CPI da Covid: Possíveis desdobramentos a partir do avanço das investigações

Randolfe Rodrigues, vice-presidente, Omar Aziz, presidente, e Renan Calheiros, relator da CPI/Agência Senado
Randolfe Rodrigues, vice-presidente, Omar Aziz, presidente, e Renan Calheiros, relator da CPI/Agência Senado
Próximos depoimentos podem trazer, em definitivo, o presidente Jair Bolsonaro para o centro das investigações.
Fecha de publicación: 28/06/2021

Instalada em abril de 2021, a CPI da Covid teve como escopo inicial a apuração das ações e omissões do Governo Federal no enfrentamento da pandemia no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados.

Com o avanço das investigações com a quebra de sigilos, depoimentos e recebimento de uma infinidade de documentos, os membros da CPI puderam ampliar, dentro das prerrogativas constitucionais e dos limites legais, o leque de caminhos a serem seguidos.


Leia também: As questões jurídicas (e políticas) da anulação das condenações contra Lula


O que começou visando responsabilizar a má gestão na compra de oxigênio no Amazonas terminou, na última semana, alcançando o Palácio da Alvorada e a Câmara dos Deputados ao envolver denúncias sobre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP/PR).

As denúncias de prevaricação e de corrupção, respectivamente, feitas pelo deputado federal Luís Miranda (DEM/DF) e seu irmão Luís Ricardo, que é servidor público, elevam o patamar das investigações da CPI.

O foco, até então girava em torno da responsabilização dos gestores públicos quanto às suas ações no combate à pandemia do coronavírus. Gabinete paralelo, fake news, tratamento precoce, atraso na compra de vacinas, negacionismo e muitos outros atos praticados que levaram ao descontrole da doença e o consequente agravamento da crise sanitária com elevado número de mortos. Agora, além de todos esses fatos ligados ao evento morte, a CPI tem em mãos indícios de crimes como corrupção ativa, formação de quadrilha e prevaricação.

A cúpula da CPI já dispunha de elementos suficientes para indiciar agentes públicos na gestão da pandemia. Tanto que já divulgou lista com pelo menos 14 pessoas que serão investigadas. Agora, depois do depoimento dos irmãos Miranda, passa a trabalhar com a hipótese de cometimento de outros crimes.

Nas próximas semanas, podemos vislumbrar os seguintes desdobramentos:

