O Congresso que temos não é o que queremos

Na avaliação dos especialistas, poucos parlamentares estão presentes no Congresso raramente se manifestam em plenário/Câmara dos Deputados
Na avaliação dos especialistas, poucos parlamentares estão presentes no Congresso raramente se manifestam em plenário/Câmara dos Deputados
Em muitos casos, o parlamentar tem como objetivo prioritário o de ser reeleito. Esse funcionamento real do Congresso é rejeitado pela sociedade organizada, mas medidas adotadas têm se mostrado ineficazes.
Fecha de publicación: 19/03/2021

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O Congresso, pelo conjunto dos seus deputados federais e senadores, representa a quase totalidade dos eleitores brasileiros, mas não como gostaríamos ou queremos.

Cada parlamentar representa apenas os seus eleitores, para o atendimento aos interesses comunitários ou corporativos. Não representa visões ou pensamentos nacionais, ideários, programas ou propostas de alcance nacional. A soma dos diversos segmentos não leva às visões mais abrangentes. Os partidos políticos que deveriam exercer o papel de orientação e consolidação nacional não exercem esse papel.

O parlamentar, uma vez eleito, chegando a Brasília, tem como objetivo prioritário, em alguns casos, único, o de ser reeleito, para o que precisa atender aos seus eleitores. É focado nos seus eleitores e não em todos os eleitores do seu estado e muito menos aos eleitores de outros estados. Porque ele é eleito por estado federativo e não por todo o Brasil, como ocorre com a eleição do presidente da República.

A parca representação é agravada pelo sistema proporcional que permite que um deputado federal seja eleito apenas por um reduto eleitoral, sem necessidade de buscar todos os eleitores do Estado.

O principal instrumento de que o parlamentar dispõe no Congresso não é proposição, aprovação ou rejeição de projeto de legislação – como deveria ser – mas a emenda orçamentária.

A emenda orçamentária foi criada com a reserva de pequena parte do orçamento público, para que os deputados pudessem destinar verbas – de sua inteira iniciativa e desejo – para atender às necessidades mais imediatas dos seus eleitores. Eram verbas de pequeno valor relativo que daria para construir um posto de saúde local, mas não uma unidade de atendimento especializado ou mesmo um hospital.

Poderiam ser destinados a uma ponte sobre um córrego, substituindo eventuais pinguelas, mas não pontes sobre rios de grande largura. Dava para abrir algumas ruas, ou pavimentar um trecho. Para gastos um pouco maiores, havia a emenda de bancada.


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Ao longo do tempo, os parlamentares ampliaram o conceito e o volume das emendas orçamentárias, aumentando os limites e tornando as emendas individuais de execução obrigatória.

Não basta ao parlamentar incluir as suas emendas na proposta orçamentária anual. Ele precisa ainda da liberação da parte não obrigatória, o empenho orçamentário, a liquidação e o pagamento para que o dinheiro chegue efetivamente ao seu reduto eleitoral.

Para isso ele negocia, pessoalmente ou através das lideranças, com o Executivo, tais medidas, em troca do seu voto, nos projetos de interesse do Executivo ou daquelas lideranças.

Dá origem ao “troca-troca” ou o “dá cá, toma lá”.

A maioria dos deputados federais e alguns senadores são eleitos com os votos de poucos redutos eleitorais, como representantes de interesses comunitários. São representantes dos eleitores, mas como “despachantes” para conseguir juntos aos órgãos federais a execução das suas emendas ou a destinação de serviços públicos para os seus redutos. Passam mais tempo nos ministérios, autarquias e empresas em audiências com autoridades para conseguir os seus intentos. Levam consigo prefeitos, vereadores e outros do seu reduto, para serem recebidos com o uso do seu cargo.

São poucos presentes no Congresso, raramente se manifestando em plenário, mas atendem ao chamado das lideranças para dar o seu voto, muitas vezes sem ter a menor ideia em que e porque estão. Basta apertar o sim ou não no botão eletrônico.

É esse funcionamento real do Congresso Nacional que a sociedade organizada rejeita, reclama e quer mudar, mas medidas adotadas têm se mostrado ineficazes.

A ineficácia decorre do foco: está voltada para os congressistas eleitos, que pouco alteram as suas posições por convencimento racional. Só mudam quando percebem que suas posições desagradam o seu eleitor, que pode abandoná-lo.

Por outro lado, abaixo assinados, petições com milhares de adesões, de São Paulo e, eventualmente, de outros Estados do Sudeste e do Sul, não sensibilizam os demais eleitores nacionais. Como os parlamentares são eleitos por estado e têm foco nos seus eleitores, dão pouca ou nenhuma atenção aos demais eleitores.

A grande diferença está nos “seus”. O político não está voltado para o eleitorado, como um todo, isto é, com toda a população brasileira, com toda sociedade brasileira, mas apenas aos que votaram ou podem votar nele.

A origem do processo está na visão de mundo curta ou restrita dos eleitores que não enxergam nada além do que experimentam dentro do ambiente em que vivem ou sobrevivem.

A sua expectativa é a melhoria de condições em que vivem, entendendo que o Estado deve prover – gratuitamente ou a preços módicos para ele – serviços públicos básicos, como um posto de saúde ou escola de educação básica perto da sua moradia, os serviços de utilidade pública, como água, luz, telefone, pavimentação na rua em que moram, transporte coletivo, que atenda à comunidade, assim como pontes e outras infraestruturas. Em outros termos: “até onde a vista alcança”.

O candidato populista promete ao eleitor trazer verbas e serviços federais para a melhoria da vida do eleitor na sua comunidade e com isso ganha o seu voto.

Embora a maioria desses serviços públicos seja de competência municipal, o prefeito alega que o município não conta com recursos suficientes e depende de verbas federais para instalar os serviços ou executar as obras.


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Ele pode buscar a execução dos serviços por órgão ou a transferência de verba federal. O mecanismo mais simples para a obtenção de verbas federais é pela emenda orçamentária do deputado ou candidato a deputado federal da região.

Sem destinar emenda para a região, não consegue votos e não consegue ser eleito ou reeleito.

Essa relação entre prefeito municipal e deputado federal leva o político a um rodízio entre prefeitura e Câmara Federal.

Outro segmento de despachantes é o dos corporativos, representando interesses de grupos profissionais, empresariais ou setoriais. Prevalece a mesma origem da visão de mundo curta, onde só interessam os benefícios ou supostos direitos da corporação.

*Jorge Hori é consultor e integrante da Coordenação Nacional do PNBE – Pensamento Nacional das Bases Empresariais.

 


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