Vincular súmulas do Carf à Receita seria boa alternativa a comitê de super súmulas

Leandro Cabral - Crédito Divulgação
Leandro Cabral - Crédito Divulgação
Para Leandro Cabral, do Velloza Advogados, é preciso manter a paridade com contribuinte nas decisões
Fecha de publicación: 13/11/2019
Etiquetas: Carf, super súmula

Uma alternativa ao chamado comitê de super súmulas, criado pela Lei de Liberdade Econômica, seria vincular as súmulas produzidas pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) também à atuação da Receita Federal, avaliou o advogado Leandro Cabral ao LexLatin.

Ele sugere a inclusão de um representante da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) na deliberação das súmulas do Carf, além de mais um contribuinte, para que a paridade seja mantida. 

Sócio de tributário do Velloza Advogados, ele é formado em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC) e em ciências contábeis pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP). Possui especialização em direito tributário também pela PUC-SP. 

 

O Carf editou 33 súmulas em setembro, enquanto tramitava no Congresso a lei de Liberdade Econômica e seu comitê de super súmulas. Como vê estes entendimentos consolidados pelo Carf? Destaca algum como mais importante ou controverso?

A edição de Súmulas pelo Carf está prevista no artigo 72 do seu Regimento Interno e ocorre anualmente. A finalidade é vincular o entendimento de todas as câmaras do Carf. As súmulas também podem se tornar vinculantes para a Receita Federal, por determinação do ministro da Economia. Podem levar tal proposta ao ministro o presidente do Carf, o procurador-geral da Fazenda Nacional, o secretário da Receita Federal ou presidentes de confederações de categorias econômicas ou profissionais habilitadas a indicar conselheiros.

Cada Súmula aprovada tem relevância e impacto direto nas matérias de que trata. Em relação às aprovadas em 2019, destaco a Súmula 139: “Os descontos e abatimentos, concedidos por instituição financeira na renegociação de créditos com seus clientes, constituem despesas operacionais dedutíveis do lucro real e da base de cálculo da CSLL, não se aplicando a essa circunstância as disposições dos artigos 9º a 12 da Lei nº 9.430/1996.”

É uma súmula importante porque coloca um ponto final em uma discussão que se alonga há anos no Carf e, a partir de agora, poderá ser definida rapidamente. O entendimento confirma uma tese de defesa dos contribuintes. Até o momento, a súmula não se tornou vinculante para a Receita, apenas para o Carf.

O que podemos esperar da atuação do comitê de super súmulas no Ministério da Economia após a aprovação da lei e a retirada das nomeações pelo ministério? Quais são os potenciais riscos e benefícios da atuação do comitê?

Os pronunciamentos do comitê dependerão, principalmente, de sua composição. Caso ele seja formado, exclusivamente, por representantes do fisco federal (Receita Federal, Presidente do Carf e PGFN), a tendência é de que as súmulas reflitam o entendimento fiscal de forma preponderante.

O Ministério da Economia chegou a criar o comitê de súmulas por meio da Portaria 531, de 30 de setembro de 2019, composto pelo presidente do Carf, secretário especial da Receita Federal e um procurador-geral da Fazenda Nacional, integrantes dos quadros de servidores do Fisco federal. Após uma série de críticas, a criação do comitê foi revogada.

O aspecto negativo do comitê, seguindo essa formação, é a perda da paridade entre representantes do Fisco e dos contribuintes na avaliação e votação – paridade que se verifica na edição das súmulas do Carf. Uma alternativa às súmulas do comitê seria tornar as súmulas do Carf vinculantes também à Receita Federal, mantida a sistemática atual de deliberação, ou incluindo representante da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e de mais um conselheiro representante dos contribuintes, para manter a paridade.

Qual sua avaliação sobre o grupo de trabalho criado pelo Ministério da Economia para elaborar propostas de reforma tributária enquanto tramitam três PECs no Congresso, duas delas em estágio avançado? O sr. acredita que este grupo levará em conta os entendimentos do comitê de super súmulas para atualizar a legislação?

