A reforma da Lei de Recuperações e Falências e o incentivo da conversão de dívida em capital

Mudanças dão incentivos a investidores/Pixabay
Mudanças dão incentivos a investidores/Pixabay
Alterações tendem a propiciar um melhor ambiente de negociação e recuperação de crédito
Fecha de publicación: 14/12/2020

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A conversão de dívida em capital é uma importante alternativa de reestruturação disponível para empresas em dificuldade financeira e com alto índice de endividamento, que tem por melhor qualidade a readequação do passivo financeiro, redução do serviço de dívida e melhora nos índices financeiros, liquidez e solvência.

No entanto, de acordo com a atual legislação, a conversão de dívida em capital traz questões relevantes tanto para os atuais acionistas quanto para os credores, inibindo sua utilização no cenário de reestruturação.

O desincentivo para os atuais acionistas é a diluição da sua participação, com a eventual perda do controle e, consequentemente da gestão do negócio. Já para os credores, o receio é o de suportarem eventuais contingências do devedor em razão de sucessão e/ou desconsideração da personalidade jurídica do devedor após a conversão.

Para endereçar a preocupação de diluição dos acionistas a Lei das Sociedades Anônimas confere a todos os acionistas o direito de preferência, seja na subscrição de novas ações ou valores mobiliários decorrentes de aumento de capital destinado à capitalização de dívidas. No entanto, a proteção conferida aos acionistas é justamente o que acaba, na prática, inviabilizando o uso do mecanismo pelos credores, porque nesse conflito de interesses a balança acaba pendendo para o lado dos acionistas.

Essa inclusive foi a disputa travada no âmbito da recuperação judicial do Grupo Oi, no qual determinado grupo de detentores de valores mobiliários emitidos no exterior buscavam viabilizar um plano de recuperação que previsse a conversão de dívida em capital, o que sofria resistência dos então acionistas do grupo.

E os credores que já veem o pêndulo se deslocar desfavoravelmente a eles diante da preferência dos acionistas na subscrição do aumento de capital também não encontram melhor salvaguarda em relação à possível sucessão de passivos da empresa devedora.

Então, muito embora a conversão de dívida em capital possa, a depender da circunstância e estratégia, refletir estratégia vantajosa para o devedor e para o credor, à luz da atual legislação há questões importantes para sua implementação.

Contudo, esse cenário pode ser substancialmente alterado com a entrada em vigor das alterações à Lei nº 11.101/2005, a Lei de Recuperações e Falências (LRF), que já foram aprovadas pela Câmara dos Deputados e, recentemente, pelo Senado Federal no âmbito do Projeto de Lei nº 4.458/2020, que ainda aguarda sanção presidencial.

Nos termos do Projeto, a conversão de dívida em capital social passa a ser explicitamente indicada como um dos meios de recuperação judicial previstos na LRF. Além disso, o plano de recuperação apresentado por iniciativa dos credores – importante inovação do Projeto - poderá prever a capitalização dos créditos, inclusive com a alteração de controle da sociedade devedora, hipótese na qual o acionista ou sócio poderá exercer direito de retirada caso não concorde com a medida.

Dessa forma, a redação do Projeto evidencia que a conversão de dívida em capital social poderá ocorrer independentemente do consentimento do acionista e/ou deliberação em assembleia geral.

A ideia é endereçar o embate usual entre credores e acionistas porque, se por um lado a previsão confere importante prerrogativa aos credores ao permitir a capitalização de créditos, por outro garante aos atuais acionistas a proteção diante dessa deliberação mediante o exercício do direito de retirada.

E, além de endereçar a dicotomia existente entre acionistas atuais e credores, o Projeto inclui na LRF expressa previsão no sentido de que “não haverá sucessão ou responsabilidade por dívidas de qualquer natureza a terceiro credor, investidor ou novo administrador em decorrência, respectivamente, da mera conversão de dívida em capital, de aporte de novos recursos na devedora ou substituição dos administradores desta”.

Desta forma, endereça-se também um dos fatores que historicamente afastou o interesse dos credores em se tornarem efetivos titulares da sociedade devedora, na medida que as contingências existentes no momento da conversão não os afetarão pelo mero fato de terem ingressado no capital social da sociedade em recuperação como forma de pagamento de seus créditos.

Portanto, caso sancionadas pelo presidente da República, as alterações à LRF previstas no Projeto em relação à conversão de dívida em capital tendem a propiciar um melhor ambiente de negociação e recuperação de crédito pelos credores, além de conferir incentivos a investidores em empreender estratégias tendentes à aquisição de ativos ou sociedades mediante aporte de recursos em empresas em dificuldade e implementação de conversões de dívida em capital no âmbito de processos de insolvência.

*Guilherme Fontes Bechara e Ana Carolina Botto Audi são sócios de Demarest Advogados.

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