Judiciário está pronto para permitir menor intervenção estatal na economia

Crédito: Divulgação
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Para Claudio Timm, do TozziniFreire, Justiça deve observar e resguardar interesse da população no tema
Fecha de publicación: 19/08/2019

Existe um desejo da população brasileira em uma redução na forma como o Estado intervém na economia, e isso deve ser observado e resguardado pelo Poder Judiciário, que está pronto para lidar com as mudanças previstas na medida provisória de Liberdade Econômica cujo texto seguiu para o Senado na semana passada, após aprovação na Câmara dos Deputados, avalia Claudio Timm, do TozziniFreire Advogados. 

Sócio em Contratos e Projetos Governamentais, Timm é mestre em Direito do Mercado de Capitais e Regulação Financeira pela Georgetown University (EUA) e especialista em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas. 

Qual a principal mudança que a MP da liberdade econômica traz para a forma de fazer negócios no Brasil?

Em minha opinião, a principal mudança que a MP traz para a forma de fazer negócios no País é a preocupação que permeia todo o texto de desburocratizar a atividade empresarial, especialmente aquela considerada de baixo risco, com a redução da intervenção do Estado na economia, inclusive com a exigência de análise de impacto regulatório (AIR) para a edição e alteração de atos normativos por órgãos públicos federais, e com estímulos ao empreendedorismo e à inovação.

A MP pretende atender um desejo muito grande e antigo da população brasileira em geral e do setor produtivo em especial de desburocratização, de menor intervenção estatal no dia a dia dos empreendedores.

Qual o principal impacto para a atuação de advogados na sua área?

Atuo em várias do Direito, como Direito Administrativo, Contratual, Financeiro, Societário, Regulatório e Relações Governamentais, e várias dessas áreas são beneficiadas pela MP.

São muito louváveis as alterações trazidas pela MP para limitação dos atos públicos de liberação da atividade econômica, como licenças, autorizações, alvarás, que deverão ser concedidos no prazo máximo informado ao particular quando ele apresentar o pedido com todos os elementos necessários à instrução do processo, sob pena de o silêncio da autoridade importar em aprovação tácita. Vale mencionar também a possiblidade de desenvolver atividade econômica de baixo risco, a ser classificada por ato do Poder Executivo federal, sem a necessidade de atos públicos de liberação. Também é muito importante a adoção ampla de documentos digitais, a permissão de sociedades limitadas unipessoais e o fortalecimento das empresas individuais de responsabilidade limitada, as EIRELIs.

Além disso, a exigência de análise de impacto regulatório (AIR) por órgãos públicos federais que forem editar ou alterar atos normativos deverá trazer uma regulação de melhor qualidade e eficiência para diversos setores regulados da economia, após a edição do regulamento previsto pela MP e à medida que os entes reguladores federais adquirirem prática com a AIR.

Outro avanço importante, especialmente para a regulação do mercado financeiro, foram as alterações introduzidas no Código Civil sobre fundos de investimentos, especialmente a possibilidade de a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) limitar (i) a responsabilidade dos cotistas de um fundo ao valor de suas cotas, e (ii) a responsabilidade dos prestadores de serviços fiduciários ao fundo, perante o fundo e entre si, ao cumprimento dos deveres particulares de cada um dos prestadores, sem solidariedade entre eles.

Você tem alguma crítica ou ressalva ao texto final da MP?

Como o Projeto de Lei de Conversão (PLV) nº 17/2019, em substituição ao texto original da MP, ainda está sujeito à deliberação pelo Plenário do Senado Federal, pode ser que haja alterações no texto pelo Congresso Nacional. De qualquer forma, há um núcleo do texto original da MP que foi mantido pela Comissão Mista do Congresso Nacional e pelo Plenário da Câmara dos Deputados e que deve ser preservado pelo Plenário do Senado e na fase de sanção presidencial.

Uma crítica que entendo que pode ser feita a esse núcleo da MP é quanto ao aspecto formal, pois a MP, numa primeira parte, traz diversos princípios e direitos gerais, dando-lhes o pomposo nome de Declaração de Direitos da Liberdade Econômica, com várias referências cruzadas, de difícil entendimento para a população em geral, e, numa segunda parte, altera dispositivos de várias leis, como que uma "árvore de Natal".

Entendo que essa formatação da MP não observou a melhor técnica legislativa, estimulou os legisladores a incluírem muitos pontos novos no texto original da MP, criando sérias preocupações a diversos setores durante sua tramitação no Congresso, e pode propiciar questionamentos judiciais.

Há algum aspecto que deve gerar questionamentos na Justiça?

Como comentei na resposta à pergunta anterior, aspectos formais da MP podem gerar questionamentos judiciais. Além disso, o cumprimento dos requisitos constitucionais para a edição de medidas provisórias – relevância e urgência – estão sendo questionadas em ação direta de constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.

No aspecto material, há vários conceitos abertos na MP que podem gerar dúvidas na sua interpretação e aplicação, como as hipóteses de abuso de poder regulatório, possivelmente levando a ações judiciais.

Por outro lado, também há dispositivos na MP expressamente voltados à redução de questionamentos, como a previsão de edição de súmulas da administração tributária federal, voltadas à uniformização de atos administrativos, normativos e decisórios por órgãos tributários federais.

Em sua visão, o Judiciário está pronto para permitir uma menor intervenção do Estado na atividade econômica? 

Na minha visão, o Poder Judiciário está, sim, pronto para permitir uma menor intervenção estatal na economia. Como eu disse, há esse desejo na população brasileira em geral e o Judiciário tende a observá-lo e resguardá-lo. Além disso, há várias teorias e conceitos legais que podem ser usadas pelo Judiciário como fundamento para as alterações que estão sendo trazidas pela MP em nível normativo.

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