Avalio de forma positiva o grupo de trabalho, por sua heterogeneidade, conhecimento e experiência técnica e prática acerca dos temas objeto das propostas em discussão. Não vejo influência do comitê sobre o grupo de trabalho, pelo fato de o escopo de atuação do grupo envolver alterações legislativas com efeitos prospectivos – não dependentes ou vinculados, necessariamente, ao entendimento desse comitê.

Como conciliar a necessidade de reforma tributária para reduzir custos e elevar a competitividade nacional diante da crise fiscal que exige arrecadação maior para honrar a dívida?

A questão é complexa e demanda uma análise de diversos aspectos. Um primeiro ponto importante é a carga tributária atual. Além de ser considerada elevada, tão relevante ou mais é a dificuldade de se compreender e gerir a apuração de tributos no Brasil, muito em função das diferentes sistemáticas e regras existentes em cada um dos níveis de governo: federal, estadual e municipal. Podemos afirmar que a dificuldade em conhecer, entender e cumprir cada uma das diversas legislações motiva grande parte da sensação da alta carga tributária. Logo, simplificar é o primeiro passo.

O segundo ponto relevante é a chamada tributação indireta, pela qual a carga é repassada entre as pessoas que realizam operações – desde o produtor até o consumidor final, que paga a maior parte do custo tributário da cadeia. Isso implica, por exemplo, em tributar com a mesma carga contribuintes com diferentes capacidades contributivas (rico ou pobre), podendo agravar a desigualdade social, entre outros efeitos perversos. 

Para mitigar tal impacto, existe o método da não-cumulatividade de tributos como ICMS, IPI e PIS-Cofins, permitindo que o tributo recolhido numa etapa seja deduzido do tributo devido em operação subsequente, evitando-se o chamado "efeito cascata" (tributo pago sobre valores e operações já tributados). Entretanto, tal método não é uniforme entre os diferentes tributos a ele sujeitos, com destaque ao PIS-Cofins, cuja apuração na sistemática não-cumulativa é extremamente complexa e, por isso também, muito discutida no contencioso administrativo e judicial. 

Além da necessidade de simplificação, a tributação indireta demanda um alinhamento entre os entes federativos, notadamente federal e estadual, de modo a reduzir o custo tributário que eleva bastante o preço dos produtos comercializados no Brasil, prejudicando inclusive sua competitividade com produtos importados. Não se trata de reduzir alíquotas ou base de cálculo desses tributos apenas, mas racionalizar sua apuração, inclusive considerando que uma mesma operação sofre várias incidências a um só tempo.

Um terceiro aspecto relevante sobre reforma tributária é a regra constitucional do pacto federativo, notadamente quanto à necessária autonomia financeira e econômica dos Poderes nas três esferas de governo. Prefeituras, governos estaduais e o governo federal têm de ter a autonomia de receber o pagamento de tributos e aplicar o resultado da arrecadação na gestão da máquina pública e dos serviços públicos, não podendo ser dependentes de recursos de outro ente. Muito se discute se a proposta de reforma tributária que concentra a gestão da arrecadação nacional num órgão central, para posterior repasse aos respectivos entes, respeitaria o pacto federativo. Aqui, a principal questão é o condicionamento desse repasse a regras impostas pelo Governo Federal, a exemplo da quitação de dívidas por Estados e municípios frente à União, retirando a necessária autonomia entre os entes federativos. 

Qual a sua avaliação sobre a recriação da CPMF? E sobre a proposta de desoneração da folha de pagamento em conjunto com a retomada da contribuição?

 O contexto histórico e político da extinção da CPMF indica ser remota a chance de aprovação de recriação dessa contribuição, mesmo se considerando a proposta de desoneração da folha de pagamento. No período em que existiu, a CPMF foi muito criticada e o próprio Congresso aprovou uma lei extinguindo a contribuição. Recentemente, propostas de recriá-la também forma alvo de críticas. Embora a CPMF seja um tributo com gestão e arrecadação bastante simplificadas, já que a retenção fica a cargo das instituições financeiras, uma crítica importante é seu efeito regressivo. Ao não seguir o princípio da capacidade contributiva, ela acaba onerando mais as classes de baixa renda.

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