A (in)visibilidade lésbica no Brasil

Se hoje é possível pleitear mais visibilidade foi porque uma história de luta e resistência vem sendo construída/Unsplash
Se hoje é possível pleitear mais visibilidade foi porque uma história de luta e resistência vem sendo construída/Unsplash
É necessário ampliar o olhar e entender que não se trata apenas de uma opressão à sexualidade, mas também ao gênero.
Fecha de publicación: 27/08/2020

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O dia 29 de agosto é o dia nacional da visibilidade lésbica e, como acontece todos os anos, desde a criação da data, em 1996, a pergunta que novamente ecoa: por que um dia para as lésbicas, se já existe o dia do orgulho LGBT? E, assim, mais uma vez precisamos explicar e dizer o que nossa sociedade patriarcal finge não enxergar. Porque somos mulheres!

Sim, o simples fato de sermos mulheres em uma sociedade como a nossa faz com que tenhamos que lidar diariamente com o machismo, a misoginia e a violência física, psicológica e simbólica que advêm desses comportamentos estruturados, em todas as nossas relações.

A nossa história foi e é muito eficiente em apagar grandes nomes de mulheres incríveis como, por exemplo, a biofísica inglesa Rosalind Franklin, que desvendou o DNA ou a ativista francesa Olympe de Gouges que defendeu a emancipação das mulheres durante a Revolução Francesa. No Brasil, pouco se estuda sobre Dandara dos Palmares, guerreira do quilombo de palmares, sobre Myrthes Campos, primeira mulher advogada do país ou sobre Alzira Soriano, política e primeira mulher a ser eleita prefeita de um município da América Latina.

Quando adentramos no meio LGBT, esse esforço para invisibilizar mulheres não é diferente. Muito provavelmente você já ouviu falar na rebelião de Stonewall e de como essa revolta foi o marco inicial do dia do Orgulho LGBT. Contudo, pouco se fala em Stormé DeLarverie, a lésbica responsável por iniciar essa rebelião, em que ao confrontar com a polícia, incitou toda a multidão a agir.  

A própria palavra “lésbica” ainda encontra muita resistência dentro e fora da comunidade LGBT. Muita gente ainda afirma que a palavra é estranha e insiste em categorizar que “gay” engloba tudo. Essa estranheza é bastante simbólica porque demonstra que em uma sociedade dominada por homens sempre haverá a tentativa de diminuir e invisibilizar a mulher.

Há também quem afirme que lésbicas são mais aceitas que gays. Não há nada mais equivocado que isso. O que ocorre, em verdade, é o banimento das lésbicas que se afastam do padrão de feminilidade e a fetichização das que se aproximam desse padrão. A existência e a sexualidade da lésbica são prontamente invalidadas e mais uma vez submetidas à violência simbólica da dominação masculina. Isso, definitivamente, não é aceitação!

A escolha de uma data para pleitear uma maior visibilidade lésbica, repousa, primeiramente, na premissa de que, dentre tanta violência sofrida, não é exagero concluir que a palavra “homofobia” não dará conta de todas essas agressões. Por isso, é necessário ampliar o olhar e entender que não se trata apenas de uma opressão à sexualidade, mas também ao gênero. Logo, na tentativa de preencher essa lacuna, a palavra “lesbofobia” parece se encaixar melhor.

Em segundo lugar, é notável que, tanto na história como nas relações sociais, as lésbicas possuem um caminho marcado por processos de invisibilização. É por isso que são tão necessárias campanhas afirmativas de identidade, representatividade e existência. E, a partir dessa análise, é possível responder a pergunta inicial. Para que uma nova data?

Para que a lésbica que ainda não se expôs por medo de perder o emprego, ser expulsa de casa, sofrer um estupro corretivo ou mesmo ser morta, saiba que ela não está só e que ela não precisa mais ser silenciada. Para que a história não mais nos apague. Para que essa sociedade machista entenda que somos lésbicas e não gays. Para que haja mais representatividade nos cinemas e na televisão. Para recordar nossas antepassadas que foram internadas compulsoriamente em manicômios e conventos pelo simples fato de serem lésbicas. Se hoje podemos pleitear mais visibilidade, foi porque uma história de luta e resistência vem sendo construída e não parará. Precisamos gritar: Nós existimos!  

*Nara Leandro Cavalcanti é advogada do Serur Advogados, integrante do comitê +Diversidade da banca que tem por objetivo discutir a inclusão e o combate ao preconceito na advocacia e no mundo jurídico.

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