Sustentabilidade das empresas no eSocial: adiamento, práticas e desafios

A plataforma já está preparada para início de produção em abril/Marcelo Camargo/Agência Brasil
A plataforma já está preparada para início de produção em abril/Marcelo Camargo/Agência Brasil
Com os principais desafios trazidos pelo eSocial, empregadores são novamente impulsionados a organizar e inovar no âmbito trabalhista.
Fecha de publicación: 15/02/2023

Chegou a vez dos processos trabalhistas serem declarados pelas empresas via programa do governo federal que determinou a substituição da GFIP-Reclamatória pela DCTFWeb. Apesar da nova versão S-1.1 do eSocial ter sido implementada no dia 16/01/2023, os eventos pertencentes ao módulo “Processo Trabalhista” só estarão disponibilizados para envio a partir de 1º de abril.

Os eventos pretendem criar uma estrutura para que o Estado detenha um banco de dados cadastrais e contratuais dos vínculos trabalhistas de acordo com as decisões processuais. Isso ocorrerá através do tombamento das bases de cálculos utilizadas nos recolhimentos do FGTS e das contribuições previdenciárias, bem como das mediações firmadas em CCP (Comissões de Conciliação Prévia) e NINTER (Núcleos Intersindicais de Conciliação Trabalhista). Com essas informações declaradas no eSocial a tendência é que a GFIP seja extinta em breve, pois a partir da nova vigência, haverá a substituição do recolhimento previdenciário através dos dados declarados na plataforma.

Certo que, neste momento, não há menção expressa a multas causadas pela ausência das informações declaratórias exigidas pelo eSocial. No entanto, o descumprimento das determinações poderá acarretar uma variedade de multas presentes em outras legislações que abrangem obrigações já presentes no eSocial vide não enviar o ASO (Atestado de Saúde Ocupacional) ou não comunicar o CAT (Acidente de Trabalho), por exemplo.

É indispensável que tanto as empresas quanto as assessorias contábeis e jurídicas saibam que, apesar da transmissão das informações de base do FGTS, o recolhimento ainda não ocorre via eSocial. Neste primeiro momento, se houver previsão de recolhimento do FGTS, ainda será necessária a elaboração da GFIP no sistema da Caixa Econômica. Entretanto, há previsão que no segundo semestre o FGTS digital entre em produção para empregar os dois âmbitos. A ideia é que a nova modalidade implemente agilidade trazendo o Pix como o único modo de pagamento. Sendo assim, a contabilidade da empresa e sua política de recolhimentos ficará ainda mais rastreável.


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Independente da atuação conjunta futura do eSocial com o FGTS digital, o empregador/pagador poderá tanto declarar diretamente tais informações quanto terceirizar a transmissão do evento, contanto que haja procuração exclusiva. Atualmente, o envio das informações poderá ocorrer de duas maneiras: Sistema de gestão do declarante (canal interno das empresas que transmite via webservice o conteúdo necessário para o banco de dados do eSocial, sem contato direto com o portal) e Plataforma web do eSocial através do módulo processual trabalhista;

No caso de revelia ou não comparecimento da empresa no processo trabalhista, há previsão para que em 2024 o próprio Poder Judiciário transmita tais informações. Hoje, já ocorre a integração da Justiça com o eSocial apenas através do evento S-8299, responsável pela baixa judicial do vínculo.

Em consequência, a possibilidade de transmissão pela Justiça, trouxe debates e especulações de pleitos pela criação de um hiperlink entre a plataforma com o PJe, uma vez que o PJe-Calc possui um perfil padrão muito mais aderente ao levantamento das informações no reaproveitamento dos cálculos. Porém, não há notícia oficial, de modo que o cenário esperado é utópico, ao menos a curto/médio prazo.

Retomando ao foco principal quanto aos efeitos do novo evento, é de suma importância destacar que o envio da informação é dever não apenas do empregador, mas do responsável pelo pagamento da condenação. Ou seja, as empresas sentenciadas pela responsabilidade subsidiária ou solidária devem estar atentas às regras contidas no último manual de orientação disponibilizado pelo Governo.

Na atual versão, podem ser observadas algumas situações principais, tais como o pagamento solidário entre demais devedores. Aqui, o valor das bases informadas deverá corresponder às suas respectivas cotas. Além disso, já existindo declaração do vínculo no eSocial pelo empregador principal, a matrícula informada não precisará ser idêntica, desde que o novo pagador também possua o vínculo sentenciado.

Notável que a plataforma já está preparada para início de produção em abril, motivo pelo qual não é prudente que as empresas confiem nos “boatos” de um novo adiamento. Orienta-se que os próximos dois meses devam ser utilizados para aprofundamento na nova plataforma.

A partir de abril, a empresa receberá o processo e cadastrará no eSocial. Este disponibilizará os respectivos eventos: S-2500 (Processo Trabalhista); S-2501 (Informações de Contribuições Decorrentes de Processo Trabalhista) e S-3500 (Exclusão de Eventos – Processo Trabalhista). Somente após o envio desses eventos teremos o totalizador inserido na DCTFWeb através do S-5501 (Informações de Tributos decorrentes de Processo Trabalhista).

Em outras palavras, há basicamente dois eventos: o principal (S-2500) e o que trata especificamente dos recolhimentos previdenciários do IR (S-2501). Esses eventos são independentes, motivo pelo qual se criou um novo de exclusão (S-3500). Na prática, no envio do S-2501, já será recebido o totalizador através do S-5501 e essas informações alimentarão as bases de dados do MTE, INSS e da RFB.

