PIS/Cofins: Mais um capítulo da tese do século

No caso da exclusão do ISS, o cenário não é muito diferente do que tínhamos para o ICMS/Freepik
No caso da exclusão do ISS, o cenário não é muito diferente do que tínhamos para o ICMS/Freepik
Uma das teses mais antigas e, ao mesmo tempo, mais contemporâneas do direito tributário deverá ter um novo capítulo no final do mês.
Fecha de publicación: 22/08/2021

Uma das teses mais antigas e, ao mesmo tempo, mais contemporâneas do direito tributário deverá ter um novo capítulo ao final do dia 27 de agosto com a conclusão do julgamento do recurso extraordinário (RE) 592.616 — tema 118 de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF) — que discute a constitucionalidade, ou não, da inclusão do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) na base de cálculo do PIS e da COFINS.

A questão decorre diretamente da chamada ‘tese do século’, que teve seus primeiros capítulos (mais importantes) em meados da década de 90 com a edição de duas súmulas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). As súmulas 68 e 94 que determinavam a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e do Finsocial, respectivamente.

Em relação ao ISS, o mesmo STJ, em junho de 2015, fixou a tese 634 em julgamento de recurso repetitivo no sentido de que o valor suportado pelo beneficiário do serviço, nele incluindo a quantia referente ao ISS, compõe o conceito de receita ou faturamento para fins de adequação à hipótese de incidência do PIS e da COFINS.


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Note que o julgamento do STJ com relação ao ISS ocorreu em um momento que o STF já havia: (i) afetado a constitucionalidade da matéria, eis que em outubro de 2008 o Plenário reconheceu a existência de repercussão geral para o RE 592.616, e (ii) julgado a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS no RE 240.785, em outubro de 2014.

A inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, como se sabe, foi mais tarde confirmada em repercussão geral no julgamento do RE 576.704 (tema 69 de repercussão geral) onde se fixou a tese que o valor relativo ao ICMS não é receita e nem faturamento das pessoas jurídicas, nos termos do art. 195, inc. I, alínea “b”, da Constituição Federal, racional que se aplica inteiramente à discussão da exclusão do ISS, conforme já se manifestou o próprio STJ em julgados mais recentes (vide AgInt no REsp 1574079/PR) e os Tribunais Regionais Federais (TRFs) em sua grande maioria.

Com efeito, os TRFs da 1ª Região, 2ª Região e 3ª Região, vêm estendendo a decisão firmada para o ICMS ao ISS, uma vez que o valor desses impostos não refletiriam qualquer riqueza, mas sim um ônus fiscal às empresas e que, por isso, não podem ser incluídos na base de cálculo do PIS e a da COFINS. Já nos TRFs da 4ª e da 5ª Região a questão não é unânime. Há julgados que ressaltam que não há ainda jurisprudência do STF quanto ao ISS e que, por conta disso, deve-se aplicar a tese definida pelo STJ em sede de recurso repetitivo, aqui já mencionada.

A despeito de tais posições, ainda presas ao julgamento sob o aspecto legal da discussão, é certo que tanto o ICMS como o ISS não correspondem ao produto da venda de bens e da prestação de serviços resultantes das atividades operacionais das empresas que se integram ao seu patrimônio, nem mesmo se enquadram no conceito de receita ou de faturamento. Pois, se alguém monetiza ICMS é o Estado (e o ISS é a Prefeitura), não as empresas, como bem colocado pelo Ministro Marco Aurélio em seu voto no julgamento do RE 240.785.

Nesse ponto, é importante mencionar que o STF ao julgar o tema 69 (ICMS - PIS/COFINS) não analisou a possibilidade (ou não) da incidência de tributos sobre tributo, o que já foi julgado e considerado constitucional, mas sim a acepção constitucional do faturamento, que não comporta os valores dos tributos pagos ao fisco, como cirurgicamente analisado pelo Ministro Luiz Fux naquele julgamento.

Tanto que o valor do ISS devido aos Municípios não ingressa no patrimônio das pessoas jurídicas com animus de definitividade, apenas transita pela contabilidade para posterior repasse aos cofres públicos municipais, onde, sim, é considerado receita e contabilizado como como receita derivada ou corrente, nos termos da Lei 4.320/64.

Exatamente, nesse sentido foi o voto inaugural do julgamento RE 592.616 (tema 118), em agosto de 2020, proferido pelo Ministro Celso de Mello (relator do recurso extraordinário, já aposentado): “O valor correspondente ao ISS não integra a base de cálculo das contribuições sociais referentes ao PIS e à COFINS, pelo fato de o ISS qualificar-se como simples ingresso financeiro que meramente transita, sem qualquer caráter de definitividade, pelo patrimônio e pela contabilidade do contribuinte, sob pena de transgressão ao art. 195, I, ‘b’, da Constituição da República".


Com o retorno do caso para julgamento, após o pedido de vista do Ministro Dias Toffoli - pauta virtual do dia 20 ao dia 27 de agosto -, acredita-se que o STF deva confirmar a tese fixada pelo relator, tal qual se viu na discussão sobre exclusão do ICMS (RE 574.706).
Tal expectativa se materializaria ainda que os Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Dias Toffoli e Gilmar Mendes mantenham seus entendimentos contrários à inconstitucionalidade, como manifestado no caso do ICMS, ficando para o Ministro Alexandre de Moraes a definição da matéria, uma vez que o Ministro Kássio Nunes Marques não participará do julgamento por ter substituído o Ministro Celso de Mello, atualmente aposentado e que já apresentou seu voto.


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De qualquer modo, não se espera que a definição do tema relativo ao ISS, que atinge prestadores de serviços, seja distinta daquela tocante ao ICMS, que alcança industriais e fornecedores, o que certamente causaria tratamento distinto a depender da atividade do contribuinte, para situações que são, por tudo e em tudo, similares.


Em assim ocorrendo, tem-se uma outra questão bastante relevante a ser considerada: a possibilidade de modulação de efeitos da decisão. Isso porque, como visto no julgamento do ICMS - PIS/COFINS, os Ministros se pautaram pela existência de posições anteriores sobre o tema para definir o alcance do julgamento da inconstitucionalidade.


No caso da exclusão do ISS, o cenário não é muito diferente do que tínhamos para o ICMS, pois há decisões, inclusive, em regime de recurso repetitivo no STJ, pela constitucionalidade da inclusão do ISS, o que significa dizer que é bastante provável que o STF, ao julgar pela inconstitucionalidade, module os efeitos da decisão, limitando a restituição dos valores pagos indevidamente para aquelas empresas que não tiverem ação judicial ou requerimento administrativo iniciados até tal data.


*Priscila Faricelli e Marco Favini são, respectivamente, sócia e advogado da área tributária do Demarest Advogados.

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