Um projeto em tramitação na Câmara dos Deputados quer alterar um dispositivo do Código de Processo Civil para permitir a utilização de QR Codes nos processos judiciais eletrônicos em todo o país. A proposta (PL 1.643/2021) foi apresentada no fim de abril e aguarda despacho do presidente da Câmara dos Deputados.
O uso do QR Code em autos judiciais eletrônicos vem crescendo e já é amplamente difundido, sendo utilizado inclusive para negociação de acordos judiciais.
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"Acionando o leitor de QR Code através da câmera do celular, o advogado da parte ou o próprio autor, caso não seja assistido por um advogado, conecta-se ao atendimento por WhatsApp. E informando apenas o número do processo, dá início à negociação de um acordo, trazendo benefícios para as partes envolvidas e, sobretudo, para o Judiciário, reduzindo o volume de processos para decisão", explica o advogado Ricardo Alves, head da área de tecnologia do Fragata e Antunes Advogados.
O projeto de Lei em tramitação no Congresso destaca como justificativa, por exemplo, a redução de custos. O QR Code também permitiria a uma pessoa gravar o próprio depoimento, sem a necessidade de redigir um documento ou se dirigir a algum cartório local para fazer eventual declaração.
Em vez de realizar uma diligência, comparecendo ao local, o magistrado designaria um oficial de Justiça para registrar determinada situação. O juiz, no momento de apreciação de uma tutela provisória, poderia examinar um vídeo ilustrativo ou slides, com explicações técnicas sobre o objeto em discussão.
A tecnologia também pode acabar com o acautelamento de mídias em cartório. Como normalmente o sistema do processo eletrônico não permite o upload de arquivos com material audiovisual, as partes, na prática, são obrigadas a acautelar o material em cartório. E isso dificulta e burocratiza a análise da prova pelo magistrado.
Há ainda a possibilidade de despachos virtuais. O advogado pode inserir um QR Code nos memoriais distribuídos em segundo grau, permitindo que o relator ou os vogais, diante da indisponibilidade ou ausência ocasional, possam “escutar” ou mesmo "assistir", ainda que virtualmente, as ponderações.
A mesma sistemática vale para audiências pessoais em primeiro grau (artigo 7º, VIII, da Lei 8.906/94), sobretudo quando se postula tutela provisória na petição inicial. Neste último caso, pode haver um reforço do contraditório, pois a parte contrária terá, na prática, acesso ao “conteúdo destacado no áudio/vídeo”, o que não é possível nos atendimentos individuais em gabinete.
“Portanto, caso seja aprovado, este PL formalizará uma prática que já vem auxiliando partes, advogados e magistrados, especialmente em tempos de pandemia”, afirma Ricardo Alves.
Para Wilson Sales Belchior, sócio do RMS Advogados e conselheiro federal da OAB, o PL 1.643 “se alinha à necessidade de se fazer compreender enquanto condição para uma solução legal criativa e inovadora. Inserir o QR Code na forma dos atos processuais favorece uma transformação do Direito com abertura às novas tecnologias e focada no aperfeiçoamento institucional, solução mais apropriada de conflitos e celeridade dos procedimentos".
O advogado José Roberto Cortez, sócio fundador do Cortez Advogados, explica que “embora alguns setores do Judiciário sejam absolutamente refratários a mudanças na agilização processual, como é o caso de citações por correio ou eletrônicas — estas sequer regulamentadas pelo Superior Tribunal de Justiça —, sem sombra de dúvida a introdução de qualquer dispositivo eletrônico que possa agilizar a tristemente famosa burocracia e morosidade do Judiciário será sempre, útil e bem vinda”, avalia.
Carlos Eduardo Baladi Martins, advogado da área de contencioso do Costa Tavares Paes Advogados, acredita que a inovação proposta é positiva, uma vez que dispensará o depósito de mídias em cartório, “haja vista que o material poderá ser acessado através do QR Code. Além disso, o magistrado poderá ter acesso a documentos de forma mais rápida e prática do que atualmente”.
Martins faz, no entanto, um alerta: “Os operadores do direito que pretenderem se valer de tal procedimento, deverão estar muito atentos para anexar o QR Code referente ao documento que se intenta apresentar. Isso porque a inserção do QR Code de documento diverso pode trazer consequências contrárias à pretendida”.
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Donne Pisco, sócio fundador do Pisco & Rodrigues Advogados, defende que a redação da norma deveria prever que os conteúdos que poderão ser acessados pelo QR Code tenham análise obrigatória pelo magistrado. “Essa deve ser uma ferramenta central na veiculação das teses e argumentos pelas partes, o que teria o efeito de gerar maior efetividade à prestação jurisdicional por meio das novas tecnologias”, diz.
Para os especialistas, o PL pretende normatizar uma questão prática já empregada no âmbito do processo judicial, sobretudo após o advento do Processo Judicial Eletrônico e depois da pandemia de Covid-19.
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