Uma amostra de reforma tributária possível: a dos combustíveis

No sistema do PLP 16 (monofásico), o ICMS é pago uma única vez, no primeiro elo da cadeia/Pixabay
No sistema do PLP 16 (monofásico), o ICMS é pago uma única vez, no primeiro elo da cadeia/Pixabay
Projeto de Lei Complementar promete trazer maior estabilidade ao preço de combustíveis e simplicidade e segurança a um setor que influencia todos os demais.
Fecha de publicación: 08/04/2021

Para receber nossa newsletter diária inscreva-se aqui!

Não bastassem as mazelas de uma longa crise sanitária que levou a economia do país para a lona, em fevereiro o fantasma de uma nova greve dos caminhoneiros assombrou a todos. No cerne da ameaça, a instabilidade dos preços dos combustíveis. A busca desesperada por causas e culpados gerou desde a interferência do governo federal em estatais até um aumento nas tensões entre União e Estados. Porém, no meio de tanto barulho, uma ideia excelente foi proposta: a reforma do sistema de cobrança do ICMS sobre combustíveis.


Leia mais: A nova Lei do Gás e os desafios tributários para o Brasil


Apresentado pela Presidência, o Projeto de Lei Complementar 16/2021 (PLP 16) confere maior estabilidade ao preço de combustíveis e simplicidade e segurança a um setor que influencia todos os demais.

No sistema atual (Substituição Tributária), o ICMS, devido a cada venda, é recolhido antecipadamente pela importadora ou refinaria usando como base um preço estimado a ser pago pelo consumidor. Os Estados alteram esses preços frequentemente, pegando todos de surpresa. Para piorar, o preço efetivamente praticado deveria ao final ser comparado com aquele usado na antecipação, gerando créditos ou débitos e contencioso.

No sistema do PLP 16 (monofásico), o ICMS é pago uma única vez, no primeiro elo da cadeia. Mudanças de valor devem aguardar 90 dias para ganharem eficácia. Não há necessidade de se aferir diferenças com os preços efetivos.

Contudo, mais importante que um avanço no ICMS, o PLP é uma chance de ouro de Brasília provar que uma reforma tributária é possível, pois ele gabarita todos os quesitos essenciais daquela.

Primeiro, porque se trata de um tema muito importante. Além de basicamente toda a população ser dependente do setor de combustíveis, a arrecadação dos Estados é significativamente a ele atrelada. Relevância a justificar atenção do Congresso.

Em segundo lugar, o PLP melhora o ambiente de negócios. Os players atuais querem a simplificação, que elimina custos de compliance e nivela a concorrência. Novos investidores buscam ambiente mais propício. Simplicidade sem aumento de carga.

Em terceiro lugar, não deve(ria) haver oposição pelas Administrações. O ICMS seguiria sendo destinado a região de consumo. Os Estados arrecadariam o mesmo e gastariam menos para fiscalizar e cobrar, sem perderem autonomia. Respeito aos entes federados e ausência de perda de arrecadação.

Quarto: juridicamente, não há obstáculo. Desde a Emenda Constitucional 33, de 2001, prevê-se autorização para que o ICMS seja como proposto. Há 20 anos, portanto, aguarda-se que o Congresso regule algo assim. As contribuições PIS e COFINS vivem há anos sob regime similar sem problema algum. Estabilidade e segurança jurídica.

Quinto: aprovar um projeto de lei complementar é muito mais fácil que uma proposta de emenda constitucional (PEC). E ele é compatível com as PECs de reforma. Na verdade, o PLP 16 tem resultados equivalentes aos de uma reforma ampla, mas escapa das críticas quanto à complexidade desta. Facilidade das discussões.

Por fim, há convergência de interesses. A população escapa das surpresas causadas pelo imposto. O setor ganha eficiência. Estados não perdem autonomia nem arrecadação e ainda economizam no custo da máquina. Mesmo o Judiciário seria poupado de demandas discutindo o sistema atual. Efetivo ganha-ganha.


Veja também: Como o aumento de 1000% do IRRF sobre leasing de aeronaves piora crise do setor aéreo


Como se observa, muito mais que acalmar os caminhoneiros, o PLP é o balão de ensaio perfeito para uma reforma eficaz, atendendo o clamor por simplicidade e segurança, sem mais carga. Nosso Congresso tem assim uma chance de ouro de sinalizar que, desta vez, uma reforma tributária é possível.

*Matheus Bueno é sócio de Bueno & Casto Tax Lawyers.

Add new comment

HTML Restringido

  • Allowed HTML tags: <a href hreflang> <em> <strong> <cite> <blockquote cite> <code> <ul type> <ol start type> <li> <dl> <dt> <dd> <h2 id> <h3 id> <h4 id> <h5 id> <h6 id>
  • Lines and paragraphs break automatically.
  • Web page addresses and email addresses turn into links automatically.