Ora, certo que entre os setores há uma dúvida habitual relacionada às verbas 100% indenizatórias. Evidente que será necessária a alimentação do evento trabalhista, entretanto, diante da ausência de verbas será um evento simplificado, tornando diversos campos dispensáveis de preenchimentos. Por exemplo, não haverá recolhimento de CP e IR, sendo necessária apenas a transmissão do evento principal.

Com o adiamento, o período de declarações dos novos eventos não retroagirá às decisões transitadas em julgado ou acordos e cálculos homologados anteriores a 1º de abril. Ou seja, a obrigação passará a contar a partir da nova vigência, salvo prazo antecipado para fins de obrigações decorrentes de decisões judiciais.

Incontestável que as informações cadastrais e contratuais relacionadas ao vínculo com o empregado serão registradas apenas se não estiverem na plataforma. Ou seja, versando sobre o mesmo vínculo contratual, as principais informações serão puxadas de forma automática na inserção da matrícula. Isto é, independente do vínculo, o objetivo permanece o mesmo: fixar as bases de cálculos para recolhimento de FGTS e contribuição previdenciária.

Há seis tipos de contratos que poderão ser informados no evento trabalhista:

1) Quando o trabalhador já possuía seu vínculo reconhecido e não houve mudança na data de admissão e desligamento;

2) quando o trabalhador já possui seu vínculo reconhecido, porém houve mudança na data de admissão com a manutenção da data de desligamento;

3) quando o trabalhador já possui seu vínculo reconhecido, porém houve mudança na data de desligamento e inalterada a data de admissão;

4) quando o trabalhador já possui seu vínculo reconhecido, porém houve mudança nas datas de admissão e desligamento;

5) vínculo de emprego reconhecido perante a Justiça do Trabalho;

6) Quando o processo trabalhista não versar sobre vínculo de emprego.

Ao selecionar o tipo contratual nº 5, serão abertos campos cadastrais e contratuais através da chave [remuneração] para a inserção das evoluções salariais durante este período, podendo chegar a até 99 ocorrências. Já na chave [infoCompl] há condições de preenchimentos atualizados, a exemplo da CBO, duração contratual, natureza das atividades etc. É relevante compreender que as informações devem refletir a condição vigente na época do trânsito em julgado ou celebração do acordo, mesmo quando envolver estado civil e dados dos dependentes. Estes últimos, serão necessários apenas quando considerados para efeito de imposto de renda.

Observa-se que o S-2500 é um dos eventos mais complexos no eSocial diante do quantitativo de informações e misto de legislações em um único ambiente, motivo pelo qual exigirá tanto um alinhamento e parceria entre o DP e Jurídico, quanto extrema cautela do responsável pelo preenchimento.

Inclusive, prudente destacar que tanto as assessorias contábeis deverão redobrar a atenção - pois os cálculos precisam ser tecnicamente liquidados com desmembramentos bem definidos - quanto o advogado terá que se atentar se as sentenças esclarecem as informações necessárias dentro dos novos parâmetros, atuando de modo mais proativo e preventivo nos embargos de declaração.

O alerta deverá ocorrer do mesmo modo com as empresas que terceirizam suas atividades, não deixando de lado a importância na gestão interna de terceiros. A fiscalização do kit de informações dos prestadores até o histórico financeiro da contratada são pontos que não poderão sofrer negligências pelos setores. Por mais que se terceirize, todos estão propícios a situações críticas geradas não só pela obrigação do pagamento, mas, principalmente agora, pelo risco de divergências cadastrais na vida do trabalhador.


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Com isso, preventivamente, será necessária uma maior interação entre a empresa tomadora de serviços e a prestadora. A empregadora principal deverá dispor à contratante todas as informações necessárias dos vínculos com seus empregados prestadores. Em complemento desta relação, será relevante também a análise do advogado em demandas trabalhistas desde as peças contestatórias e documentações apresentadas. Desta forma, caso a contratada se torne insolvente e desaparecida, o responsável subsidiário pelo passivo não terá muita dificuldade no repasse das informações.

Portanto, no momento do acordo homologado ou da sentença transitada em julgado, os escritórios de advocacia apoiarão seus clientes transmitindo as informações atualizadas e transitadas em julgado na Justiça do Trabalho. Porém, notório que o departamento pessoal é o setor que possui todo o histórico dos registros empregatícios diante da sua singular responsabilidade perante a corporação e caráter declaratório que os eventos do eSocial possuem. Considerando a habilidade no preenchimento dos campos e intimidade com a plataforma desde 2014, é o principal setor cuja rotina é constantemente impactada com os avanços das fases na interface.

Com efeito, independentemente de quem será qualificado para envio direto das informações ao portal web, recomenda-se como medida protetiva jurídica, um termo de responsabilidade que delimita expressamente as condições mutuamente aceitas e acordadas entre os escritórios de advocacia e seus clientes quanto ao repasse dos dados processuais trabalhistas, sinalizando transparência e compromisso ético entre as partes.

De modo geral, com a prorrogação da vigência do envio ao eSocial para 1º de abril, tanto o jurídico e sua contabilidade, quanto o departamento pessoal, ganham tempo de preparo. A atuação conjunta possui caráter preventivo para que não haja divergências entre informações processuais trabalhistas e banco de dados cadastrais do Estado. O descumprimento no preenchimento da plataforma impactará na viabilidade das obrigações rotineiras da empresa para com a administração federal possibilitando a aplicação de sanções taxadas em outras leis e normativas. Com os principais desafios trazidos pelo eSocial, os empregadores e seus parceiros são novamente impulsionados a organizar e inovar no âmbito trabalhista, prezando pela sustentabilidade das empresas e seus clientes com o intuito de otimizar os recursos financeiros se adequando a era digital sem prejuízo dos seus empregados e prestadores.

*Agatha Marquezini é advogada e sócia do Lee, Brock, Camargo Advogados (LBCA).

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