
Desde dezembro, o país vem observando um grande aumento no número de casos e de internações em consequência da Covid-19 e da gripe influenza. O que acendeu um sinal de alerta para o retorno das atividades que estavam previstas, entre elas, o das aulas presenciais.
Com isso, as direções de algumas escolas no Rio de Janeiro estabeleceram, entre suas orientações gerais para o início do ano letivo, a obrigatoriedade do comprovante de vacinação contra a Covid-19 para professores, funcionários e alunos. Porém, essa exigência gerou um debate entre os pais e as escolas sobre a legalidade da decisão.
A vacinação é obrigatória no Brasil nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias há mais de trinta anos e está prevista no Estatuto da Criança e Adolescente. Contudo, para que essa obrigatoriedade tenha efeito, é necessária a inclusão da vacina no Plano Nacional de Imunização - PNI.
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O Estado do Rio de Janeiro conta com uma legislação própria e determina a obrigatoriedade da apresentação da caderneta de vacina no ato da matrícula na pré-escola e no 1º grau, tanto na rede de ensino pública como na particular. O Município do Rio de Janeiro também conta com legislação própria, mas apenas sobre a educação infantil. Já as instituições de ensino particular, possuem autonomia para cobrar o cartão de vacinação e assim o fazem de acordo com as recomendações das autoridades sanitárias, sendo que em alguns Estados e Municípios isso é uma imposição legal.
No entanto, o município do Rio de Janeiro já se pronunciou que não exigirá a comprovação da vacina contra a Covid-19 nas escolas e, muito provavelmente, as escolas particulares seguirão o mesmo caminho. Por isso, grupos de pais já vem se organizando em abaixos-assinados para que as instituições particulares que decidiram pela exigência voltem atrás e liberem as aulas para os jovens que não queiram receber as doses do imunizante, ou que tenham sido impedidos por seus responsáveis.
Os pais alegam que a vacinação de crianças deve ser uma decisão exclusiva dos responsáveis pelas crianças, não cabendo ao diretor da escola ou à sua diretoria o direito ou a competência médica para obrigar à vacinação, sob pena de privar os menores de acesso presencial à escola.
Mas se tratando de crianças, a obrigatoriedade da vacinação decorre da recomendação das autoridades sanitárias e da imposição legal. Portanto, como a vacinação contra o COVID-19 ainda não foi incluída no Plano Nacional de Imunização, não há como impor a sua obrigatoriedade e consequentemente, a sua comprovação, bem como o impedimento da prática de atos da vida civil por conta de tal exigência.
Já no caso das instituições de ensino privadas, por questões contratuais pode se estabelecer a obrigatoriedade da comprovação da vacina, mas não como um impedimento para o acesso à sala de aula.
Se a escola entender que é obrigatória por contrato a comprovação da vacinação para acesso às suas dependências, em caso de negativa dos pais, pode alegar violação à norma contratual – claro, desde que tenha sido estabelecida no contrato de serviços de ensino a apresentação da carteira de vacinação – e considerar que há descumprimento ao art. 14 do ECA, pois ainda que a vacina do Covid-19 não esteja no Plano Nacional de Imunização, está incluída no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 instituído pelo Ministério da Saúde.
A escola pode ainda alegar a violação ao art. 227 da Constituição Federal pelos pais, pois ao se negarem a vacinar seu filho, deixam de assegurar o direito à saúde em detrimento de sua própria convicção ideológica sobre a questão da vacinação.
Por outro lado, caso os pais se sintam lesados e as crianças sejam impedidas de frequentar as aulas, os responsáveis podem ajuizar medida judicial para garantir o acesso, sob o argumento de que a vacinação não é obrigatória por não estar incluída no Plano Nacional de Imunização – instrumento legal que contempla todas as vacinas obrigatórias – e que não há legislação específica acerca de tal imposição.
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Essa questão já foi enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal - STF e a partir de uma leitura conjunta e sistemática das teses, os pais são sim obrigados a vacinar seus filhos menores de idade contra a Covid-19, se o imunizante já estiver devidamente registrado pela Anvisa, incluso no Plano Nacional de Imunização e tenha sua obrigatoriedade assegurada em lei ou sua aplicação determinada pela autoridade competente.
A recomendação à população é que continuem se vacinando. São incontestáveis os dados técnicos de que a vacina salva vidas. Mas a vacinação de crianças ainda é um assunto em aberto e que vai dar o que falar.
*Francine Barreto é advogada do escritório VC Advogados.
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