Integrar instrução probatória entre Carf e Judiciário aceleraria processos?

Presidente do Carf enxerga que proposta pode racionalizar atividade; para advogado, direito a produzir provas não pode ser limitado
Fecha de publicación: 18/03/2020
Etiquetas: Brasil

No sistema judicial que mais tem litígios a julgar no mundo, um processo que seja rápido e eficaz é uma demanda de todas as partes - e na área tributária não é diferente. Na parcela de casos que vêm da área tributária, uma alternativa para acelerar as discussões seria integrar os contenciosos administrativo e judicial, aproveitando laudos, provas e documentos que são formados, quando o caso ainda é tratado internamente na Receita Federal.

Em um trâmite comum, o contencioso administrativo conta com até três julgamentos: um dentro das delegacias da Receita Federal (DRJ), e duas instâncias dentro do Conselho Administrativos de Recursos Ficais (Carf) – uma que analisa a conformidade da cobrança com a legislação, e uma instância superiora que uniformiza entendimentos da casa.

Quando o contribuinte perde o julgamento nesta última instância, pode recorrer ao Judiciário da derrota - mas iniciando novamente o ciclo de produção probatória. A proposta de integração das esferas poderia acelerar a apreciação de tais casos em definitivo.

A presidente do Carf, Adriana Gomes Rêgo, é entusiasta da proposta: "pode-se, por exemplo, pensar no contencioso administrativo ser, necessariamente, integrado com o contencioso judicial, porque hoje o contribuinte sai daqui do Carf e inicia uma discussão do zero no juiz de primeiro grau, passando por TRF, STJ e eventualmente o STF", disse. "Por que não pegar esta instrução probatória daqui e já não se levar para um tribunal? Isso reduz tempo, etapas e racionaliza a atividade estatal."

A presidente do tribunal administrativo, que julga autuações feitas pela Receita Federal, argumenta que o país se encontra num momento de enxugamento de estrutura administrativa. Para ela, uma alternativa para reduzir este contencioso poderia ser que, ao ingressar com um recurso nas instâncias administrativa ou judiciária, o contribuinte tenha que escolher apenas por uma delas. 

"A Constituição fala que não se pode afastar do Judiciário, mas se poderia escolher, para economia do Estado e da estrutura administrativa, que a contribuinte fará uma opção [sobre qual esfera discutir o mérito da questão], e que tal opção é definitiva", afirmou a presidente do tribunal administrativo. A única exceção seriam os casos onde se discutem as matérias de caráter constitucional. 

O Carf tem, de acordo com seus dados mais recentes, cerca de 116.700 processos em seu acervo. Por ser um tribunal administrativo ligado ao ministério da Economia, estes casos não entram na conta dos 78.7 milhões de processos no acervo da Justiça comum. Isto não tira a importância do que se discute no Carf, uma vez que o acervo tem cobranças tributárias no valor de R$ 624 bilhões.

O valor somado das cobranças, de acordo com algumas fontes, poderia chegar a R$ 1 trilhão, se contabilizados os casos tributários que ainda estão em outras instâncias.

Questionada se conhece alguma discussão dessas propostas no poder Legislativo, a presidente do Carf afirmou desconhecer. As bases de projetos da Câmara dos Deputados não apresentam nenhum projeto com este tipo de discussão.

Proposta positiva, mas vista com reservas

O coordenador do contencioso tributário da Advocacia Lunardelli, Paulo Eduardo Mansin, elogiou o fato de que a proposta venha do poder público - o que seria um sinal de que a preocupação com um alto número de litígios não vem apenas das empresas e de seus representantes.

"É muito bom ver iniciativas, vindo do lado da Fazenda, no sentido de acelerar e melhorar nosso processo tributário. Que bom que a presidente do Carf esteja levantando esta bandeira", apontou o tributarista.

Mansin, que atua no Carf e no Judiciário, aponta porém que não há nenhum impedimento legal para que o contribuinte utilize as provas que foram produzidas no processo administrativo - e que o Judiciário é na verdade uma nova fase de produção de provas, onde documentos e laudos que não foram pedidos na instância administrativa podem ser requeridos. 

O motivo para isso é que o Carf não possui as regras rígidas do processo judicial. "Na maioria dos casos no Carf, nem sempre os contribuintes contratam advogados - o que pode causar uma defesa não tão técnica. Quando vai para a esfera judicial, aí sim se é obrigado a constituir advogado, e este advogado, ao ver o que veio da instância administrativa, pode notar falta de técnica, e a produção de prova a, b ou c", argumentou Mansin.

O tributarista discorda que a escolha por apenas uma via de solução seria mais complicada de ser aplicada na realidade legal do país. "Entendo a ideia, e não se deve mesmo descartar aquela prova que é importante. Mas há casos em que o próprio contribuinte representa [dentro do Carf], sem muito conhecimento técnico. Mas não deve se deixar de aplicar um melhor direito por optar na produção de provas e julgamento em uma determinada esfera, quando há este direito."

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