Avanços do cenário e da cultura de proteção de dados no Brasil

Até o momento, os setores mais envolvidos nas ações judiciais fundamentadas na LGPD são os de serviços, infraestrutura (energia) e financeiro/Canva
Até o momento, os setores mais envolvidos nas ações judiciais fundamentadas na LGPD são os de serviços, infraestrutura (energia) e financeiro/Canva
Desdobramentos e expectativas da aplicação da LGPD pela ANDP e pelos tribunais brasileiros.
Fecha de publicación: 12/04/2023

Após pouco mais de dois anos de vigência da Lei nº 13.709/2018 (LGPD ou Lei Geral de Proteção de Dados), o atual cenário de proteção de dados no Brasil vem sendo impulsionado tanto pela atividade regulatória da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) quanto pelo aumento de decisões judiciais que refletem sua interpretação pelos tribunais.

No âmbito regulatório, a ANPD tem direcionado esforços para editar regulamentos e procedimentos sobre proteção de dados pessoais e fortalecer a cultura de privacidade no país. As agendas regulatórias da autoridade, divulgadas a cada biênio, estabelecem os temas que serão objeto de regulamentação. Para 2023, estarão em pauta assuntos relevantes para a efetividade da LGPD, como direitos dos titulares, comunicação de incidentes de segurança e especificação do prazo de notificação e mecanismos de transferências internacionais de dados pessoais.

Recentemente, a ANPD publicou, por meio da Resolução CD/ANPD nº 4/2023, o Regulamento de Dosimetria e Aplicação de Sanções Administrativas, uma das normas mais aguardadas desde a entrada em vigor da LGPD. O regulamento estabelece critérios e parâmetros para a aplicação das sanções administrativas previstas na lei, incluindo a valoração das multas. Em decorrência da aprovação do regulamento, a autoridade passa a ter plenas condições para decidir sobre o primeiro lote de processos administrativos sancionadores instaurados. Ainda, é possível esperar um aumento do escrutínio fiscalizatório em relação a novas infrações.


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Além da atuação normativa e sancionatória na esfera administrativa pela ANPD, vale ressaltar o aumento do número de casos envolvendo a aplicação da LGPD pelos tribunais brasileiros. Dentre os dispositivos com maior relevância nas discussões, destacam-se aqueles relativos aos conceitos, princípios e bases legais que autorizam o tratamento de dados, bem como as disposições que tratam de responsabilidade e ressarcimento de danos.

Determinados tribunais têm se destacado no julgamento de demandas de natureza cível relacionadas à privacidade e proteção de dados, a exemplo do Tribunal de Justiça dos Estados de São Paulo, da Bahia e de Minas Gerais e do Tribunal do Distrito Federal. Até o momento, os setores mais envolvidos nas ações judiciais fundamentadas na LGPD são os de serviços, infraestrutura (energia) e financeiro, sendo que a maior parte dos casos foi ajuizada pelos titulares de dados.

Diante do aumento de litígios envolvendo a lei, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) recentemente enfrentou julgamento no qual avaliou o cabimento de indenização por danos morais em razão da ocorrência de incidentes de segurança. 


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Para fundamentar sua conclusão, a 2ª Turma do STJ delimitou importantes contornos para a aplicação da LGPD. O primeiro estabelece que o rol de dados pessoais sensíveis da LGPD seria taxativo, ou seja, somente os dados listados no artigo 5º, II da LGPD constituem dados pessoais sensíveis. Nesse sentido, o mero conhecimento dos dados pessoais “não-sensíveis” ou “comuns” ― normalmente presentes em cadastros e fornecidos em atividades corriqueiras do dia a dia, como nome, telefone, endereço ― por terceiros não violaria o direito de personalidade do titular. O segundo determina que o vazamento de dados pessoais “comuns” por si só não enseja dano moral indenizável. Como resultado, o prejuízo nesses casos não é presumido e o titular que propuser uma ação judicial pleiteando reparação deverá comprovar o dano advindo da exposição dos seus dados pessoais.

À luz da evolução do cenário de proteção de dados acima, é possível traçar expectativas para o futuro. Espera-se que a ANPD intensifique a regulamentação de aspectos relevantes para a aplicação efetiva da LGPD, bem como a sua atividade repressiva e sancionatória. Com uma atuação cada vez mais ativa, a autoridade pretende ampliar o quadro de servidores e empregados públicos, além de firmar parcerias com outros órgãos e agências setoriais para regulação de temas específicos.

Com relação à aplicação da lei pelos tribunais brasileiros, é certo que a decisão proferida pela 2ª Turma do STJ servirá como importante precedente para casos semelhantes e, juntamente com as decisões dos tribunais estaduais, passa a compor a jurisprudência de proteção de dados que vem sendo construída no país. 

*Fabio F. Kujawski, Luiz Felipe Di Sessa, Paulo Brancher e Thiago Sombra são sócios do Mattos Filho.

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