  • Da cloroquina à corrupção – como dito, a CPI da Covid encontrou novos elementos para avançar nas investigações em curso. Depois de investigar a omissão do governo federal no combate à Covid e a indicação de medicamentos sem eficácia comprovada, o colegiado encontrou indícios de corrupção na aquisição da Covaxin. A inevitável ação no Supremo Tribunal Federal sobre a possível prevaricação do presidente Jair Bolsonaro virou a chave e pode representar um ponto sem retorno para o atual governo. Necessário, portanto, observar o tom a ser adotado, a partir de agora, pelo próprio presidente e seus mais diretos e íntimos assessores, em resposta a essa nova frente de investigação da CPI.
  • Comportamento do Centrão - o posicionamento do Centrão será fundamental para o destino imediato do governo. Há sinais do desembarque de aliados do governo, como o PSD de Gilberto Kassab. Mais ainda, o que fará o PP após as denúncias contra o líder do governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros? A situação é delicada e a fragilidade da base aliada pode vir definitivamente à tona. Em seu depoimento, Luís Miranda afirmou que muitos parlamentares da base se encontram descontentes com os rumos do governo Bolsonaro.
  • Comportamento de Bolsonaro - com o agravamento da crise, o titular do Planalto tende a acentuar as polêmicas em eventos públicos. Assim, deverão ser cada vez mais corriqueiros os ataques a jornalistas e à imprensa em geral, e também a adversários políticos. E não é de todo estranho esse tom mais agressivo, que deverá ser a tônica do presidente nos próximos dias, muito em função da necessidade de se manter viva a chama entre os seus apoiadores mais fanáticos.
  • DEM e Bolsonaro - o partido do deputado Luís Miranda tem, hoje, dois ministros no governo, Onyx Lorenzoni e a titular da Agricultura, Tereza Cristina, e está dividido. A eventual ruptura da legenda com o Planalto impactará no futuro imediato do governo.
  • Partidos contra voto impresso - uma das bandeiras de Bolsonaro é o voto impresso, hoje em discussão na Câmara dos Deputados. A recente posição de onze partidos contra a medida, entre eles apoiadores do governo, representa uma derrota e, mais, uma clara demonstração de perda de musculatura política do Planalto. O recado foi dado. A digital do presidente em possível esquema de corrupção rapidamente ligou o sinal de alerta nos partidos da base do governo.
  • Superpedido de impeachment - o pedido de impeachment, a ser apresentado no próximo dia 30 de junho, deverá impactar ainda mais o ambiente político e econômico. As diversas forças políticas contrárias ao governo buscam fazer pressão sobre o presidente da Câmara Arthur Lira (PP/AL) para abertura do processo de impeachment. A possível adesão de partidos da base governista ao superpedido pode ser o tempero que faltava nessa equação.
  • Manifestações de 3 de julho - as ruas falam e a antecipação das manifestações contra o governo, para o dia 3 de julho, indicam que a oposição está disposta a atacar de frente o governo. Quem viveu o movimento dos “caras pintadas” ou as manifestações de junho de 2013 entende o poder da população sobre o parlamento. Se a tendência de crescimento dessas manifestações se confirmar, o caminho natural será a diminuição da sustentação política do governo ao ponto de não se conseguir mais barrar a abertura de um processo de afastamento do presidente Bolsonaro.
  • Agenda legislativa - as reformas em debate, como a administrativa e a tributária, além das mudanças no quadro eleitoral, ante a convulsão política e econômica que se abateu sobre o Congresso depois do depoimento dos irmãos Miranda à CPI, nitidamente perdem força. Não há ambiente para o avanço de matérias politicamente delicadas, ainda mais em ano pré-eleitoral.
  • Pesquisas - as pesquisas de opinião pública mostram um bolsonarismo em franco processo de enfraquecimento. Em recente pesquisa, o Instituto Ipec apontou que Bolsonaro perdeu cerca de 1/3 dos eleitores que votaram nele no segundo turno de 2018, por exemplo. Os últimos eventos alimentam esse quadro e, a médio prazo, os planos de uma reeleição poderá ficar cada vez mais distante.
  • Hamilton Mourão – o vice-presidente Hamilton Mourão concedeu entrevistas reclamando que a meses não participa das reuniões ministeriais no Planalto e que, portanto, encontra-se alheio às decisões palacianas sobre os rumos do País. Na oportunidade, subiu o tom e criticou o governo no combate à pandemia. Clara demonstração de que está se posicionando e que está aberto ao diálogo numa futura transição de poder.

O consistente avanço das investigações da CPI da Covid tende a mover as peças do jogo da política mais rápido do que se esperava. Os depoimentos do empresário Carlos Wizard, previsto para o próximo dia 30, e de Francisco Emerson Maximiano, Sócio-Administrador da Precisa Medicamentos, no dia 1º de julho, podem trazer, em definitivo, o presidente Jair Bolsonaro para dentro da CPI.

*André Pereira César é cientista político e Alvaro Maimoni consultor jurídico.


Veja também: O que pensam Arthur Lira e Rodrigo Pacheco?

Add new comment

HTML Restringido

  • Allowed HTML tags: <a href hreflang> <em> <strong> <cite> <blockquote cite> <code> <ul type> <ol start type> <li> <dl> <dt> <dd> <h2 id> <h3 id> <h4 id> <h5 id> <h6 id>
  • Lines and paragraphs break automatically.
  • Web page addresses and email addresses turn into links automatically.