A OCDE e a integridade em empresas públicas

Há uma condução para um alinhamento com as diretrizes gerais do setor privado/Fotos Públicas
Há uma condução para um alinhamento com as diretrizes gerais do setor privado/Fotos Públicas
Das três normas da Organização que abordam governança corporativa em estatais, o Brasil aderiu somente a uma.
Fecha de publicación: 01/06/2021

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) remonta ao ano de 1961. Sua fundação veio com a premissa de promover o desenvolvimento econômico, melhorar o padrão de vida populacional e promover a expansão do comércio mundial de forma total.

Sua atuação ocorre por meio de levantamentos, estudos e debates realizados por seus membros, que abarcam uma ampla gama de temas e posteriormente elaboram diretrizes que visam melhores práticas. Dentre estes temas, tem-se o da governança corporativa de empresas estatais.


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Vale apontar que o Brasil não é um membro pleno da OCDE. Contudo, é um parceiro atuante em seus grupos de debates, de forma que há uma faculdade sobre vincular-se ou não às suas diretrizes. Como exemplo, das três normas que abordam governança corporativa em estatais, o país aderiu a apenas uma.

Com o início do século XXI, um processo de reformas sobre a estrutura e seguridade quanto às empresas públicas federais foi promovido com o objetivo de fortalecer a integridade e a prevenção da corrupção no âmbito da administração pública federal.

A necessidade de um relatório de Avalição da OCDE sobre o Sistema de Integridade da Administração Pública Federal Brasileira advém da atuação em grande porte do Brasil na construção de estruturas públicas mais seguras e de boa governança.

O relatório evidencia que este processo de reformas foi sendo construído lentamente, desde as décadas de 1980 e 1990. A visão inicial para essas alterações, tinha como base controlar as despesas públicas e modernizar a administração e, consequentemente, entregar uma maior seguridade para a sociedade ao possuir uma estrutura menos passível de ser alvo de corrupção. Assim, percebe-se que a tentativa de modernização e controle de despesas é algo anterior às reformas constituídas no início deste século.

Segundo o Guia da Política e Governança Pública, elaborado pela Casa Civil (2018, p. 16), as diretrizes da OCDE são essenciais para uma estruturação de seguridade:

             Com a missão de estabelecer um conjunto de boas práticas de governança que subsidiariam e direcionariam a atuação estatal, uma equipe de técnicos da Casa Civil, do Ministério do Planejamento, do Ministério da Fazenda e do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União preparam dois atos normativos: o Decreto nº 9.203 de 2017, e o Projeto de Lei nº 9.163 de 2017. A ideia de concretizar uma política de governança surgiu da percepção de que era necessária uma condução integrada e coerente das diversas iniciativas setoriais isoladas de aprimoramento da governança. Para dar sustentação e unidade à política, foram utilizadas recomendações da literatura especializada e de organizações internacionais, notadamente da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que sintetizam as melhores práticas de governança. Tudo isso levando em consideração as principais fragilidades dos modelos de governança adotados no âmbito da administração pública federal.

No que toca à corrupção na esfera das empresas estatais, a OCDE já analisou casos e elencou os motivos que as tornam mais propícias à prática de corrupção. Dentre essas razões, se comparadas a empresas privadas, tem-se:

  • o fato destas estarem sujeitas à normas mais brandas em termos orçamentários;
  • a não submissão ao regime de falência;
  • a falta de padrões de transparência em relação a seus gastos e contabilidade geral;
  • a fata de um ou pequeno grupo controlador, proprietário;
  • o sistema de alternância na indicação de seus dirigentes pelo Executivo e pelo Legislativo, como forma de atuação política para a construção de grupos de apoio em cada governo.

Contudo, somente no ano de 2015, em 8 de julho, foram aprovadas as diretrizes da OCDE sobre Governança Corporativa de Empresas Estatais, em uma versão mais atualizada, passados 10 anos desde a primeira redação.  Hoje as Diretrizes encontram-se divididas em sete categorias:

· justificativa da propriedade estatal;

· o papel do Estado como proprietário;

· empresas estatais no mercado;

· tratamento equitativo dos acionistas e outros investidores;

· relações com partes interessadas e responsabilidade empresarial;

· divulgação e transparência; e

· responsabilidades dos Conselhos de Empresas Estatais.

Já em 2019 o Conselho, órgão responsável pela tomada de decisões, execução e elaboração de instruções legais, aprovou as Diretrizes sobre Anticorrupção e Integridade de Empresas Estatais, após uma proposta feita pelo Grupo de Trabalho sobre Propriedade Estatal e Práticas de Privatização e o Grupo de Trabalho sobre Corrupção em Transações Internacionais, criado pelo Conselho. Com isso, as diretrizes foram subdividas em quatro grandes quesitos, a fim de orientação, sendo:

· integridade do Estado;

· exercício da propriedade estatal de forma íntegra;

· promoção da integridade e prevenção da corrupção em nível empresarial; e

· prestação de contas das empresas estatais.

Um último apontamento que vale a pena ser realizado nessa breve exposição diz respeito às alterações trazidas pela Lei das Estatais. Sua alteração foi motivada pelo aumento da regulação sobre o viés jurídico das empresas públicas e das sociedades de economia mista. Alteraram-se regras que levaram a mudanças quanto à organização interna destas empresas.

Houve, a partir de então, um paralelo com as recomendações da OCDE sobre o papel dos conselhos das empresas estatais, recomendando que estes sejam estabelecidos de forma a assegurar autoridade, competência e objetividade no desempenho de suas funções tanto na estratégia como no monitoramento dos gestores. Sobre estes conselhos, cabe:

· a fixação de mandato e responsabilidades claramente definidos, inclusive quanto ao desempenho da estatal;

· deve ser composto por membros com relevante competência, experiência e incluir membros independentes, todos nomeados mediante processo transparente;

· a estruturação de mecanismos para garantir que os empregados tenham efetiva participação, sempre que esta for autorizada;

· seja evitada a concentração das figuras de CEO e presidente do CA na mesma pessoa;

· previsão de possibilidade de instituição de comitês para suporte das análises e decisões do CA; e

· previsão de avaliação anual do desempenho dos conselhos.


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Por meio da análise das diretrizes da OCDE para os conselhos das estatais, é perceptível que há uma condução para um alinhamento com as diretrizes gerais do setor privado, em busca de uma maior independência na atuação das estatais e uma menor interferência política em sua administração.

Assim, o foco não é criar um isolamento da política, mas alinhar os objetivos políticos e econômicos aos objetivos institucionais.

* Yuri Sahione é advogado, sócio da área de Compliance, Penal Econômico e Investigações do Cescon Barrieu

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