Redes neutras: um caminho para o futuro da banda larga

É o momento do desenvolvimento das redes neutras no país/Pixabay
É o momento do desenvolvimento das redes neutras no país/Pixabay
O cenário é propício pela ausência de regulação e enorme demanda por redes de fibra ótica em todo o território nacional.
Fecha de publicación: 02/02/2021

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Entende-se por “redes neutras” toda infraestrutura capaz de suportar a prestação de serviços de telecomunicações e que não são detidas por agentes que também prestam esse serviço ao usuário final. O seu uso é ofertado onerosamente pelo detentor a todos aqueles efetivos prestadores de serviços. Essa cessão deve se dar de forma isonômica e não discriminatória. Daí a qualificação dessa rede como neutra.

No Brasil, o tema ganhou relevância recente com notícias sobre o interesse de diferentes players investirem nessa infraestrutura, que poderá expandir o serviço de banda larga fixa no país.  

Hoje no país, a análise cruzada de dados da PNAD Contínua de 2019 e da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) revela que pouco menos da metade das residências existentes no Brasil têm acesso à banda larga fixa. Essa quantidade é ainda menor quando se analisa a qualidade do acesso à internet. Menos de um terço dos lares brasileiros possui conexão de alta velocidade (acima de 34 Mbps).

As redes neutras podem ser um modelo eficiente para suprir essa demanda de conectividade, pois apresentam como vantagem a utilização otimizada da infraestrutura, evitando ineficiências com capacidade ociosa. Essa eficiência pode levar, inclusive, a uma redução quantitativa de elementos de rede nos espaços que seriam mais bem aproveitados, com minimização de impactos ambientais e paisagísticos. 

Enquanto isso, as prestadoras de serviços de telecomunicações poderão reduzir significativamente custos com infraestrutura passiva, direcionando esses recursos para seu core business.

É o que, de fato, tem acontecido nos últimos anos. Verifica-se um forte interesse dos grandes players do setor de telecomunicações em segregar e alienar os seus ativos de rede para empresas especializadas na gestão e exploração econômica desses ativos.


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Panorama regulatório

A Anatel ainda não regula as redes neutras. O tema, contudo, não está fora de seu radar. Recentemente, na Consulta Pública nº 65/2020, a Agência manifestou preocupação com potenciais entraves que a regulamentação atual poderia trazer para a implementação de redes neutras.

Embora não haja regulação específica, a noção por trás das redes neutras não é estranha ao setor de telecomunicações. O compartilhamento de infraestrutura entre operadores é incentivado pela legislação (art. 2º da Lei das Antenas). O titular de uma infraestrutura cede onerosamente a uma prestadora de serviços de telecomunicações parte da sua capacidade. 

A operação de redes neutras pode se dar de diversas maneiras, a depender se ela vai se valer de novas obras públicas de infraestrutura. 

Se não for, ela deverá se atentar para as obrigações de instalação, licenciamento e compartilhamento estabelecidas na Lei das Antenas, além de eventuais legislações e regulamentações locais, bem como específicas em caso de peculiaridades da localidade (área de proteção ambiental, por exemplo). Além disso, não poderá perder de vista a necessidade de ajustes jurídicos com os detentores de outras infraestruturas, por meio das quais as redes neutras se integrariam, ou nas quais se apoiariam, tais como dutos, condutos e postes.

Por outro lado, havendo interesse em aproveitar novas obras públicas de infraestrutura, a atenção deve recair para a disciplina do recém publicado Decreto nº 10.480/2020, que, regulamentando a Lei das Antenas, estabelece determinados contornos e procedimentos para a instalação de redes de telecomunicações nessas obras.

As redes neutras do mundo

Na Europa há maior maturidade no tema. Segundo a consultoria Arthur D. Little, em 2019 as redes neutras de fibra representaram, sozinhas, 21% de todo volume financeiro transacionado por lá no setor de telecomunicações.

Mas, além de um forte volume de investimentos, há na Europa operações estruturadas de redes neutras que podem servir de inspiração para a evolução do tema no Brasil.

Na Alemanha, destacam-se alguns projetos nos quais a atuação do Poder Público teve um papel relevante. Um deles é o do ZBA, um consórcio formado por autoridades locais, que objetiva levar internet banda larga para uma região rural do país por meio da construção de redes neutras. Essas redes ficariam sob a propriedade dos municípios dessa região e seriam alugadas para provedores de internet. 

Projetos similares tomaram lugar na Suíça, onde uma prestadora de serviços de telecomunicações firmou contratos com grandes municipalidades para instalar redes neutras, assegurando para si o uso de parte da capacidade dessas redes. 

Um segundo modelo está presente na Itália: há uma empresa que, além de construir, se dedica exclusivamente a operar e explorar redes neutras. Criada em 2015, essa empresa é hoje uma das maiores detentoras de redes de fibra da Europa, atendendo quase 10 milhões de residências na Itália e tendo obtido financiamentos públicos e privados da ordem de R$ 7 bilhões de euros.

É o momento do desenvolvimento das redes neutras no país. O cenário é não só propício pela ausência de regulação, como também pela enorme demanda por redes de fibra ótica em todo o extenso território nacional.

*Milene Louise Renée Coscione e Caio Dias de Moura são advogados do Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados.


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