Vendas no varejo caem mais que o esperado por causa da inflação

A queda do poder aquisitivo da população tem sido tão grave, que até a compra de alimentos e bebidas tem mostrado declínio/Pixabay
A queda do poder aquisitivo da população tem sido tão grave, que até a compra de alimentos e bebidas tem mostrado declínio/Pixabay
Menor renda familiar nas classes C e D dificulta recuperação econômica.
Fecha de publicación: 12/11/2021

Sem tréguas e nem bandeira branca. O IPC-A de outubro chegou a atingir 10.67% em 12 meses ou 1.25% mensais, após já ter registrado alta mensal expressiva de 1.16% em setembro. O maior valor desde janeiro de 2016 (10.71%), quando o Bacen sofria intervenções políticas para tentar manter em vão a atividade econômica em patamar positivo. No final, acabamos com um recuo do PIB de 3.6%. Não há mágica e a oferta monetária é neutra no longo prazo. Ou assim diz a teoria econômica.

 

Dentre os maiores vilões, nenhuma surpresa; combustível, gás de botijão, energia elétrica (bandeira roxa), óleo diesel, gasolina e etanol voaram acima dos 30% nos últimos 12 meses, piorando ainda mais a renda das classes menos abastadas, que geralmente utilizam maior parte de seus recursos na compra desses bens. Menor renda familiar nas classes C e D, menor consumo, dada a maior propensão a consumir dessas classes, o que acaba dificultando a recuperação econômica pelo lado do consumo.


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Vilões da inflação – IPC-A 12 meses (10.67%)

Inflação
Inflação

Fonte: IBGE

 

Mas e o contracionismo monetário adotado pelo Bacen? Não vai surtir efeito? Ou se for, quando começará? Esse é um debate longo e interessante, pois apesar da formação de preços ser sempre uma conjunção de oferta e demanda inexorável, a maior parte desses repiques inflacionários observados atualmente advém de choques de oferta ocasionados com a retomada da atividade em partes do mundo, onde a oferta não consegue acompanhar a velocidade da demanda.

 

Entretanto, não quer dizer que o Bacen não deva agir como forma de limitar a difusão do espectro inflacionário, mas que o poder da política monetária se torna menor para influenciar a formação de preços, que já vem majorados de fora ou por motivos exógenos, como é o caso dos combustíveis e da energia elétrica.

 

Além do que, política monetária, antes de tudo não deixa de ser uma arte. Todos sabemos o que deve ser feito, mas não podemos esquecer que os efeitos de mudanças nas condições monetárias, geralmente surtem efeitos nos preços apenas após algum tempo, talvez 6 a 9 meses. Esperemos que o Bacen saiba dosar com maestria a dosagem do medicamento, tentando antecipar novos choques vindouros.


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Susto das vendas no varejo

 

Já era de se esperar um recuo de pelo menos 0.2% nas vendas no varejo em setembro, mas o recuo veio um pouco pior. Queda de 1.3% quando comparado com o mês de agosto do mesmo ano (MoM %) e queda de 5.5% quando comparado com o mês de setembro de 2020 (YoY %), auge da pandemia.

 

Conforme mostra a tabela a seguir, poderíamos comentar sobre a queda nas vendas físicas de móveis e eletrodomésticos de 3.5% MoM e de 22.6% (YoY). Claro que em parte, essa queda nas vendas dessa rubrica deve refletir a idiossincrasia da pandemia e da prática do home office e home schooling. Afinal de contas, a maior parte das famílias teve que adaptar suas casas com compras de novos equipamentos tecnológicos (laptops para toda a família, roteadores por toda a casa, etc), além de dar um “tapa” nos móveis da casa, já que passamos a maior parte do tempo trabalhando dentro do nosso lar doce lar.

 

Entretanto, o aumento das vendas desse segmento nos meses durante a pandemia, como antecipado, não iria se repetir, afinal ninguém troca todos os equipamentos eletrônicos e reforma suas casas todo o mês. Ainda mais em um cenário econômico de menor renda disponível. Daí a queda não surpreendente das vendas físicas de móveis e eletrodomésticos, desde pelo menos julho deste ano.

 

Mas o que mais chama atenção, além do susto da queda nas vendas no varejo como um todo, tem sido a queda observada nos hipermercados, supermercados, produtos alimentícios e bebida. Aparentemente, a queda do poder aquisitivo da população tem sido tão grave, que até a compra de alimentos e bebidas (necessidade básica) tem mostrado declínio.

 

Isso é preocupante! Postergar compra de carros, móveis, eletrodomésticos e/ou reformar a casa depois que as coisas melhorarem, parecem decisões normais em momentos de leve estresse econômico, mas reduzir o consumo de alimentos e bebidas, mostra que a queda de renda disponível da população está cobrando um preço alto, o que deverá repercutir de forma bem desagradável no crescimento (recessão) esperada para 2022.

 

Vendas no Varejo (setembro/2021)

Vendas no varejo

 

*Roberto Dumas é economista e professor do Insper.

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