Se retrocedermos aos tempos de tolerância à corrupção, alcançaremos o pior patamar de pobreza 

Um Estado corrompido não apenas pode ser ineficiente no combate a crises sanitárias, mas prejudicar toda a população/Fotos Públicas
Um Estado corrompido não apenas pode ser ineficiente no combate a crises sanitárias, mas prejudicar toda a população/Fotos Públicas
Um Estado corrompido não apenas pode ser ineficiente no combate a crises sanitárias, mas prejudicar toda a população/Fotos Públicas
Fecha de publicación: 29/04/2021

Há mais de meia década, a temática que envolve a corrupção foi abundantemente tratada. Foram discutidas causas, personagens - especialmente, heróis e vilões - bem como as implicações socioeconômicas desta prática criminosa.  

Fora partes escancaradamente interessadas na relativização de seu combate, se verificou raro consenso e engajamento da sociedade, que possibilitou que instituições-chave atuassem e o resultado foi a maior operação anticorrupção da história, que desmontou quadrilhas de corruptores e corrompidos envolvendo pessoas e instituições antes intocáveis, devolvendo aos cofres públicos recursos subtraídos e punindo os infratores em números antes inimagináveis.


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Em 2021 parece  que algo mudou. Verifica-se crescer em não desprezível parcela da população - até mesmo nas não direta e politicamente interessadas - um sentimento de que aqueles eventos históricos e seus envolvidos não importam mais tanto. Mas tal julgamento da opinião pública é injusto. Ele também deve ser feito sem “amnésia”, não se devendo desconsiderar os contextos passados, atuais, e as expectativas futuras.  

Nos primeiros e célebres momentos da Operação Lava-Jato houve análises jurídicas honestas no sentido de que os fins obtidos não se coadunavam com os meios legais disponíveis para os atos que foram praticados. Nesse sentido, foi aventado que o suporte da sociedade não justificaria que membros do poder público vergassem as normas que compõem o Estado de Direito. 

Dito e feito. Atualmente o clamor popular não mais sustenta a heterodoxia que culminou com a eficácia daquela cruzada contra a impunidade. Muito recentemente, a percepção da maioria da população não espelhou a dos votos dos magistrados no nosso tribunal constitucional. 

Contra o sistema cujos resultados não agradam o que resta é mudá-lo, por mais distante e improvável que possa parecer.  

Para tanto, favorece bastante lembrar que a corrupção é o pior dos males para perpetuar e agravar o estado de pobreza material e moral de uma nação. Todos os setores são afetados. Pincemos o obviamente mais atual: as políticas de saúde pública. 

Um Estado corrompido não apenas pode ser inerte ou ineficiente no combate a crises sanitárias e humanitárias como a da Covid-19, mas também drena os recursos para quaisquer ações governamentais que se queira implementar, alargando sobremaneira as consequências para a população. Além disso, a percepção da corrupção generalizada dificulta a aceitação do cidadão dos sacrifícios econômicos, ou de muitos outros matizes, impostos por seus governantes. 

O caminho que se trilhou na excepcional força-tarefa aqui mencionada parece que insuficientemente resultou no enfrentamento das reais causas da corrupção, dentre as quais é de se sublinhar a incompetência de um poder legislativo que pouco legisla fora de interesses políticos, de causas próprias e demais assuntos inferiores na hierarquia de prioridades do país.  

Fora as consequências diretas das faltas do poder legislativo, há as indiretas, que levam a aberrações perpetradas pelos outros poderes, como o volume indecente de medidas provisórias por parte do executivo e de decisões judiciais que incomodam ao decidir na ausência de lei que alcance o bem comum. 

Fossem antes votadas reformas de Estado (e não de Governo) para a persecução judicial dos interesses públicos, não haveria se “ressuscitar" institutos que atualmente conspiram em favor da impunidade como, por exemplo, o relativo à prisão em segunda instância, que revoltam indivíduos que realmente querem uma prestação de serviços públicos mais eficientes. 


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Mas não basta querer que as instituições funcionem a contento. Para se ter esperança de medidas sérias não esbarrarem no ordenamento jurídico que se nos apresenta, a vontade popular deve se traduzir no resultado das urnas. Enquanto a maioria dos eleitores não suficientemente se importar com a qualidade de seus representantes, não haverão de faltar caciques políticos, delinquentes conhecidos e maus-caracteres em geral que se candidatem e ganhem assento e voz em nome do cidadão.  

*Carlos Eduardo Moreira Valentim é sócio fundador do Valentim Advogados, é membro da Diretoria do Departamento Jurídico - Dejur na Fiesp e do Grupo Técnico-Jurídico da Associaçã Brasileira de Engenharia Industrial (Abemi).

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