Ter ou não ter um programa de compliance?

Pior que um não-compliance será o mercado perceber que está lidando com uma fraude/Pixabay
Pior que um não-compliance será o mercado perceber que está lidando com uma fraude/Pixabay
Reputação pode ser perdida por conta de um escândalo que podia ser evitado e pela percepção de todos de que havia internamente uma cultura de falsa conformidade.
Fecha de publicación: 19/04/2021

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Ter ou não ter um programa de compliance não é mais uma questão. Não há empresa de médio ou grande porte no Brasil que possa prescindir de um programa de conformidade. Os clientes vão exigir isso, os bancos vão analisar o programa para a concessão de crédito, o mercado vai olhar desconfiado para quem não o tiver e, principalmente, a sociedade como um todo vai perguntar o motivo pelo qual o negócio não tem preocupação com o consumidor e o futuro do planeta. Compliance tornou-se necessário, simplesmente, para quem quer crescer e manter-se grande.

Obviamente ter um programa de conformidade requer investimento. Um programa bem construído demanda o conhecimento do ambiente de negócio, das características da empresa, de sua cultura corporativa e das pessoas que lhe trazem vida. Além disso, as ações de compliance não são construídas no ar, nem podem ser apenas mais uma série de documentos perdidos no meio da comunicação interna.


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A implantação efetiva de governança pressupõe a atribuição de responsabilidades por sua continuidade. Nem sempre haverá a necessidade de um setor específico, pois isso dependerá muito da natureza do negócio e porte da empresa, mas sempre existirão pessoas encarregadas de fazer do compliance mais um colaborador do dia a dia do empreendimento.

É comum ouvir dos propagandistas da conformidade: se pensam que o compliance é caro, então tentem o não-compliance. Evidentemente é uma questão de sorte ou azar cair nas malhas regulatórias. E certamente será muito azar acabar tendo o nome da empresa nas primeiras páginas dos jornais, não mais como um caso de sucesso, mas sim como o próximo escândalo de crimes do colarinho branco ou ambientais. Aí sim o não-compliance torna-se uma aposta caríssima e a questão que fica é se o empresário quer jogar esse jogo cujo resultado poderá ser o fim do próprio negócio – e eventualmente o camburão da polícia.

O compliance certamente demanda mais um custo para a empresa - não há como fugir disso, mas isso não quer dizer que não signifique lucro, uma vez que somente terão acesso a mercados sofisticados e de alto valor agregado quem tiver um programa sólido de conformidade e um histórico livre de escândalos. Cada vez mais bancos e governos exigem programas implantados de maneira efetiva para fazerem negócios.

Além disso, um programa de governança bem desenhado, construído para aquela empresa, naquele mercado e com os seus stakeholders não precisa ser caro. Dois princípios regem a construção desse programa: eficiência e economicidade. Ou seja, como atingir o programa mais eficiente da maneira mais econômica possível. Trata-se de duas funções que podem ser otimizadas com inteligência e arte.

A experiência demonstra que é a cultura da empresa um dos principais fatores a impactar o custo da implantação do programa. Uma empresa cuja alta administração demonstra cuidado ético na condução de suas atividades necessitará apenas de pequenos ajustes e da colocação desse cuidado de forma organizada e estruturada. A profundidade do ajuste será, portanto, pequena.

Por outro lado, a natureza do negócio determinará a extensão do compliance, pois cada empresa possui uma realidade própria de riscos regulatórios e reputacionais a serem enfrentados. Temos então duas dimensões, uma vertical, considerando a cultura da empresa, e outra horizontal, determinada pelos riscos. Construir um programa eficiente e econômico demanda construí-lo para que atenda essas especificidades.

Assim, uma empresa mineradora deve ter foco no compliance ambiental, bancos na conformidade com as leis contra a lavagem de ativos, fornecedores de bens e serviços para governos devem ser preocupar com a conformidade anticorrupção. Enfim, sem deixar de perceber que nenhuma empresa tem apenas um único foco de atenção em conformidade, o programa deve atentar para o “core” do negócio, normalmente onde estão os maiores riscos a serem enfrentados.

Enfim, pior que um não-compliance será um compliance de papel, uma conformidade aparente, “para inglês ver”, que dará a falsa sensação de cumprimento das obrigações, mas que será uma aposta arriscada contra a própria empresa. Se você acha o compliance caro, perceba que ele será um diferencial positivo do seu negócio.


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Mas entenda que pior que um não-compliance será o mercado perceber que está lidando com uma fraude. Reputação pode ser perdida de mais de uma maneira e perdê-la por conta de um escândalo que podia ser evitado e pela percepção de todos de que ainda por cima havia internamente uma cultura de falsa conformidade será pior. To comply or not to comply, that is not the question.

*Carlos Fernando dos Santos Lima é advogado especialista em compliance e procurador da República aposentado.

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