Os 10 desafios de Biden para imigração e viagens aos EUA

Desfazer medidas e ordens executivas demandará muito apoio e cooperação do Congresso e Senado americano/Fotos Públicas
Desfazer medidas e ordens executivas demandará muito apoio e cooperação do Congresso e Senado americano/Fotos Públicas
Ao novo presidente caberá a difícil tarefa de governar um país dividido e polarizado politicamente.
Fecha de publicación: 20/01/2021

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Esta quarta-feira será marcada pela posse de Joe Biden ao cargo político mais importante do mundo. Nunca antes uma disputa pela presidência americana foi tão acirrada e repleta de polêmicas e desdobramentos como a que vimos no final do ano passado e que continuou se arrastando este ano, com direito a desconfianças do sistema eleitoral, invasão do Capitólio e diversas restrições em mídias sociais. Para o bem ou para o mal, foi uma eleição que já entrou para a história.

Ao novo presidente, Joe Biden, caberá a difícil tarefa de governar um país dividido e polarizado politicamente. E se antes da eleição temas como política externa, meio ambiente e saúde pública já causariam polêmicas para qualquer mandatário americano, agora então serão focos principais tanto para quem defende quanto para quem ataca a nova administração democrata.

Entretanto, nenhum outro debate público durante o novo governo promete ser mais acalorado do que sobre as questões relacionadas a viagens internacionais e imigração nos Estados Unidos. Afinal, o então candidato Biden sempre “levantou a bandeira” de que iria desfazer as muitas políticas imigratórias que o governo de Donald Trump implementou nos últimos 4 anos, principalmente aquelas que restringiram o acesso de muitos estrangeiros no país com base em asilo, refúgio, ordens de banimento para determinadas nacionalidades e uma série de programas de vistos que atualmente encontram-se congelados no país.

A tarefa de Biden não será nada fácil. Desfazer medidas e ordens executivas demandará muito apoio e cooperação de um Congresso e Senado dividido entre democratas e republicanos e a tal reforma imigratória, que há décadas é cogitada nos Estados Unidos, está mais próxima de uma utopia do que da realidade.

Certamente, muitos desafios aguardam Joe Biden durante sua administração no quesito imigração e viagens para os EUA. Separamos os 10 principais: 

1. Reabertura de Fronteiras com países restritos pela pandemia: Desde maio de 2020, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) vetou a entrada de viajantes internacionais (com raras exceções) provenientes de países que concentram grandes focos da pandemia da Covid-19, entre eles o Brasil, China, Irã, Reino Unido e diversas outras nações europeias. Com a vitória de Biden, muitos esperavam que esta restrição seja revogada.

Entretanto, é preciso lembrar que a medida de fechamento de fronteiras foi tomada pelo CDC. Não se trata de uma decisão política ou de algo que possa ser modificado simplesmente por vontade do presidente. O recente aumento de casos da Covid-19 em todo o mundo e possibilidade de uma segunda onda da doença tornam ainda mais difícil acreditar que a nova administração vá reabrir suas fronteiras com estes países tão cedo (Nesta terça-feira Biden anunciou que vai manter as restrições de entrada no país para viajantes não americanos procedentes do Brasil e de grande parte da Europa, pouco depois de o presidente Donald Trump revogá-las). 

 

2. Mudar a percepção de que imigrantes não são bem-vindos nos EUA:  Uma das impressões causadas por Donald Trump, inclusive durante sua primeira campanha eleitoral, foi a de transmitir ao mundo a sensação de que o povo americano não quer a chegada de novos imigrantes nos EUA e que deseja que todos aqueles que estão ilegais deixem o país.  Ao assumir um tom em teoria mais conciliador, Biden terá o desafio de convencer ao mundo de que a América continua de braços abertos para estrangeiros que desejem contribuir de forma legal com o mercado de trabalho e com a economia americana.

Este deve ser o desafio mais facilmente vencido pelo novo governoos EUA são uma nação formada por imigrantes e que continua precisando e desejando talentos estrangeiros para se manter como a principal potência econômica e maior polo de inovações do planeta. 

