Em período de pós-pandemia ou de flexibilização, como muitos afirmam, os direitos garantidos durante o período excepcional não estão mais em vigor, ou seja, a ausência de multa por cancelamento de voos prevista na Lei n. 14.174/2021 hoje é mera opção do fornecedor. A multa para determinados tipos de contratos é uma forma legítima de evitar a pura e simples desistência sem qualquer motivo, muitas vezes impossibilitando que o fornecedor possa substituir a desistência por outra aquisição.
Contudo, ainda que as multas por cancelamento possam atingir a totalidade da passagem, conforme as regras das companhias, é incabível que multas extrapolem valores superiores à própria passagem, podendo tal conduta caracterizar prática abusiva, além de o consumidor ter o direito de ser devidamente informado pelos fornecedores do custo sobre multas e demais regras da empresa.
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Quando o cancelamento da passagem parte diretamente da empresa, as regras são mais benéficas ao consumidor, pois a empresa tem a obrigação de permitir ao consumidor a escolha entre a reacomodação, restituição integral do valor pago ou a execução do contrato de transporte por outras formas. Nos termos da Resolução n. 400/2016 da ANAC, a companhia aérea tem até 7 (sete) dias para fazer o reembolso, contados a partir do pedido do passageiro, sem correção monetária.
Da mesma forma que ocorre com os cancelamentos realizados pelo consumidor (no-show), é obrigação da empresa ser transparente com as informações, alertando o consumidor de todas as consequências de opção contratual a ser eleita, evitando eventual arrependimento posterior por vício na informação. A informação equivocada transmitida por funcionário da companhia não exime a empresa de atender às solicitações do consumidor, desde que estejam abrangidas pela legislação.
A remarcação de festas, entretanto, não possui regulação tão detalhada, pois a atividade não possui regulação federal, como ocorre com a aviação civil. Todavia, o Código de Defesa do Consumidor é plenamente aplicável, bem como a Lei n. 14.046, de agosto de 2020, que dispões sobre medidas emergenciais durante a pandemia da Covid-19, que não obriga o prestador de serviços a reembolsar valores ao consumidor, desde que assegure a remarcação dos serviços, das reservas e dos eventos adiados ou disponibilização de crédito para uso ou abatimento na compra de outros serviços, reservas e eventos disponíveis nas respectivas empresas.
Caso o prestador do serviço solicite um valor adicional, ainda que não seja a título de multa, mas decorrente de problemas da Covid-19, tal prática é considerada abusiva e o consumidor não deve arcar com tal custo. Eventuais mudanças decorrentes da pandemia ou mesmo de outras situações que possam encarecer a prestação de serviço não devem ser repassadas indevidamente ao consumidor.
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Além disso, remarcações não relacionadas ao coronavírus podem ocorrer e devem respeitar as regras expressas no Código de Defesa do Consumidor, evitando sempre o desequilíbrio da relação de consumo.
Especialmente em situações de festas, há prestadores de serviços que, no intuito de prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, surgem com novos serviços ou propostas, onerando a contratação previamente celebrada, o que contraria as regras de proteção às relações de consumo, sendo prática abusiva a exigência dessa vantagem indevida e encarecimento do serviço sem justo motivo.
Cabe, portanto, ao consumidor procurar fornecedores bem recomendados no mercado e, caso tenha a infelicidade de sofrer prática abusiva, negociar diretamente com o fornecedor a solução do caso e, se não houver consenso, que procure os órgãos de proteção e defesa do consumidor.
*Bruno Boris é professor de Direito do Consumidor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Campinas.
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