Há muito se fala da importância da efetivação dos direitos sexuais e dos direitos reprodutivos para todas as pessoas, quaisquer que sejam suas orientações sexuais ou identidades de gênero – ou seja, para todos cuja existência é compreendida pela sigla LGBTQIAP+. Apesar dos avanços obtidos no final do século passado nas conferências internacionais de População e Desenvolvimento no Cairo, em 1994, e sobre a Mulher em Pequim, em 1995, ambas da Organização das Nações Unidas, ainda se faz necessário garantir aos cidadãos e cidadãs brasileiros a autonomia no exercício da sexualidade e da parentalidade livre de qualquer discriminação - em especial para grupos minorizados como é o caso da população LGBTQIAP+ e das mulheres.
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Para aqueles que não estão familiarizados, os direitos sexuais referem-se, em resumo, ao exercício da sexualidade livre de discriminação, coerção ou violência. Já os direitos reprodutivos referem-se ao direito de decidir livre e responsavelmente sobre o número, o espaçamento e a oportunidade de ter filhos, bem como o direito a ter acesso à informação e aos meios para a tomada desta decisão.
Embora há muito seja possível a separação entre o exercício da sexualidade e da reprodução – isto é, ter relações sexuais e não reproduzir e reproduzir sem ter relações sexuais -, permanece, com frequência, a falta de controle das mulheres sobre seus corpos sexuais e reprodutivos.
Entre as razões para isso, vale mencionar: a violência sexual (de acordo com dados de 2014, uma mulher é estuprada no Brasil a cada 11 minutos); a falta de educação sexual; a restrição ao acesso a métodos contraceptivos variados, inclusive para contracepção de emergência; ou, ainda, a ausência Brasil afora de serviços de aborto legal.
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Paralelamente, os modos de vida e de expressão da orientação sexual e identidade de gênero da população LGBTQIAP+, com frequência, não têm respeito e aceitação social. E, se isso vale para a sua existência em si, quanto mais para que possam exercer seu direito à reprodução. Neste sentido, é possível afirmar que, em pleno século XXI, o Brasil ainda não foi capaz de garantir às mulheres e à população LGBTQIAP+ uma vida digna, com respeito aos seus direitos humanos.
Ainda assim, houve avanços legislativos no Brasil no que tange aos direitos reprodutivos das pessoas LGBTQIAP+. O direito à adoção por casais homossexuais, bem como à reprodução assistida, além da possibilidade de registro de uma criança com dupla maternidade ou paternidade são vitórias a serem comemoradas.
Contudo, no campo dos direitos sexuais, os poucos avanços ocorreram por decisões do Poder Judiciário e não pela adoção de leis pelo Poder Legislativo. A falta de uma normativa que assegure completamente e de forma explícita, e não implícita ou indireta, a existência das pessoas LGBTQAIP+ e o exercício, por esse grupo, dos seus direitos sexuais, afeta a vida de milhares de pessoas, já que há uma relação direta entre direitos e políticas públicas.
É verdade que o reconhecimento e a desejada positivação dos direitos sexuais no Brasil não significam, necessariamente, sua eficácia plena e imediata, mas, sem dúvida, seria um avanço nesta direção por ser mais fácil exigir a efetivação de direitos previstos em lei do que daqueles decorrentes de entendimento jurisprudencial.
Neste Dia Internacional do Orgulho LGBTQAIP+, fica a esperança de que os direitos sexuais dessa população possam ser reconhecidos e efetivados. Só assim poderemos falar de uma existência digna em um Estado Democrático de Direito.
*Laura Davis Mattar é gerente de Diversidade, Inclusão e Cidadania Corporativa do escritório Mattos Filho.
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