Liberdade econômica terá "impacto significativo" em direito contratual e societário

Crédito: Divulgação
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Para Luiz Filipe Couto Dutra, limites à autonomia da vontade das partes ficaram menos subjetivos
Fecha de publicación: 14/08/2019

A MP da Liberdade Econômica deve provocar forte dinamismo na atuação de advogados das áreas de direito contratual e societário uma vez que as partes devem ter mais autonomia na definição de regras, que estarão menos sujeitas à interpretação de um juiz, avalia Luiz Filipe Couto Dutra, em entrevista ao LexLatin. 

Sócio da área de Societário do escritório Gico, Hadmann & Dutra Advogados, ele é professor de Direito dos Contratos e Litígios Contratuais da pós-graduação lato senso do Centro Universitário UniCeub, em Brasília. 

Qual a principal mudança que a MP da liberdade econômica traz para a forma de fazer negócios no Brasil?

A MP da Liberdade Econômica tem como objetivos (i) aumentar a segurança jurídica nas relações empresariais, especialmente por meio da criação de normas de interpretação da legislação; (ii) adequar a legislação infraconstitucional aos princípios constitucionais da livre iniciativa e ao livre exercício da atividade econômica, por meio da simplificação e desburocratização de processos de obtenção de licenças, alvarás e autorizações de funcionamento; e, ainda, (iii) reduzir os custos de transação para abertura de empresas no país e realização de investimentos em inovação. 

O texto original da MP 881 tinha pleno foco na declaração dos princípios a serem adotados pelo Estado, em especial pelos Poderes Executivo e Judiciário, para intervirem de forma mínima e excepcional nas relações privadas o que, por si só, já é capaz de melhorar o ambiente de negócios no Brasil, uma vez que as partes contratantes passam a ter mais confiança na manutenção do efetivamente acordado entre si e se preocupam menos com as possíveis interpretações que os órgãos públicos ou judiciais eventualmente teriam acerca do ajustado. 

Qual o principal impacto para a atuação de advogados na sua área?

Se o texto for efetivamente aprovado em sua íntegra pelo Congresso Nacional (ainda falta a aprovação no Senado), o impacto será bastante significativo para os advogados das áreas de Direito Contratual e Societário. 

Alguns limites à autonomia da vontade das partes, como o princípio da função social dos contratos, ficaram menos subjetivos já que devem ser aplicados apenas de forma excepcional. 

As partes contratantes ganham mais autonomia para criar suas próprias regras de interpretação dos contratos e alocação de riscos. Assim, toda a lógica do contract design pode mudar, já que o advogado poderá se preocupar menos com as possíveis interpretações de um juiz e mais com o efetivamente intentado entre as partes. Os considerandos do contrato ganham ainda mais peso na elaboração dos contratos.

Você tem alguma ressalva ao texto final da MP? 

A MP foi objeto de diversas críticas desde a sua edição. A mais evidente é a possível inconstitucionalidade por vício de forma, já que Medidas Provisórias devem ter por objeto temas que necessitam ser aprovados com urgência.

Para o governo, a edição dessas regras por meio de uma MP se justifica em razão do elevado número de desempregados no país e a necessidade urgente de criar um ambiente favorável para a abertura de empresas e, por conseguinte, de postos de trabalho. 

O eventual vício formal será decidido pelo STF em breve, já que o PDT ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN nº 6.156) questionando justamente esse possível vício. 

Não é possível saber, pelo menos por enquanto, como ficará o texto final já que o texto aprovado pela Câmara foi apenas o texto-base da MP. Hoje ainda serão votados os destaques. Essa estratégia foi adotada pelo relator do projeto, em conjunto com os líderes do governo, para tentar facilitar a aprovação de alguns pontos menos controversos e que acabariam correndo o risco de não serem aprovados em decorrência da existência de pontos que geraram divergência entre governo e oposição. 

Há algum aspecto que deve gerar questionamentos na Justiça?

Os pontos mais controversos, como alguns que se referiam às normas trabalhistas, foram retirados do texto para facilitar a aprovação no Congresso. 

Outros pontos que revelavam uma atecnia jurídica na redação da MP, como a que previa que a CVM poderia, por meio de norma infralegal, dispensar o cumprimento de exigências previstas em lei para facilitar o acesso de ME e EPP ao mercado de capitais, também foram retirados do texto-base justamente para impedir questionamentos judiciais. 

Com a redução e simplificação do texto decorrente da Emenda Aglutinativa apresentada pelo relator, o projeto está menos exposto a questionamentos judiciais. Mas somente será possível saber como vai ficar o texto efetivamente final após a aprovação dos destaques pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.


O Judiciário está pronto para permitir uma menor intervenção do Estado na atividade econômica? Se não, o que é preciso mudar?

O Judiciário se acostumou a ser a mão do Estado na economia. Apesar da Constituição Federal dispor, dentre os seus princípios e fundamentos, sobre a livre iniciativa e a liberdade econômica, rotineiramente vimos decisões judiciais ignorarem o que foi negociado, precificado e contratado pelas partes. 

O texto original da MP e o texto-base aprovado pela Câmara dos Deputados não trazem tanta inovação para o mundo jurídico. Na verdade, em grande parte, apenas direcionam como devem ser interpretadas as cláusulas contratuais e como deve o Estado agir sem transferir o custo de sua ineficiência para o particular. 

O Judiciário deve tomar o cuidado de saber aplicar os princípios constitucionais e a declaração dos direitos de liberdade econômica é um norte a ser seguido.

 

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