 

3. Recuperação do Turismo Internacional:  A indústria do turismo representa cerca de 2,8% do PIB americano e está entre as mais importantes e lucrativas do país. Somando-se turistas internos e internacionais, aproximadamente 77 milhões de pessoas visitam os EUA anualmente. Entretanto, com a chegada da pandemia da Covid-19 em 2020 todos os indicadores de turismo caíram vertiginosamente, gerando grave prejuízo e demissões em praticamente toda a indústria do turismo no país.

Para se ter uma ideia, em 2019 o turismo gerou US$ 712 bilhões, enquanto em 2020, devido à pandemia, este número diminuiu para US$ 396,37 bilhões, uma queda de 42.1%. O governo Biden sabe que precisa recuperar o lucro gerado pelo turismo, assim como os empregos perdidos durante o ano passado, e para isso terá não somente que implementar e reforçar medidas sanitárias, como as que já estão em prática nos parques da Flórida, mas também conseguir, eventualmente, reabrir as fronteiras americanas para países que tradicionalmente gastam muito dinheiro com turismo nos EUA, como o Brasil e a China. 

 

4. Investir em tecnologia e não em muros: Uma das grandes promessas não cumpridas pelo governo Trump foi a criação do polêmico muro entre os EUA e o México. De fato, este que era um dos pilares da campanha dos republicanos em 2016 provou ser uma “obra faraônica” que, mesmo se totalmente construído, não resolveria o problema da entrada de imigrantes ilegais no país.

Publicamente contrário ao muro, o então candidato Joe Biden prometeu investir em tecnologia (incluindo câmeras, drones, serviços de reconhecimento facial, etc.), para resolver os problemas da entrada de ilegais pelas fronteiras. Entretanto, para desembolsar equipamentos de vigilância que permitam patrulhar os 3.141 quilômetros de extensão terrestre que separam os EUA do México, o presidente democrata terá a difícil tarefa de convencer o Congresso americano a desembolsar cerca de US$ 15 bilhões, uma quantia que é “apenas” um pouco menor do que a estimada para a construção do Muro de Trump: US$ 21,6 bilhões. 

 

5. Atrair mais imigrantes com alta capacidade profissional e intelectual: Este é um ponto em que tanto republicanos quanto democratas sempre concordaram. Os Estados Unidos precisam cada vez mais de imigrantes qualificados por suas carreiras de sucesso e formações acadêmicas avançadas. Existem muitas profissões escassas nos EUA, especialmente aquelas que exigem conhecimento técnico e experiência, como engenheiros, profissionais de TI, pilotos de avião, médicos, dentistas, enfermeiros, fisioterapeutas e muitas outras.

Como não encontra um número suficiente de profissionais dentro do país que possam atender a demanda para estas profissões, os EUA precisam recorrer a talentos de outros países e para isso foram criados diversos programas de vistos de imigrante que concedem green cards para profissionais estrangeiros. 

Mesmo assim, ainda existem mais vagas de trabalho abertas do que pessoas qualificadas para ocupa-las e para mudar esse quadro o governo Biden precisará convencer o Departamento de Segurança Interna (DHS) de que é preciso aumentar o número de green cards e dar absoluta preferência para a chegada de profissionais estrangeiros qualificados no país, ao invés da preferência atual que é para parentes diretos ou cônjuges de cidadãos americanos. 

 

6. Aprovar a polêmica concessão de cidadania para 11 milhões de ilegais:  De todas as propostas de Joe Biden enquanto candidato esta é sem dúvida a mais controversa. O novo mandatário americano deseja “perdoar” cerca de 11 milhões de imigrantes que se encontram atualmente indocumentados nos EUA e conceder a eles o direito a cidadania americana.

Mais uma vez, Biden precisará de muito apoio do Congresso e do Senado para levar esta ideia adiante. Além de ser uma dura batalha jurídica, a concessão de cidadania com este tipo de circunstância certamente abriria muitos precedentes perigosos na lei de imigração e naturalização dos Estados Unidos. Por isso, muitos especialistas afirmam que esta promessa de campanha foi feita apenas para angariar votos da comunidade de imigrantes ilegais para a candidatura do democrata. 

