Brasil chega a 300 mil mortos e OAB pede que PGR denuncie Bolsonaro ao Supremo

​​​​​​​Especialistas avaliam a conduta de Bolsonaro e do ex-ministro Pazuello e o que diz a lei brasileira e internacional/Fotos Públicas
​​​​​​​Especialistas avaliam a conduta de Bolsonaro e do ex-ministro Pazuello e o que diz a lei brasileira e internacional/Fotos Públicas
Também nesta quarta-feira (24) ministro Lewandowski, do STF, enviou à primeira instância inquérito que trata de omissão do ex-ministro Pazuello na crise do Amazonas.
Fecha de publicación: 24/03/2021

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Na semana em que o Brasil chega a 300 mil mortes por Covid-19, a OAB Nacional protocolou uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Jair Bolsonaro. A entidade pede o oferecimento de denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que ele seja processado criminalmente diante de transgressões ao Código Penal ao longo da pandemia.

Considerando a atribuição da PGR como titular da ação penal pública, a Ordem requer a adoção de providências junto à Suprema Corte por entender que o presidente da República deve responder pelos crimes comuns previstos nos artigos 132 (Perigo para a vida ou saúde de outrem), 268 (Infração de medida sanitária preventiva), 315 (Emprego irregular de verbas ou rendas públicas) e 319 (Prevaricação), todos do Código Penal.


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No documento, a OAB critica o fato de o governo federal indicar a hidroxicloroquina como medicamento preventivo contra a Covid-19 e o uso de recursos públicos para a compra do medicamento. “Para além da completa ausência de comprovação da eficácia da hidroxicloroquina no tratamento da Covid e da existência de indícios de seus nefastos efeitos colaterais - o que por si só configura grave crime -, a defesa de sua utilização pelo governo federal tem custado valores astronômicos aos cofres públicos”, diz a denúncia.

A OAB também destacou a morosidade do governo federal em adquirir vacinas contra o coronavírus. “Os elementos do tipo penal que previstos ao teor do art. 319 do Código Penal, consubstanciados em ‘Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal’, podem ser verificados ante a péssima gestão na compra das vacinas em virtude de atritos e divergências político-ideológicas, em prejuízo da saúde e da vida de todos os brasileiros”, aponta o documento.

A negativa de respeitar as medidas de isolamento social do presidente da República também é levantada pela denúncia. “Os efeitos dessas condutas do Representado agravam sobremaneira os danos sociais da sua ação criminosa, pois contrariam orientações da OMS e do próprio Ministério da Saúde. Distanciamento social salva vidas. Desse modo, não se pode negar que o modelo legal do art. 268 do Código Penal (“Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”) esteja presente em sua inteireza e de forma a multiplicar significativamente os prejuízos causados pela Covid-19”.

Para o professor da Faculdade de Direito da USP, David Teixeira de Azevedo, especialista em direito penal, existe nessa denúncia dois aspectos: o político, que tem relação com os pedidos de impeachment na Câmara dos Deputados, em que “há o substrato jurídico, mas a decisão é de natureza política”, e o criminal, a questão da prática do crime comum.


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“Tanto num quanto noutro acho difícil o enquadramento do presidente. Com relação ao processo de impeachment, ainda que seja uma tipificação mais aberta dessas hipóteses todas de impedimento, você encontra no artigo 7º atentar contra as liberdade aos direitos individuais. E aí você pode encaixar direito à vida e à saúde. Sob o ponto de vista jurídico, jogar sob os ombros do presidente e do Executivo, apesar das declarações sempre infelizes do presidente, dificilmente conseguirá jogar nas costas dele os 300 mil mortos ou um aumento da pandemia. Nós tivemos esse fenômeno no mundo inteiro”, analisa o professor, que acredita que politicamente pode haver um movimento nesse sentido.

Outra questão tem relação com as denúncias feitas no Tribunal Penal Internacional. Em julho do ano passado, uma coalização de entidades sindicais dos profissionais da saúde protocolou representação criminal contra o presidente perante o Tribunal Penal Internacional (TPI).

Segundo a denúncia, naquela época já havia um histórico de declarações e medidas administrativas e legais do presidente que seriam contrárias às orientações básicas e consensuais no âmbito internacional para evitar a disseminação da Covid-19, fatos que, em tese, e segundo a argumentação desenvolvida, poderiam configurar crimes de genocídio e contra a humanidade.

José Augusto Fontoura Costa, chefe do departamento de direito internacional da Faculdade de Direito da USP, acredita que essa situação não se enquadra na acusação. “Em princípio quando observamos os horrorosos números da pandemia perguntamos se faz sentido falar de um genocídio contra o povo brasileiro. Me parece que não seria o caso. O que tenho visto ser alegado, e nisso me parece ter uma certa racionalidade, é que essas mortes têm uma distribuição desigual em razão de fatores étnicos e regionais. Haveria, por exemplo, populações indígenas que teriam sofrido consequências mais significativas em razão da Covid, que existe um desvio significativo contra a população negra. Seria possível buscar a caracterização do genocídio a partir da atribuição a um determinado grupo, mas me parece bastante difícil buscar uma especificidade do dolo (intenção) nesse sentido”, avalia. 

Leia a representação da OAB junto à PGR 

Inquérito contra Pazuello é enviado para Justiça Federal de Brasília

Desde que Eduardo Pazuello saiu do Ministério da Saúde ele perdeu prerrogativa de foro no STF. Por causa disso, o ministro Ricardo Lewandowski determinou o envio do Inquérito 4862, que investiga conduta criminosa em relação ao colapso da saúde pública em Manaus (AM), a uma das varas criminais do Judiciário Federal de Brasília.

O inquérito foi aberto a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, para investigar se Pazuello agiu com rapidez e da forma correta para evitar a calamidade pública no Amazonas. Se for comprovada a falta de ação do ministro e a conduta omissiva, ele poderá  ser responsabilizado nos níveis cível, administrativo e criminal.

Veja o despacho do ministro.


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