandbox trará os resultados esperados após um período experimental do próprio modelo. Contudo, o mecanismo tem o potencial de gerar um grande diferencial no mercado de capitais, desde que conceda espaço a empresas menos robustas. A relativização ou suspensão de alguns requisitos regulatórios rígidos permitirá que diversas empresas coloquem em prática o seu modelo de negócio, o que não seria possível pelo tradicional modo de aprovação de suas atividades.

Quanto ao receio de que um ambiente regulado iniba a inovação, acreditamos que a incerteza regulatória é o maior risco para as empresas e que o desenvolvimento saudável do setor está relacionado ao incentivo à inovação na mesma medida em que os direitos e a proteção ao consumidor sejam garantidos.

*Nicole Katarivas e Raquel Lamboglia Guimarães são advogadas do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.

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