7 de setembro: futebol no jogo político

A confusão entre brasileiros e argentinos sintetiza à perfeição o quadro geral do país hoje - desrespeito às regras, carteiradas e jogo de empurra/Lucas Figueiredo/CBF
A confusão entre brasileiros e argentinos sintetiza à perfeição o quadro geral do país hoje - desrespeito às regras, carteiradas e jogo de empurra/Lucas Figueiredo/CBF
Como os jogadores burlaram as regras sem que as autoridades interviessem?
Fecha de publicación: 07/09/2021

Ao longo da história, o futebol tem sido utilizado como instrumento de propaganda política. Desde Mussolini, que pode ser apontado como corresponsável (para o bem e para o mal) pelos dois títulos da Squadra Azzura nos anos trinta até o regime militar brasileiro com o escrete canarinho, o esporte sempre foi um bom palco para os detentores do poder. Não podia ser diferente no governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

Recentemente, o Brasil foi centro de uma crise, quando sediou a Copa América justamente no auge da pandemia. Cabe lembrar que o país não era a primeira opção para a realização do torneio, mas acabou aceitando, com o aval do Planalto. Os apoiadores do presidente da República celebraram, enquanto parcela significativa da população manifestou-se contra. A polarização, mais uma vez, esteve em campo.


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Agora, neste tenso 7 de setembro, novamente o futebol adentra o terreno da política. O clássico Brasil x Argentina, válido pelas eliminatórias da Copa do Mundo, foi interrompido pela ação da Anvisa por um motivo claro - quatro jogadores argentinos descumpriram as regras de quarentena para a Covid e estavam no jogo. Irregularidade evidente, um risco sanitário absoluto com o advento das novas variantes da doença.

Aqui fica a questão. Como os jogadores, que estavam no Brasil já há alguns dias, burlaram as regras sem que as autoridades interviessem? Algo errado está no ar.

Evidente que houve conivência das autoridades esportivas - CBF, AFA (Associação de Futebol da Argentina) e a sul-americana Conmebol são responsáveis diretas pelo imbróglio. Mas a questão pode não parar por aí.

Há suspeitas, investigadas pela imprensa, de que o governo federal teria dado o aval à realização do clássico, mesmo sob condições irregulares. Segundo o diário argentino Clarin, o próprio Bolsonaro teria entrado em contato com a CBF para tentar reiniciar a partida. É claro que a denúncia se deu no calor dos acontecimentos, mas tudo precisa ser apurado.


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Assim, não surpreende a imediata politização dos fatos. O neopedetista Ciro Gomes elogiou a ação da Anvisa, a quem chamou de “craque do jogo”. O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, cobrou a mesma firmeza da agência em relação aos atos de Bolsonaro. Já o senador Flávio Bolsonaro (Patriota/RJ) chamou os argentinos de “malandros” e clamou por uma investigação da Polícia Federal. Até mesmo a CPI da Covid quer saber quais foram os responsáveis pelo ocorrido.

Em suma, um simples jogo de futebol ganha nova dimensão em meio ao já conturbado ambiente. A confusão entre brasileiros e argentinos sintetiza à perfeição o quadro geral do país hoje - desrespeito às regras, carteiradas e jogo de empurra. Ruim para todos. Que o 7 de setembro seja a reprise de outro Brasil x Argentina, na Copa do Mundo de 1978, quando a esperada batalha campal não ocorreu.

*André Pereira César é cientista político.

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