O decreto que autoriza a arbitragem para solucionar dúvidas relativas a contratos do poder público com empresas de infraestrutura deverá trazer economia de custos e um desenvolvimento mais eficiente de obras e serviços de grande porte no Brasil, avalia o advogado Pedro Paulo Cristofaro.
Sócio do Chediak, Lopes da Costa, Cristofaro, Menezes Cortes e Simões Advogados, ele é formado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, onde dá aulas de direito comercial desde 1975, e diretor jurídico da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Fundação Getúlio Vargas.
Como avalia o decreto de arbitragem em concessões?
O Decreto 10.025 de 20 de setembro de 2019 constitui importante e benvinda providência que beneficiará os setores de infraestrutura dele objeto (portuário e de transporte rodoviário, ferroviário, aquaviário e aeroportuário), ao regulamentar e incentivar o uso de meios alternativos de solução de conflitos nos contratos relacionados com esses setores, celebrados entre, de um lado, a União e entidades da administração pública federal e, de outro, empresas privadas.
Que impactos estima para o setor de infraestrutura?
Estimo impactos bastante positivos. O decreto prevê a utilização não apenas da arbitragem, mas também de quaisquer outros meios alternativos de solução de conflitos para decidir as questões surgidas, nessas áreas, entre o Poder Público e as empresas privadas prestadoras dos serviços.
Como sabido, a busca de soluções não judiciais é hoje em dia uma constante. A demora na solução dos processos, decorrente do congestionamento das vias judiciais, tem levado à crescente utilização da arbitragem, especialmente em questões que envolvam interesses empresariais.
O decreto 10.025 não contempla apenas a arbitragem mas também, como expressamente prevê o seu artigo 4º e o parágrafo terceiro do artigo 5º, admite quaisquer outros mecanismos extrajudiciais adequados à solução de controvérsias. Assim, a mediação é perfeitamente possível de ser utilizada. Especialmente cabível nos contratos de concessão de longo prazo são as “Dispute Resolution Boards - DRB” (“Comités de Solução de Controvérsias”), mecanismo amplamente utilizado nos Estados Unidos, na Europa na Austrália e na Nova Zelândia. O DRB é um comité constituído quando da assinatura de contrato de longo prazo que, conforme o modelo escolhido pelas partes, faz recomendações que podem ou não ser acatadas pelas partes ou profere decisões vinculantes. O DRB permite soluções rápidas e menos custosas para questões que sempre surgem na execução dos contratos de longo prazo. Grandes obras o utilizaram com sucesso, tais como a do Eisenhower-Johnson Memorial Tunnel, escavado nas Montanhas Rochosas, obra gigantesca com 97 quilômetros de extensão, o Aeroporto de Hong Kong, a usina subterrânea de Ertan, na China e o trecho no Reino Unido do Eurotúnel. O DRB é sem dúvida adequado não apenas a grandes obras mas a contratos de concessão.
Parece evidente que a possibilidade de soluções mais rápidas, mais adequadas e menos custosas resultará em economia de custos e no desenvolvimento eficiente de obras e serviços de grande porte.
Como vê a possibilidade de a arbitragem definir valores para a recomposição de equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão diante da ocorrência de irregularidades em aditivos firmados pela administração pública em obras de infraestrutura?
O árbitro, como juiz de fato e de direito, terá competência para decidir da ocorrência ou não de irregularidades nas contratações quando lhe for dado estabelecer valores para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos. Ressalte-se que, de acordo com o decreto, é amplo o campo em que se podem utilizar os meios alternativos de solução de conflitos, compreendendo, mas não se limitando, apenas àquelas matérias arroladas exemplificativamente no parágrafo único do artigo 2º, como a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, o cálculo de indenizações decorrentes da extinção ou da transferência de contratos de parceria e o inadimplemento de obrigações contratuais de qualquer das partes.
Como vê a possibilidade de arbitragem para tratar do inadimplemento de obrigações contratuais? Acredita que o governo conseguiria agilizar a entrega de concessões ou a retomada de obras paradas dessa maneira?
Nos termos do decreto 10.025, as consequências do inadimplemento de obrigações contratuais poderão ser sem dúvida objeto de arbitragem e também de outros meios alternativos de solução de controvérsias possibilitando a solução mais rápida de questões que retardam a entrega de concessões e a retomada de obras paradas.
O decreto também permite arbitragem em caso de inadimplemento da União. O sr. acredita que isso possa ser resolvido via arbitral? Se o caso é de arbitragem, portanto mais ágil e sem possibilidade de recurso, como tornar mais rápido o pagamento do governo em caso de derrota arbitral?
O parágrafo 2º do artigo 5º do decreto, ao prever textualmente, em seu inciso III, a utilização da arbitragem para decidir sobre o inadimplemento das obrigações contratuais de qualquer das partes, permite expressamente a arbitragem em caso de inadimplemento pela União.
Condenado o governo por sentença arbitral, o pagamento se fará por precatório. O parágrafo 2º do artigo 5º do decreto contempla a possibilidade de alternativas menos demoradas, inclusive a compensação com deveres de natureza não tributária, a compensação com multas e a atribuição da obrigação de pagar a terceiro.
Como vê a possibilidade de um processo arbitral sigiloso determinar o valor de indenização de concessionários em caso de relicitação?
O processo arbitral que envolva a União não pode ser sigiloso, o que violaria o princípio da publicidade a que está sujeita a administração pública por força do disposto no artigo 37 da Constituição da República, por sinal expressamente ratificado no inciso IV do artigo 3º do decreto 10 025 de 2019.
O sr avalia que casos atualmente em discussão no Judiciário possam migrar para a arbitragem após o decreto?
Os parágrafos 3º e 4º do artigo 6º do decreto expressamente contemplam a possibilidade de submeter-se à arbitragem questão que esteja sendo objeto de ação judicial em curso.
O Judiciário está pronto para manter decisões arbitrais sem reavaliar o mérito do caso?
O Judiciário, que tem sido extremamente favorável à arbitragem, tem reiteradamente se recusado a reavaliar o mérito das decisões arbitrais. É firme nesse sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
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