Os aspectos jurídicos que envolvem o direito de escolha das vacinas

Seria esse “direito de escolha” irregular ou ilegal? Pode o poder público impor penalidade nestes casos?/Pixabay
Seria esse “direito de escolha” irregular ou ilegal? Pode o poder público impor penalidade nestes casos?/Pixabay
Em caso de recusa, não existe penalidade: atitude não é um ato ilegal.
Fecha de publicación: 05/07/2021

O cronograma de vacinação adotado nos estados e municípios permite aos cidadãos brasileiros o direito a vacinas devidamente testadas sob os mais sérios e criteriosos preceitos da ciência. Todas são homologadas e aprovadas pela Anvisa para a imunização e proteção contra a Covid-19. 

Nos últimos dias, várias pessoas que compareceram em postos e locais de vacinação estariam condicionando a vacinação com base na origem e no fabricante do imunizante, mostrando predileção por alguns laboratórios. Outras estariam passando de local em local com o objetivo de identificar determinadas vacinas. O movimento passou a ser chamado de “sommeliers” de vacinas. 


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Este fenômeno recebeu duras críticas e passou a ser pauta de atos do poder público  para coibir a atitude de “escolha” dos cidadãos, impondo a assinatura de um termo de responsabilidade de recusa, bem como a imposição de uma penalidade - o encaminhamento ao final da fila para quem se recusar a tomar a vacina disponível. 

Seria esse “direito de escolha” exercido pelos cidadãos irregular ou mesmo ilegal, e ainda poderia o ente público impor penalidade nestes casos? Vejamos. 

O cronograma de vacinação confere um direito aos cidadãos, sem qualquer previsão da obrigatoriedade de aplicação deste ou daquele imunizante. Em caso de recusa, não existe penalidade. A atitude de escolha não se trata de um ato ilegal do cidadão, razão pela qual ele não pode ser penalizado. De acordo com a Constituição, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer qualquer coisa que seja senão em virtude de lei, o chamado princípio da legalidade. 

Neste sentido, toda e qualquer imposição de dever por parte do poder público objetivando coibir situações desta natureza, ou ainda impor penalidades e sanções, deve, obrigatoriamente, estar previsto em lei, sob pena de nulidade, bem como de caracterização de ato abusivo que beira o constrangimento ilegal, na medida em que promove cerceamento de direitos aos cidadãos de forma injurídica. 

Esse direito de escolha, sem legislação que verse especificamente sobre o tema, é um direito dos cidadãos, muito embora questionável sob o âmbito moral, até mesmo em razão das mais de 500 mil mortes de pessoas que sequer puderam se proteger de alguma forma, mas é algo que não pode ser classificado como uma atitude ilegal. 

O que não se pode admitir no Estado Democrático de Direito é o desrespeito das garantias constitucionais fundamentais do indivíduo, com imposições não amparadas pelo princípio da legalidade, principio basilar de todo e qualquer ato da administração pública. 

Havendo interesse do poder público em resolver conflitos ou evitar problemas desta natureza, os agentes devem agir com o amparo de lei específica, criada de forma jurídica com a descrição da conduta a ser adotada. Essa medida é importante para que seja conferido regular andamento no cronograma de vacinação e consequentemente a manutenção de uma ordem pública, preservando a imunização como forma de contenção do vírus e suas variantes.  

*Alexandre Ricco é advogado especialista em direito administrativo e empresarial, sócio do Menezes & Ricco Advogados.


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