Gastos com home office fazem parte da remuneração do trabalhor?

Utilidades concedidas pela empresa para viabilizar a prestação do trabalho remoto não possuem natureza remuneratória, o que afasta a incidência de encargos e tributos/Pixabay
Utilidades concedidas pela empresa para viabilizar a prestação do trabalho remoto não possuem natureza remuneratória, o que afasta a incidência de encargos e tributos/Pixabay
Especialista analisa as questões jurídicas das despesas feitas pela empresa com as ferramentas necessárias ao trabalho remoto.
Fecha de publicación: 22/10/2020

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De acordo com dados do IBGE, aproximadamente 8 milhões de pessoas estão trabalhando remotamente em virtude da pandemia do coronavírus. Eventual resistência ao modelo foi superada pela necessidade, sendo que já há quem defenda que o trabalho remoto veio para ficar.

A impossibilidade de uma implementação planejada do trabalho remoto obrigou que muitas empresas adotassem medidas necessárias à sua viabilização, tais quais: o custeio de eventual incremento nas despesas do trabalhador com telefonia e internet, a aquisição de mobiliário adequado (cadeira, mesa, luminária e etc.) para o exercício das atividades, a realização de reuniões virtuais periódicas e até o monitoramento da saúde mental dos trabalhadores.

Nesse contexto, há dúvidas quanto à natureza jurídica dos gastos incorridos pela empresa com as ferramentas necessárias ao trabalho remoto. Deveriam – ou não – integrar a remuneração dos trabalhadores para fins fiscais, trabalhistas e previdenciários? A pergunta é extremamente relevante, considerando os elevados encargos incidentes sobre a remuneração.

A Lei nº 13.467/17 (conhecida como a “Reforma Trabalhista”) regulamentou o trabalho remoto e estabeleceu, no artigo 75-D, que “as disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito”, e que “as utilidades mencionadas no caput deste artigo não integram a remuneração do empregado”.

Conforme se verifica, a norma é bastante clara ao dispor que as utilidades concedidas pela empresa para viabilizar a prestação do trabalho remoto não possuem natureza remuneratória (o que afasta a incidência de encargos e tributos), bem como que os termos e condições para a sua concessão deve ser objeto de contrato escrito.

As duas diretrizes legais nos parecem acertadas. Isso porque, em relação à natureza dos gastos incorridos pela empresa, efetivamente não se prestam a retribuir o trabalho. E, no que diz respeito à necessidade de formalização dos termos e condições para a manutenção e o fornecimento das ferramentas necessárias ao trabalho remoto, nos parece servir como prova da real finalidade do benefício concedido pela empresa (não configurando a concessão de remuneração disfarçada), evitando assim o seu desvirtuamento pelas partes.

É verdade que a Medida Provisória nº 927/2020 havia dispensado a empresa de formalizar a mudança do regime de trabalho (para remoto) quando decorrente da pandemia, mas a perda da sua eficácia fez restabelecer o disposto na Lei nº 13.467/17.

Dessa forma, a recomendação (para evitar questionamentos e autuações por parte dos órgãos fiscalizadores) é a de que a empresa formalize uma política (individual ou coletiva) relacionada à concessão de recursos, materiais ou equipamentos destinados à viabilização do trabalho remoto, com clara indicação da sua finalidade, seus beneficiários, os valores envolvidos e sua periodicidade.

Vale destacar que o raciocínio aqui exposto se aplica a todo e qualquer benefício concedido pela empresa ao seu trabalhador, quando configurar uma ferramenta indispensável para o trabalho (por exemplo: uniforme, equipamento de proteção individual, residência para expatriados temporariamente no país, concessão de veículo para trabalhadores cuja função demanda constante deslocamento, entre outros).

Às ferramentas concedidas pela empresa o mercado e a jurisprudência atribuíram a denominação de “ajuda de custo”, a qual também foi considerada pela Lei nº 13.467/17 como uma verba desprovida de caráter remuneratório, como está previsto no artigo 457: “As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, (...) não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário”.

Apesar de não haver qualquer determinação na lei quanto à formalização da concessão da ajuda de custo, a recomendação citada se mantém porque não são raros os casos de questionamento e autuação por parte da Receita Federal do Brasil, conforme atesta o trecho de uma decisão proferida pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – Carf a respeito do tema: “Integram o salário de contribuição a "ajuda de custo" e "diárias" pagas aos segurados empregados quando não fica demonstrado que os pagamentos destinam-se a ressarcir despesas inerentes à execução do trabalho”. (Processo nº 10980.009549/2007-10; Acórdão nº 2401-006.893; Sessão de 10 de setembro de 2019).

Nos parece que é plenamente sustentável o não recolhimento de encargos e tributos sobre os gastos incorridos pela empresa com a concessão das ferramentas (“ajudas de custo”) necessárias ao trabalho remoto, desde que seja possível comprovar documentalmente a sua finalidade.

*Caio A. Taniguchi Marques é sócio da área previdenciária do escritório TSA Advogados.

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