Como ficam as assembleias virtuais com o término do Regime Jurídico Emergencial?

Foi criada uma nova realidade jurídica nos condomínios/Pixabay
Foi criada uma nova realidade jurídica nos condomínios/Pixabay
Reuniões online poderão continuar ocorrendo independente de previsão da convenção e pelo simples fato de não contrariar a lei.
Fecha de publicación: 06/11/2020

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O ano de 2020 ficará sem dúvida marcado na história da humanidade, assim como lembramos do ano do primeiro homem na Lua (1969), do ano do término da segunda grande guerra (1945), do ano da queda das torres gêmeas (2001), lembraremos deste momento e o que estávamos fazendo ao longo deste longo ano. E o gestor condominial lembrará do divisor de águas foi a implementação das assembleias virtuais. 

Confesso que por muitos anos fui contrário à prática das assembleias virtuais, até porque antes da Lei 14.010/20 tínhamos como subsídio legal apenas a previsão na Lei das sociedades anônimas (12.431/2011 Art. 121) que era utilizada por analogia para interpretar as leis condominiais que já previa a possiblidade da realização da assembleia a distância e a possibilidade de inserção na convenção mediante alteração deste instrumento (2/3). Porém, sempre me ative à pouca jurisprudência sobre o tema e aos restritos artigos do Código Civil que não exauriam as múltiplas questões em âmbito condominial e por isso, até a Lei 14.010/20, preferi ser conservador a ter que orientar os condomínios a correrem riscos com a realização de tal prática e terem por consequência suas reuniões anuladas. 

A lei 14.010/20 (Art.12) permitia até 30 de outubro de 2020 a realização de assembleias no âmbito virtual. E neste cenário inusitado, em pleno estado de exceção que estamos vivendo, que se criou uma nova realidade jurídica nos condomínios, um verdadeiro divisor de águas. Se antes da lei 14.010/20 as controvérsias sobre assembleias virtuais, que até então eram raras na Justiça, passaram a partir da vigência da lei a ter vasto repertório jurisprudencial em função das controvérsias trazidas pelo tema, sempre no sentido da viabilidade desta assembleia de forma virtual, ainda que com fundamento na lei transitória. Porém, o que chama mais atenção é a gritante aceitação por parte da sociedade quanto à implantação das assembleias em âmbito virtual. 

E o que seriam as leis senão o reflexo dos anseios da sociedade. E neste momento a sociedade clama pela realização das assembleias virtuais, sejam estas por sistemas de vídeo (zoom, teams,...), ou por sistemas estáticos onde os votos possam ser computados somente após login no sistema e pauta pré-definida.

E para fundamentar a realização das assembleias virtuais agora precisamos nos socorrer à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que define que a omissão da lei será decidida pelo juiz de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito ( Art. 4º) e ainda que a aplicação da lei se dará para atender os fins sociais que se destinam e as exigências do bem comum (art. 5º). 

E neste esteio precisamos interpretar os artigos acima em conjunto com os princípios gerais do direito civil, como por exemplo, o princípio da legalidade diz que: “É permitido ao particular fazer tudo aquilo que a lei não proibir”.

Os artigos 1.352 e 1.353 do Código Civil trazem a menção expressa da votação “presencial” quando menciona quóruns de votação, mas é imperioso que a interpretação seja realizada no contexto do tempo em que a lei foi promulgada (2002). Momento este em que não era sensato pensar em assembleias virtuais no âmbito condominial. Porém, em contradição os artigos mencionados, os artigos 1.334 e o 1.350 estabelecem que a convenção condominial tem poderes para definir a sua forma de convocação e trazer a assembleia virtual para a sua comunidade.

Assim, conclui-se até aqui que a assembleia virtual pode ser prevista na Convenção do Condomínio. 

E se a convenção não prever a forma de convocação (Art. 1.350 do CC), será necessário a alteração deste instrumento pelo voto de 2/3 dos condôminos para possibilitar a assembleia virtual?

Entendo que a intepretação mais segura seria a necessidade de quórum de 2/3 para inserir a possibilidade de assembleia virtual, mas assim como uma enxurrada que desce morro abaixo, a assembleia virtual será uma realidade e caberá aos doutrinadores e aos operadores do direito abrirem os caminhos para minimizar os impactos da passagem desta enxurrada. 

E indo de encontro ao acima exposto, utilizando-se da analogia as assembleias virtuais das sociedades anônimas, da lei de introdução das normas do direito brasileiro, dos anseios da sociedade, dos novos usos e costumes e levando em conta o repertório atual dos tribunais sobre o tema, pelo fato da lei cogente não vetar tal prática, as assembleias virtuais serão perpetuadas independente de previsão na convenção condominial, salvo se houver: disposição em contrário na convenção, nova lei proibindo a prática ou se a consolidação das jurisprudências vier em sentido contrário às reuniões virtuais. Caso isso não ocorra, as reuniões virtuais poderão continuar ocorrendo independente de previsão da convenção e pelo simples fato de não contrariar a lei. 

*Rodrigo Karpat é sócio fundador do escritório Karpat Sociedade de Advogados.

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