A veiculação de música no metaverso

Experiência obtida no mundo presencial é o melhor ponto de partida para traçar mecanismos de regulação da veiculação de música no Metaverso/Canva
Experiência obtida no mundo presencial é o melhor ponto de partida para traçar mecanismos de regulação da veiculação de música no Metaverso/Canva
Experiências na plataforma já têm sido pensadas por grandes nomes da indústria.
Fecha de publicación: 28/04/2022

Se a chegada do streaming, nos anos 2000, ocasionou uma miríade de possibilidades e, inclusive, no Brasil, uma nova noção do conceito de execução pública, é provável que o metaverso também motive o surgimento de novas controvérsias jurídicas no que tange à veiculação de música nos seus ambientes.

Antes de a nova realidade virtual ser realidade no Brasil, alguns jogos de videogame, como o Fortnite, considerados como precursores do metaverso, exemplificam como pode se dar a exploração da música nesse novo universo. O jogo vem promovendo, desde 2019, shows virtuais e exclusivos de grandes nomes da música, como Travis Scott, Lil Nas X e Ariana Grande, em que os avatares dos usuários alteram suas posições e se movimentam de forma livre enquanto assistem aos espetáculos. Os eventos se tornaram um sucesso – cada show atraiu desde então entre 10 e 33 milhões de pessoas.

Experiências musicais no metaverso, contudo, não são mais exclusividade de jogos de videogame e já tem sido pensadas por grandes nomes da indústria musical, como o cantor de música pop Justin Bieber que realizou, em 2021, um show interativo, no metaverso da plataforma Wave. Na ocasião, o artista performou, por 30 minutos, através de um avatar que replicava seu visual e trejeitos característicos, as músicas do seu último álbum “Justice”.

Ao menos no que se refere a realizações de concertos ao vivo, a veiculação de música “em metaversos” já é uma realidade. No entanto, sendo o metaverso um universo virtual, em que praticamente todas as ações realizadas no mundo físico poderão ser nele replicadas, é inevitável que os usuários também adquiram, ouçam e compartilhem, rotineiramente, música nesse novo ambiente.


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Nesse sentido, a arrecadação dos direitos autoriais e conexos das músicas executadas no âmbito do metaverso, seja em apresentações em tempo real ou outras modalidades de execução pública, seja em reproduções individuais via streaming, constituem um grande desafio para os escritórios de arrecadação no mundo todo. Não à toa, nos Estados Unidos, a discussão avançou ao ponto de a NMPA (National Music Publishers’ Association) ajuizar ação de infração a direitos autorais, no valor de US$ 200 milhões de dólares, em face da Roblox, famosa plataforma de multiverso, pela ausência de recolhimento de royalties pela execução de música na plataforma.

Evidente, portanto, que tais interações têm por si só o condão de provocar rupturas na forma como são regidos os direitos autorais e conexos atualmente. Outra mudança revelada é a gamificação da experiência musical, que adiciona uma nova camada ao já complexo fatiamento dos direitos autorais, direitos conexos e direitos dos músicos executantes. Isso se deve ao fato de que a experiencia musical criada no metaverso só é possibilitada graças ao trabalho de criação e aprimoramento realizado pelos desenvolvedores de games, o que leva inevitavelmente à indagação sobre o percentual da participação desses agentes nesse complexo mundo da arrecadação e distribuição de direitos na indústria fonográfica. Isso sem falar em potenciais criações musicais dentro do ambiente virtual a partir dos avatares e das ferramentas proporcionadas, justamente, por desenvolvedores de plataforma do metaverso.

Em que pese sejam incipientes quaisquer regulações de direitos autorais que possam existir a respeito do metaverso, não se pode olvidar a importância da elaboração de contratos de cessão e licenciamento com previsão a essas novas tecnologias e, ainda com inclusão de cláusula mais abrangente, que possam acobertar tecnologias que venham a existir a partir do desenvolvimento tecnológico – como já autorizado pelo Superior Tribunal de Justiça (Resp 1.098.626/RJ).

É perceptível que o surgimento do metaverso atrai, para o campo dos direitos autorais, inúmeros questionamentos jurídicos, seja a respeito da partilha dos royalties, da possível classificação como execução pública, da jurisdição competente ou de outras indagações que naturalmente surgirão com o tempo. Ainda assim, a experiência obtida no mundo presencial é o melhor ponto de partida que se tem para traçar mecanismos de regulação da veiculação de música no metaverso. 

*Pedro Barroso (sócio), Jana Fraccaroli, (advogada) e Jose Humberto Deveza Assola (advogado) da área de Propriedade Intelectual do BMA Advogados.

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