 

7. Suspender restrições aos vistos de trabalho temporário: Entre os principais programas de vistos para trabalho não imigrante que foram congelados pelo governo Trump, estão o H1-B, H-2B, H-4, e o L-1. Tratam-se de vistos que por muitos anos permitiram a chegada de profissionais estrangeiros sob contrato de trabalho temporário para exercerem suas atividades em empresas sediadas nos Estados Unidos.

O congelamento destes vistos foi aprovado diante da política “America First” adotada por Trump para dar preferência a contratação de trabalhadores americanos no mercado de trabalho dos EUA. Calcula-se que mais de 240 mil estrangeiros tenham deixado de ser contratados por empresas na América desde que a medida foi aprovada.

Tamanha restrição gerou revolta entre as grandes companhias americanas, especialmente aquelas que trabalham com tecnologia de ponta, segmento que sempre necessita de profissionais estrangeiros. Como os pedidos de suspensão desta medida não foram ouvidos durante o governo Trump, a expectativa é que a pressão agora recaia para o novo presidente. Tradicionalmente muitos brasileiros obtêm vistos de trabalho temporário e o fim do congelamento destes vistos certamente seria extremamente bem recebido por diversos profissionais do Brasil. 

 

8. Reestabelecer o Daca e fortalecer outros programas humanitários: Nos últimos quatro anos foram emitidas mais de 400 ordens executivas com o propósito de reduzir ou eliminar a entrada de diversos tipos de imigrantes ilegais ou indesejados no país. Entre elas destacam-se a tentativa de acabar com o programa “Dreamers”, criado para proteger filhos de imigrantes que entraram ilegalmente pela fronteira com o México, a suspensão temporária de determinados programas para refugiados, em especial para pessoas vindas de países muçulmanos, e o fim do Daca, programa que protege da deportação de cerca de 800 mil imigrantes que chegaram indocumentados ainda crianças nos EUA. 

Para reestabelecer estes e outros programas “humanitários”, Biden precisará negociar com um Congresso e um Senado divididos e, mesmo que tenha sucesso, algumas medidas precisarão de anos até que possam ser modificadas judicialmente. 

 

9. Voltar a atrair estudantes internacionais: Os Estados Unidos passaram mais de 30 anos como líderes absolutos em presença de estudantes estrangeiros, tanto para cursos de idioma quanto em universidades ou cursos de extensão. Entretanto, o século XXI tem apontado novas alternativas e preferências para quem deseja estudar no exterior. Especialmente com a globalização e maior acesso a mercados exteriores, aumentou consideravelmente a procura por cursos e intercâmbios em países com Nova Zelândia, Inglaterra, Suíça, Japão e Canadá.

Muitos destes países oferecem condições de estudo tão boas ou melhores que nos EUA, com a vantagem de, quase sempre, serem mais baratas e, em muitos casos, com uma facilidade maior para obter um visto de estudo do que o visto de estudante americano. A retomada da liderança dos Estados Unidos nesse campo também deve ser preocupação do novo presidente, já que muitos que vão aos EUA estudar acabam posteriormente ficando no país e, consequentemente, fazendo parte importante do mercado de trabalho americano. Em um mundo onde cada vez mais se valoriza o capital intelectual, a retenção de estudantes internacionais também deve ser considerada prioridade pelos novos mandatários do país. 

 

10. Lidar com deportações e separação de famílias detidas nas fronteiras: Algumas das cenas que mais receberam críticas nos EUA nos últimos quatro anos foram as dos centros de detenção da imigração americana localizados nas fronteiras entre os EUA e o México. Sob o programa de tolerância zero para imigração ilegal, o governo republicano começou a separar crianças de seus pais desde maio de 2018, a maioria delas fugindo da pobreza extrema e violência de seus países de origem.

Calcula-se que quase 3 mil crianças foram separadas de seus pais durante este período. Biden e o partido democrata sempre condenaram publicamente este tipo de política e acredita-se que farão de tudo para fornecer um atendimento mais “humano” para pessoas em situação de deportação ou famílias detidas nas fronteiras. Entretanto, é sempre bom recordar que durante os oito anos do governo Obama (2009-2016) foram deportados aproximadamente 3 milhões de pessoas. Um recorde histórico no país. 

*Felipe Alexandre é advogado da área de direito imigratório nos EUA e fundador da AG Immigration.

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