Como a Lei Maria da Penha ajudou a reduzir a violência doméstica no Brasil

O machismo resiste e mulheres vítimas de violência são revitimizadas tanto em delegacias quanto nas audiências/Paulo Pinto/AGPT/Fotos Públicas
O machismo resiste e mulheres vítimas de violência são revitimizadas tanto em delegacias quanto nas audiências/Paulo Pinto/AGPT/Fotos Públicas
Legislação tem contribuído para a redução da taxa de homicídios nos lares do país.
Fecha de publicación: 19/08/2021

Desde que foi promulgada, há 15 anos, a Lei Maria da Penha trouxe mudanças significativas na legislação brasileira e nas garantias dos direitos das mulheres. Nesse período, além da própria norma, foram feitas modificações e aprimoramentos legislativos, como a Lei de feminicídio, importunação sexual e ainda tramitam no Congresso projetos ligados ao tema como a imprescritibilidade do estupro, a Lei Mariana Ferrer, dentre outros avanços.


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Uma das principais conquistas da Lei Maria da Penha, segundo pesquisa do IPEA de 2015, foi a redução em 10% da projeção de aumento da taxa de homicídios domésticos. Além disso, os grandes centros instalaram delegacias da Mulher e as campanhas de conscientização e denúncia resultaram no disque 180 - um canal criado para mulheres que estão passando por situações de violência que funciona em todo o país 24 horas por dia -, e os números de denúncias cresceram desde a criação da Lei. Mesmo com avanços e conquistas, a realidade da violência ainda assusta, não apenas no Brasil, como também no mundo. Dados da ONU revelam que diariamente 137 mulheres são mortas por um familiar, em média no mundo.

Em que pese os avanços e conquistas inegáveis advindos da Lei, os dados correntes ainda consternam, porque, segundo o Datafolha, uma em cada quatro mulheres acima de 16 anos afirma ter sofrido algum tipo de violência no Brasil em 2020, o que significa que 17 milhões de mulheres sofreram violência física, psicológica ou sexual.

Também no ano passado, segundo o Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados 213 mil boletins de ocorrência por lesão corporal no contexto de violência doméstica. O número representa um aumento de 9% em relação aos 186 mil casos de 2016, ano em que a instituição passou a incluir o tema em seus levantamentos anuais.

Segundo o Anuário, 1.350 mulheres foram assassinadas por causa do seu gênero, um aumento de 2% em relação a 2019. Em 55% dos casos, o crime foi cometido com uma "arma branca", como facas e utensílios domésticos; 26% foram com arma de fogo; 9%, por agressão. Outras 4.338 foram vítimas de tentativa de feminicídio. Das 13 mulheres mortas por dia no Brasil, oito são negras.


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No âmbito processual houve avanços, afinal, em 2020 tramitou 1,2 milhão de processos de violência doméstica, segundo o Conselho Nacional de Justiça, e quase 400 mil medidas protetivas (eram 250 mil em 2016, quando os dados começaram a ser registrados). No entanto, ainda há muito que precisa ser melhorado, em especial, as políticas públicas. As delegacias da mulher, os centros de referência, abrigos e o próprio sistema de justiça carecem de ampliação e aperfeiçoamento.

Se as grandes cidades e as capitais possuem delegacias da mulher, o fato é que em municípios menores a realidade nos mostra a falta de estrutura dos serviços. Segundo o IBGE, apenas 7% das cidades brasileiras contam com uma Delegacia da Mulher. Além disso, faltam casas abrigo, responsáveis pelo acolhimento de vítimas em situação extrema, centros de referência, além da demora para a realização das audiências, com desrespeito a medidas protetivas que deveriam ser aplicadas em 48 horas, dentre outros casos.

O machismo resiste e mulheres vítimas de violência são revitimizadas tanto em delegacias quanto nas audiências. O acolhimento ainda é aquém do ideal, por isso, as denúncias não estão próximas dos números reais de casos (estima-se que somente 10% dos casos são notificados).

Em 15 anos de conquistas, modificações e aperfeiçoamentos, políticas públicas carecem de notória melhoria e a inserção do tema violência de gênero precisa ser inserido na grade curricular do ensino fundamental até a universidade. Educar nossas crianças e mostrar que agredir, bater ou estuprar uma mulher é errado, moralmente reprovável e resultará em crime passível de julgamento e condenação.

Este é o caminho para formar as próximas gerações com a consciência de que vidas humanas importam, independente da cor, sexo ou gênero. O caminho é longo, áspero e trabalhoso, contudo, a parceria indissociável entre educação, seja familiar ou escolar, políticas públicas e acolhimento é o trajeto sólido a ser percorrido na defesa da mulher e na responsabilização dos agressores.

*Antonio Baptista Gonçalves é advogado criminalista no escritório Antonio Gonçalves Advogados Associados.


Mais sobre o assunto: STJ: 15 interpretações que reforçam a proteção da mulher através da Lei Maria da Penha

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