
Israel não está entre os países que mais consomem sorvete no mundo. Segundo a Associação Internacional de Produtos Lácteos (IDF, sigla em inglês), a lista é encabeçada pela Nova Zelândia, Estados Unidos, Suíça e Suécia. Na região da Ásia-Pacífico, o rei do mercado é a China, segundo a Mordor Intelligence, que também reconhece a Unilever como marca líder na região.

Mas o que torna o país do Oriente Médio o centro de uma disputa judicial entre a multinacional anglo-holandesa e a Ben & Jerry's, sua subsidiária norte-americana, adquirida em 2000 por 326 milhões de dólares, além de ter realizado um feito inusitado?
Desde a sua fundação, em 1978, pelos norte-americanos de ascendência judaica Bennet Cohen e Jerry Greenfield, a Ben & Jerry's tem se caracterizado por exercer o ativismo de marca, embora isso lhe tenha custado duras críticas. Assim foi contra a ocupação de territórios por Israel na Cisjordânia e em julho de 2021 anunciou sua decisão de não renovar a licença da Avi Zinger, empresa israelense encarregada de distribuir e comercializar sorvetes sob a modalidade de franquia. A determinação levou alguns investidores da Unilever a vender ações e títulos da empresa.
Então, Cohen e Greenfield, também ativistas e filantropos, publicaram um anúncio sob o título “Nós somos Ben e Jerry, homens de sorvete, homens de princípios” no The New York Times, para deixar claro seu direito de questionar as políticas do Estado de Israel.
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A polêmica venda já fechada
Diante da recusa dos fundadores da fabricante de sorvetes, a Unilever interveio e em junho deste ano decidiu vender os direitos comerciais de sua marca Ben & Jerry's para Avi Zinger. Conforme acordado, os produtos da Ben & Jerry's podem continuar a ser vendidos em Jerusalém Oriental e em assentamentos judaicos na Cisjordânia, com o logotipo escrito em hebraico e árabe. A venda já foi fechada.
A decisão da Unilever gerou uma resposta favorável do Estado de Israel, que questionou a atitude "antissemita" da marca de sorvetes. Diz-se que até um porta-voz do governo israelense interveio na negociação entre a Unilever e Avi Zinger.
Diante disso e na ausência de consulta ao seu conselho de administração independente, em 5 de julho, a subsidiária integral da Unilever foi a um tribunal distrital federal de Nova York para requerer a nulidade da negociação com uma liminar, argumentando que viola seus valores fundadores, incluídos em sua missão social, e cujo cumprimento é monitorado por ela.
A empresa de sorvetes tem apoio de uma lei de marcas registradas que protege a aparência de um produto e o diferencia de produtos similares no caso de, com a transferência do conhecimento e da marca para o licenciado da Ben & Jerry's em Israel, poder lançar um produto com uma visão oposta para apoiar causas sociais usando a mesma receita, aparência e sensação.
No entanto, o tribunal decidiu em 22 de agosto contra a petição, observando que a Ben & Jerry's não demonstrou que sofreria danos irreparáveis ou que a possível oferta de novos produtos da Avi Zinger poderia causar confusão entre os consumidores. As partes em disputa também não conseguiram chegar a um acordo extrajudicial.
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Qual será o resultado desse conflito incomum?
Efraim Benmelech, professor de finanças da Kellogg School of Management e colaborador da Forbes, escreveu recentemente que a Unilever deveria vender a Ben & Jerry's, pois essa disputa incomum sugere que ela não se vê como parte da empresa, além de colocar em risco seus acionistas.
No início deste ano, especulava-se a possível venda de marcas como Ben & Jerry's ou Magnum, consideradas de crescimento lento, para que a Unilever pudesse melhorar sua oferta de 69 bilhões de dólares para a GSK Consumer Healthcare, divisão de consumo da britânica GlaxoSmithKline, rejeitada por estar abaixo das expectativas.
A Unilever descartou tal possibilidade e vê a empresa como parte do grupo no longo prazo. A empresa questiona que sua subsidiária tenha desviado sua missão social para a geopolítica.
O caso se torna ainda mais interessante considerando o rumo que pode tomar quando a empresa de sorvetes entrar com uma ação emendada no final de setembro, conforme anunciado em uma carta enviada ao tribunal no início da semana passada. A resposta da Unilever deve ser dada em 1º de novembro, segundo a agência de notícias Reuters.
Também coloca na mesa a conveniência de que marcas com propósito podem ser adquiridas por empresas listadas em bolsa, dada a mobilidade de executivos que nelas ocorre.
A Ben & Jerry's, que produz as marcas Cherry Garcia e Chunky Monkey, entre outras, faturou US$ 1 bilhão em vendas pela primeira vez em 2021. Segundo a Reuters, esta é uma das 13 marcas a atingir esse marco na Unilever.
Outras causas que a empresa apoia são os direitos LGBTI+, o direito de asilo e a justiça climática.
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