“Desafio será conciliar sessões presenciais e virtuais”, diz presidente do Carf

Adriana Gomes Rêgo, presidente do Carf, afirma que regras pós-pandemia foram bem-sucedidas/ Edilson Rodrigues/Agência Senado
Adriana Gomes Rêgo, presidente do Carf, afirma que regras pós-pandemia foram bem-sucedidas/ Edilson Rodrigues/Agência Senado
Em entrevista a LexLatin, Adriana Gomes Rêgo fala dos desafios de seu terceiro ano como presidente do principal tribunal de impostos do país.
Fecha de publicación: 22/01/2021

A presidente do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), Adriana Gomes Rêgo, apontou que o principal desafio de 2021 será a possibilidade de o tribunal administrativo receber, simultaneamente, julgamentos presenciais e virtuais, passando a absorver parte do aprendizado de dez meses de pandemia.

 

Em entrevista exclusiva à LexLatin, Adriana - que chega a seu terceiro ano como presidente do principal tribunal de impostos do país - afirmou que o desafio continua a ser a diminuição do estoque, tendo como principal critério a temporalidade de processos administrativos mais antigos. Adriana também respondeu a questões sobre a dificuldade tributária de empresas no país, assim como a possibilidade de equiparação de conselheiros e as novas regras sobre o voto de desempate, aprovadas em 2020.

 

Confira a íntegra da entrevista, realizada na última quinta-feira (21):

 

Nesse período tão atípico, como é a sua avaliação sobre o Carf em 2020 e como se formam as expectativas em 2021?

 

O ano de 2021 está começando como terminamos 2020: virtual, não mudou nada. Mas nosso grande desafio vai ser, quando voltarmos às sessões presenciais, de consolidar as duas modalidades de sessão. Não imagino que a gente vai abandonar uma forma de sessão que produziu bons resultados, que é essa virtual, até pela acessibilidade que ela confere, permitindo a advogados de todo o Brasil participar e acompanhar.

 

Me lembro de receber advogados em janeiro ou fevereiro de 2020, advogados do Pará, Amazonas, pedindo para que o Carf fizesse um julgamento virtual. Olha só...A gente não imaginava que ia conseguir no curto espaço de tempo oferecer essa modalidade. E a pandemia nos forçou a fazer este tipo de julgamento. 

 

Dá para notar essas diferenças?

 

Na 2ª Seção, por exemplo, temos percebido que processos de pequeno valor têm sido acompanhados e sustentados por seus advogados. Não vamos abandonar [o julgamento virtual], mas sabemos que há a procura pelo julgamento presencial. Vamos ter que controlar isso, nossa logística vai mudar quando retomarmos. 

 

Para cada um dos 18 colegiados teremos duas modalidades de pauta – a presencial e a virtual. Podemos sair de uma pauta virtual a pedido da parte e ir para a presencial, assim como um pedido de vistas pode fazer com que o processo vá para a virtual. Vai ser um controle maior para o Carf, mas para a sociedade será um ganho. O contribuinte está escolhendo como ele quer participar.

 

Vocês trabalham com alguma previsão do retorno às reuniões presenciais?

 

Não temos. Diferente de todos os outros tribunais administrativos estaduais e municipais – que também não voltaram às suas atividades – e de tribunais superiores, o Carf tem todos os 95% dos seus membros morando fora da sede, o que envolve deslocamento. 

 

E eu não posso colocar em risco a vida dessas pessoas e não temos condições de fazer este afastamento nos plenários, fazendo sustentações em plenário. Não dá para dar este distanciamento. Isso ia envolver uma mudança da nossa estrutura, um custo que não se justifica porque sempre estamos nessa iminência: quando estávamos em abril, achávamos que íamos retornar no segundo semestre; no segundo semestre, achávamos que até o final do ano íamos retornar. Mas estamos acompanhando e ao mesmo tempo não estamos parados. Estamos julgando muito.

 

Ainda não fechamos os dados de dezembro, mas entre junho e novembro do ano passado nós julgamos 48% a mais do que junho a novembro de 2019. A quantidade de processos foi quase 50% maior. Repetitivos que pautamos foi 117% a mais nesse período. O Carf não está parado, e estamos conseguindo atacar outras frentes.

 

No início do julgamento virtual, ouvi algumas reclamações de advogados sobre o sistema, mas houve até alguns elogios por parte de conselheiros mais recentemente. Que análise é possível fazer sobre a qualidade do julgamento administrativo virtual?

 

Qualidade de julgamento envolve o fator da relatoria do conselheiro – que não mudou nada – e o julgamento do colegiado. É possível que as primeiras reclamações tenham ocorrido porque no primeiro mês, se não me engano, fizemos uma forma de sustentação oral apenas gravada. Queríamos voltar logo, pois não queríamos ficar muito tempo sem sessão, mas tivemos que treinar os 180 conselheiros e ainda toda a retaguarda, o back office que há por trás do Carf. Para que essa equipe pudesse fazer o que estamos fazendo hoje, há uma logística onde sempre alguém acompanha a sessão e há uma sala de espera virtual própria para os patronos. 

 

Quando o presidente apregoa o processo, este assistente chama o patrono na sala de espera virtual, e o patrono entra na sala do colegiado. Antes, era apenas gravado, mas, depois que conseguimos implementar esta sistemática, a equipe tem dito que os advogados andam elogiando a forma de trabalho. Isso foi fruto de orientação, onde respeitamos as prioridades para advogados de acompanhamento tal qual numa sessão presencial. Então não vejo grandes prejuízos não.


