O que mudou em 40 anos de Política Nacional do Meio Ambiente?

Norma completa 4 décadas agora em agosto/Pexels
Norma completa 4 décadas agora em agosto/Pexels
Especialista avalia como anda a interpretação dos tribunais e juízes sobre o tema.
Fecha de publicación: 16/08/2021

A Política Nacional do Meio Ambiente faz 40 anos agora em agosto. Ela define os princípios e objetivos sobre as questões ambientais no país, estabelece os mecanismos de aplicação e penalidades e quem deve implementar.

Como órgão que representa um marco de institucionalidade da política e do Sinama (Sistema Nacional de Meio Ambiente), o Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), ao longo dessas quatro décadas, destaca-se como uma instituição democrática, integrada por setores e esferas de governo, empresariado e sociedade civil, além de manter-se permanentemente ativa.

O Conselho, que possui competência normativa, é responsável pelo estabelecimento de padrões, normas e critérios ambientais que devem necessariamente ser observados pela União, estados, Distrito Federal e municípios.

Além disso, o § 1º, do artigo 14 dispõe que; "sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por suas atividades. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal por danos causados ao meio ambiente", instituindo assim, a responsabilidade objetiva no direito ambiental.


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Nesses 40 anos, ocorreram no País mudanças expressivas, entre as quais:

- a Constituição Federal de 1988 que ampliou a visão sobre a política ambiental e a responsabilidade em matéria ambiental;
- o Ministério Público tornou-se um ator relevante, cobrando dos governos e dos empresários para que exerçam suas responsabilidades;
- os governos locais e estaduais passaram a encarar suas responsabilidades na ação sustentável;
- as ONGs se multiplicaram, desde aquelas com ações locais e pontuais até as que se tornaram representantes desse segmento nos conselhos municipais, estaduais e no Conselho Nacional do Meio Ambiente.
- os conflitos e disputas em torno da apropriação dos recursos naturais se exacerbaram devido aos padrões insustentáveis de consumo.
- o meio ambiente passou a mobilizar, cada vez mais, interesses conflitantes no Governo, nas empresas e no terceiro setor, interesses que precisam ser levados em conta na tomada de decisões da política ambiental.

Observa-se assim, a consolidação da responsabilidade objetiva por dano ambiental na esfera civil no direito brasileiro. Nossos tribunais têm aceitado a tese da responsabilidade objetiva e solidária dos agentes da lesão, pelos danos causados ao meio ambiente e à natureza, e a irrestrita legitimidade da Administração Pública para a imposição de multas e penalidades, inclusive com a interdição de estabelecimento ou atividade. Ainda, se as lesões acontecem em domínio ou local público, a jurisprudência tende a ser mais exigente e dura para com o agente causador da lesão. Por exemplo, nos casos de poluição do mar ou de vazamentos de petróleo, a tese da responsabilidade objetiva e solidária do poluidor tem tido sucesso, inclusive com direito de cobrar dele as despesas pelo trabalho e limpeza.

Nos Tribunais Regionais Federais, há um maior aprofundamento nas questões, desvendando mais amplamente a extensão da controvérsia ambiental, inúmeros aspectos que os Tribunais superiores deixam de considerar ou não chegam a examinar pela exclusão ou preclusão processual.

Especificamente sobre o Tribunal Paulista, a responsabilidade ambiental é considerada pelos magistrados como hipótese de responsabilidade objetiva, independente da culpa do agente e particularmente pela omissão deste e que o exercício do poder de polícia desempenhado pela autoridade administrativa é formalmente adequado ao controle da proteção e da tutela do meio ambiente e seus recursos.

Em 2020 foram identificadas em torno de 400 novas demandas ambientais no TJSP, dentre as principais: 259 processos sobre Fauna e Flora; 32 sobre Poluição; 19 processos versando sobre Área de Preservação Permanente; 10 sobre Unidade de Conservação da Natureza e 7 processos sobre saneamento; dentre outras.

Em geral, a justiça e seus representantes vêm adotado uma postura mais protecionista ao meio ambiente, sendo que, diante da dúvida, o princípio da precaução tem sito constantemente evocado. Nesse período, outros princípios foram criados como o do não retrocesso, o que acaba por não permitir qualquer flexibilização na proteção ao meio ambiente, ainda que eventualmente, a norma tenha sido revista e alterado restrições impostas aos proprietários.

Ainda, as atividades industriais são sempre consideradas vilãs do meio ambiente, muito embora as demandas contra pessoas jurídicas representem um número pouco expressivo se comparado com as demandas de desmatamento, imóveis tombados ou com valor histórico ou paisagístico, infraestrutura, dentre outras.

Diante desses dados, os últimos 40 anos representam o amadurecimento, consolidação e crescimento do direito ambiental no país.

Recentemente foi proferida decisão judicial em mandado de segurança, que sustentou a ilegalidade de decretos estaduais que alteraram o cálculo da taxa de licenciamento ambiental.


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O entendimento foi de que "O Decreto Estadual 62.973/2017 extrapolou a conceituação dada pela Lei 9.477/96, quanto à área da fonte de poluição, assim considerando o espaço físico total do empreendimento, contrariamente aos princípios da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade, vindo com isto a majorar sobremaneira a base de cálculo da taxa para licença administrativa". Do mesmo modo, questionou a validade do decreto 64.512, editado em 2019: "O Decreto que o substituiu (...) muito embora apresente nova fórmula de cálculo, traz os mesmos vícios, ao considerar áreas do empreendimento que não apresentam qualquer fonte de poluição".

Isso porque a majoração de tributo somente pode ser feita por meio de lei e não por ato administrativo, conforme o artigo 150, inciso I, da Constituição Federal. Com esse entendimento, a juíza da 2ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, concedeu liminar para reduzir a taxa de licença ambiental cobrada pela Cetesb, determinando que o cálculo da tenha como parâmetros a legislação em vigor, antes dos dois decretos impugnados.

No mesmo sentido, a Fiesp possui liminar que confere a todos os seus filiados a redução da taxa de licença ambiental junto a Cetesb.

*Renata Franco é advogada especialista em direito ambiental e regulatório.

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