Alesp perde a chance de dar o exemplo no caso de assédio de Fernando Cury contra Isa Penna

"Resta a expectativa de que, na discussão em plenário, onde  deputados têm direito a voto secreto, o parlamento decida proteger a vítima, ao invés do agressor"/Reprodução/TV Alesp
"Resta a expectativa de que, na discussão em plenário, onde  deputados têm direito a voto secreto, o parlamento decida proteger a vítima, ao invés do agressor"/Reprodução/TV Alesp
Na Semana da Mulher, ao somente suspender o deputado e manter seu mandato, o Conselho de Ética da Assembleia deixa um mau exemplo a toda a sociedade.
Fecha de publicación: 05/03/2021

Para receber nossa newsletter diária inscreva-se aqui!

O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo aprovou nesta sexta-feira (5) a suspensão do mandato do deputado estadual Fernando Cury (Cidadania) por 119 dias. Cury foi flagrado pelas câmeras da TV Alesp em ato que pode caracterizar quebra de decoro por importunação sexual contra a também deputada Isa Penna (PSOL) dentro do plenário da Alesp em dezembro de 2020.

Na Semana da Mulher, ao somente suspender Cury, mantendo seu mandato, o Conselho de Ética da Assembleia deixa um mau exemplo a toda a sociedade, que luta pelo fim da violência contra a mulher, do machismo e pelo respeito às mulheres.

Fica a impressão de que, para o conselho, apalpar o seio de uma colega dentro do plenário não é um crime, mas somente uma ação irresponsável, que deve ser punida com, no máximo, uma reprimenda, visto que, pelo regimento interno, uma pena inferior a 120 dias caracteriza uma licença e mantém o gabinete do deputado funcionando normalmente.


Veja também: O caso Mariana Ferrer, machismo estrutural e “estupro culposo”


A Lei n°13.718/18 define o ato de importunação sexual caraterizado pela realização de ato libidinoso na presença de alguém de forma não consensual, como o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro.

O texto inclui a conduta como a de Cury, ao enquadrar também ações como beijos forçados e passar a mão no corpo alheio sem permissão. Se fosse um cidadão comum, o infrator poderia ser punido com prisão de 1 a 5 anos.

No caso da Assembleia, ao definir essa pena branda, o Conselho de Ética revitimiza a deputada Isa Penna, por não punir exemplarmente seu agressor e mostrar que os deputados agiram com corporativismo ao defender o colega, ao invés de proteger a vítima.

O relatório que salva o mandato de Cury foi assinado pelo deputado Wellington Moura (Republicanos) e teve o apoio dos parlamentares Delegado Olim (PP), Alex de Madureira (PSD), Adalberto Freitas (PSL) e Estevam Galvão (DEM).

Os deputados Emidio de Souza (PT), Maria Lúcia Amary (PSDB), Barros Munhoz (PSDB) e Erica Malunguinho (PSOL) foram contra o relatório e queriam a cassação de Cury, ou, no mínimo, sua suspensão por seis meses.

Cury agiu de forma tão despreocupada e ciente de que não seria punido, que sequer se preocupou com o fato de sua ação ser filmada pela TV Alesp.

O parlamento deveria dar o exemplo e defender a deputada Isa Penna, como um alento e um recado de esperança para todas as mulheres sexualmente vitimizadas diariamente no Brasil. Ao invés disso, reforçou a impunidade, ao proteger o agressor.


Veja também: O machismo nos escritórios de advocacia


Os deputados que votaram a favor do afastamento por 119 dias subestimam a nossa inteligência e desacreditam a vítima. A decisão é um momento triste para todas as mulheres brasileiras, que lutam diariamente contra importunações no transporte coletivo, no trabalho e em outros ambientes.

Resta a todas as mulheres a expectativa de que, na discussão em plenário, onde todos os deputados têm direito a voto secreto, o parlamento decida proteger a vítima, ao invés do agressor.

*Raquel Kobashi Gallinati é presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia de São Paulo.

Add new comment

HTML Restringido

  • Allowed HTML tags: <a href hreflang> <em> <strong> <cite> <blockquote cite> <code> <ul type> <ol start type> <li> <dl> <dt> <dd> <h2 id> <h3 id> <h4 id> <h5 id> <h6 id>
  • Lines and paragraphs break automatically.
  • Web page addresses and email addresses turn into links automatically.