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Há uma onda de desindustrialização do país e recentemente a saída de empresas do Brasil jogou luz para o que se consideram obrigações tributárias excessivas. Qual é a parte do Carf nesta história?

 

Uma coisa é o sistema tributário, outra coisa é o Carf, que aplica a lei ao caso concreto, e os conselheiros analisam o processo e dão aquela interpretação. Não vejo o Carf como o responsável por esse movimento. Não é nem nossa missão, que é julgar litígios, formar jurisprudência sobre os casos concretos e contribuir para a redução de litígios.

 

O Carf tem procurado julgar. Não tem sido possível julgar processos de grande valor, mas tão logo consigamos fazer sessões presenciais as prioridades serão os processos de grande valor, sempre priorizando os processos para que as grandes empresas tenham de forma mais rápida a solução de seus litígios. 

 

A nossa missão aqui é tentar solucionar de forma mais rápida e célere – e temos 105 processos que totalizam 40% do valor do nosso acervo. E nós temos condições de, tão logo voltarmos a julgar [presencialmente], se tomarmos como prioridade os julgamentos de maior valor, conseguimos resolver. Nosso foco neste momento é temporalidade e quantidade, repetitivo e tempo. Quando pudermos, iremos priorizar os processos de grande valor para solucionar o que nos chega. Nosso papel e nossa ajuda será nesse sentido.

 

Em um eventual recrudescimento da pandemia, é possível trazer esses julgamentos de grande valor para o julgamento virtual?

 

Estamos estudando atacar a temporalidade. Eu tenho 100 mil processos de estoque e 95% deste acervo está contemplado nesse teto de R$ 12 milhões que colocamos agora aos processos. Se você olhar para a sociedade como um todo, você vai notar que é um universo muito grande que está sendo contemplado.


Em 2021 vamos focar também na possibilidade de julgar processos de maior valor para os quais existe decisão transitada em julgado. A diretriz que eu passei no final do ano foi de varrer todos os processos que versem sobre súmulas do Carf ou precedentes vinculantes, porque para estes casos há previsão regimental para julgamento virtual, independente de valor. Se eu conseguir também atacar estes casos, eu consigo enxugar o estoque também pela questão do valor. É um enfoque que estamos dando.

 

Há previsão para um Pleno do Carf em 2021?

 

Não aprovamos súmulas em 2020, mas pretendemos retomar em 2021. Porque vieram tão poucas propostas que não justificava fazer o Pleno em 2020. Houve pouca aderência pelos conselheiros no ano passado, mas pretendemos fazer o Pleno no segundo semestre de 2021. Se tivéssemos mais súmulas, seriam mais mais processos que julgaríamos virtualmente.   

 

Uma mudança muito relevante ao dia a dia do Carf foi o fim, via lei, do chamado "voto de qualidade". Alguns advogados apontam, porém, certa dificuldade de ver esse conceito aplicado nos julgamentos do tribunal. Por que ainda existe essa discussão? 

 

Ninguém pode decidir contrário a uma lei. Semana passada eu mesmo apliquei por experiência própria. Eu desconheço quem não esteja aplicando a lei. O que nós não estamos conseguindo é atualizar o gerencial, que ainda segue com dados de junho, porque nosso e-processo, num âmbito gerencial, passa por um processo de homologação que dura algum tempo já. Quando atualizar, será possível ver o percentual. 

 

Mas a situação, até onde eu sei, está sendo aplicada. No mesmo dia que saiu a lei, inclusive, demos a orientação – porque estava tendo o julgamento nas turmas extraordinárias quando a lei foi sancionada.

 

Um advogado com quem conversei já chegou a usar o termo "inconformismo" dos agentes fiscais em relação ao dispositivo…

 

O que pode acontecer é o patrono buscar a aplicação retroativa, por exemplo – e isso os patronos têm pedido, mas ninguém tem aplicado. Julgamentos ocorridos em 2018, 2019...

 

E como ficam, para o ano de 2021, algumas das reivindicações dos conselheiros dos contribuintes por equiparação salarial e um certo tipo de equalização com os conselheiros da Fazenda Nacional?

 

Em termos salariais é difícil pensarmos em aumento para qualquer categoria. Eles buscam aumento salarial – e esse é um dos pleitos, foi encaminhado, já tiveram reuniões. Mas ninguém cogita com a economia que estamos vivendo. Eu Vejo com muita dificuldade esta questão.


Em termos de direito acho mais difícil ainda porque isso dependeria de lei. Quando eles entram no Carf, eles sabem que terão uma gratificação por presença e por produtividade e já sabem qual é o regime. 

 

É legítimo todo mundo pleitear outros valores e formas, mas quem entra no Carf já sabe como é o regime, que não fizeram concurso público, que podem renunciar daqui dois anos se houver proposta melhor no mercado, uma vez que adquiriram experiência aqui. Lamento a alta rotatividade, não é boa. Mas o regime, para mudar, tem que ser na lei. Eles [conselheiros dos contribuintes] pagam impostos como contribuinte individual, eles não recolhem como servidor público. É um regime, um vínculo com a administração tirbutária diferente.  


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