O debate sobre como alcançar a real equidade de gênero nos ambientes de trabalho tem se concentrado em medidas para quebrar o teto de vidro, aquele espaço pré-definido, formal e informalmente, que atinge as mulheres devido à existência de barreiras sociais e culturais que interrompem seu desenvolvimento profissional e o dificultam a chegada em cargos altos. Isso gerou alguns resultados positivos se olharmos para a criação de espaços onde as mulheres conseguiram transpor essas barreiras com sucesso. No entanto, vale perguntar: O que acontece na próxima etapa? O que acontece quando uma mulher passa a ocupar um cargo de direção e liderança?
Em profissões como a do Direito, vemos que, ainda hoje, os cargos de liderança e alta direção ainda são majoritariamente ocupados por homens. O perfil do "advogado" de sucesso costuma estar atrelado a certas características que, há muitos anos, definiram o gênero masculino: seriedade, determinação, agressividade, independência familiar, segurança, entre outras qualidades que, aos poucos, vão ficando ultrapassadas às doutrinas modernas das novas masculinidades.
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Nesse sentido, quando a mulher chega a um cargo de alta direção, encontra-se na situação de ter que se adaptar ao perfil ou continuar enfrentando preconceitos quanto ao seu desempenho profissional. Ter que escolher entre essas opções revela um espaço que não é desenhado com enfoque de gênero e que não incentiva ou possibilita o desenvolvimento do trabalho em cargos diretivos para as mulheres da mesma forma que acontece com os homens.
Por isso, é fundamental que nós, que atuamos nessa profissão, conheçamos as barreiras que as mulheres enfrentam, não apenas ao longo de sua carreira, mas também quando conseguem ocupar cargos de direção e liderança. É importante que as firmas, as empresas e, em geral, todos os locais de trabalho implementem e reforcem as suas políticas de diversidade para gerar um espaço de trabalho equitativo, onde esta abordagem seja transversal e atinja também os cargos de alta direção.
Compromisso, ações e políticas
Na minha experiência, pude identificar algumas ações específicas que contribuíram enormemente para o meu crescimento profissional na Payet, Rey, Cauvi, Pérez Abogados – PRCP, escritório onde comecei a trabalhar nos meus primeiros anos como advogada e onde tenho desenvolvido grande parte da minha carreira, até ser promovida a sócia há alguns meses.
Em primeiro lugar, considero fundamental o comprometimento das pessoas que ocupam cargos de alta direção. Isso é evidência de uma verdadeira mudança cultural e de um entendimento de que esse esforço para alcançar a equidade de gênero não é exclusivo das mulheres, mas da sociedade em geral.
Se as pessoas que lideram as organizações e são responsáveis por desenvolver, aprovar e implementar ações e políticas em seus locais de trabalho não estiverem comprometidas com esse objetivo, será difícil alcançar mudanças reais e uma implementação bem-sucedida de estratégias voltadas para a equidade de gênero.
Nesse sentido, as pessoas que ocupam cargos diretivos devem estar cientes de que é necessário falar sobre essas questões - dentro e fora das organizações - e tomar posições claras quando surgem situações em que não há evidências de igualdade de tratamento entre homens e mulheres. Ao longo da minha carreira enfrentei preconceitos e estereótipos de advogadas (não só mulheres, mas também jovens) e tem sido importante ter o apoio de pessoas que ocupavam cargos de liderança para superar esses tipos de obstáculos.
Em segundo lugar, a consolidação de mais mulheres em cargos de direção permite que as advogadas mais jovens deixem de ter apenas homens como referência de liderança e possam ter a possibilidade de ter mulheres com quem se identifiquem como modelos.
Na minha experiência, pude constatar como as mulheres que chegam a cargos de direção e liderança na PRCP também têm funções relacionadas à administração e gestão do negócio, o que mostra que a cultura e as políticas que temos para alcançar a igualdade de gênero no estudo é transversal e atinge também cargos de direção.
Em terceiro lugar, é fundamental dispor de políticas de maternidade que permitam às advogadas um equilíbrio entre a vida familiar e laboral, para poderem exercer a maternidade ativa e estarem presentes em casa e, ao mesmo tempo, desempenharem com sucesso cargos exigentes como como alta direção e liderança.
Nessa linha, também é necessário implementar políticas de paternidade corretamente orientadas, que criem espaços para que os pais se envolvam mais nas tarefas domésticas e possam ter um papel mais ativo no cuidado dos filhos. Assim, tanto as mães como os pais, de forma equitativa, poderão contar com tempo para seu desenvolvimento profissional e exercer ativamente seus papéis de maternidade e paternidade.
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No meu caso, a existência de políticas de maternidade e paternidade implementadas pelo PRCP me ajudou a continuar a desenvolver a minha carreira até me tornar sócia e ao mesmo tempo mãe (pela primeira vez). Hoje posso ser uma mãe presente e também ter tempo para exercer minha nova posição como sócia do escritório.
Da minha experiência, posso concluir que é necessário que os locais de trabalho implementem ações e políticas de diversidade que sejam transversais em toda a instituição para que a cada dia tenhamos mais mulheres que não apenas quebrem o teto de vidro, mas também possam se manter em posição de liderança.
As jovens devem ver que é possível ter uma carreira profissional de sucesso e, ao mesmo tempo, dedicar-se, se assim o desejarem, à vida familiar, mesmo em cargos exigentes como o de direção.
Finalmente, as jovens advogadas devem saber que isso é possível sendo elas mesmas e não tentando seguir um modelo masculino com o qual não se identificam.
*Julia Loret de Mola é especialista em direito da concorrência, direito administrativo e direito comercial e sócia da Payet Rey Cauvi Pérez.
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