O divórcio litigioso entre Boeing e Embraer

Embraer
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Como fica a empresa brasileira sem o acordo e quais os caminhos que deverão ser seguidos.
Fecha de publicación: 27/04/2020
Etiquetas: Mercado Brasileiro

A Boeing e a Embraer não andam mais lado a lado. As duas que estão entre as maiores da aviação comercial no mundo rescindiram o contrato para a formação da joint venture composta pelas operações de aeronaves comerciais da Embraer e serviços associados (Boeing Brasil - Comercial), na qual a Boeing teria 80% de participação e a Embraer 20%.

 

Em um comunicado à imprensa, a Boeing disse que a Embraer não teria atendido às "condições necessárias", sem explicar que condições seriam. Pelo contrato, 24 de abril era a data inicial de rescisão.

 

“A Boeing trabalhou diligentemente nos últimos dois anos para concluir a transação com a Embraer. Há vários meses temos mantido negociações produtivas a respeito de condições do contrato que não foram atendidas, mas em última instância, essas negociações não foram bem sucedidas. O objetivo de todos nós era resolver as pendências até a data de rescisão inicial, o que não aconteceu”, disse Marc Allen, presidente da Boeing para a parceria com a Embraer e operações do grupo. “É uma decepção profunda. Entretanto, chegamos a um ponto em que continuar negociando dentro do escopo do acordo não irá solucionar as questões pendentes”.

 

“Ficamos surpresos com a decisão da Boeing em não dar andamento à parceria estratégica que estávamos negociando desde 2017. (...) A Embraer buscará uma compensação da Boeing para recuperar as perdas resultantes do Acordo Global da Operação (MTA)”, disse Francisco Gomes Neto, presidente da Embraer, em vídeo na internet.

A parceria planejada entre a Boeing e a Embraer recebeu aprovação incondicional de todas as autoridades reguladoras necessárias, com exceção da Comissão Europeia.

 

A Boeing e a Embraer manterão seu contrato de equipe principal existente, originalmente assinado em 2012 e ampliado em 2016, para comercializar e apoiar mercados para o jato militar C-390 Millennium (Boeing Embraer - Defesa), na qual a Embraer terá uma participação de 51% e a Boeing os 49% restantes. 

 

“A Embraer acredita firmemente que a Boeing rescindiu indevidamente o Acordo Global da Operação (MTA) e fabricou falsas alegações como pretexto para tentar evitar seus compromissos de fechar a transação e pagar à Embraer o preço de compra de U$ 4,2 bilhões. A empresa acredita que a Boeing adotou um padrão sistemático de atraso e violações repetidas ao MTA, devido à falta de vontade em concluir a transação, sua condição financeira, ao 737 MAX e outros problemas comerciais e de reputação”, disse a empresa brasileira em um comunicado à imprensa.

 

Depois da quebra de acordo, a Embraer abriu processo de arbitragem contra a Boeing, algo que estava previsto no contrato, caso a parceria não fosse concretizada. A intenção da companhia é buscar o pagamento dos investimentos feitos na preparação da divisão comercial à Boeing, da ordem de R$ 485 milhões, segundo informou a empresa em um comunicado direcionado ao mercado e acionistas. A companhia também enfrenta queda na demanda do E2, que faz parte da sua nova linha comercial.

 

A disputa deverá ser submetida e resolvida por arbitragem administrada pelo Centro Internacional para Resolução de Disputas (ICDR). A arbitragem também deverá ter como sede a cidade de Nova Iorque e ser resolvida com base nas leis de lá.

 

O advogado Erico Carvalho, sócio da Advocacia Velloso, acredita que na arbitragem as duas companhias podem pedir compensações.

“A opção por tornar litigiosa a relação pode ser um caminho de mão dupla. Embora os detalhes do litígio não sejam públicos, a Embraer deve ter argumentos fortes para iniciar o procedimento arbitral contra a Boeing. Mas também é possível, a depender dos termos contratuais, que a Boeing apresente ao Tribunal Arbitral pedido reconvencional solicitando compensação da Embraer pelo não atendimento de certas pré-condições, na linha da fundamentação divulgada pela empresa norte-americana para a rescisão da joint venture”, afirma.

O especialista ainda destaca que, no caso de vitória da Boeing, também é possível que o Superior Tribunal de Justiça venha a ser futuramente chamado a homologar a sentença arbitral proferida pelo ICDR como primeiro passo para a sua execução em território nacional.

Para Suhel Sarhan Júnior, especialista em Direito Empresarial, a Boeing não apresentou um motivo concreto para o rompimento com a Embraer. A solução para a empresa brasileira será a busca de novas parcerias.

 

“A companhia pode ficar isolada, mas já há especulações de uma parceria com companhias chinesas. A Embraer tem know how, mas terá que se associar para fechar contratos futuros”, afirma.

 

De acordo com Sérgio Fogolin, sócio de Corporate e Finance do escritório SiqueiraCastro, a Boeing rescindiu o contrato de forma intencional. “Os americanos tinham que aportar um valor grande [US$ 4,2 bilhões], mas não tinham de onde tirar”.

 

Segundo o especialista, a repercussão do fim da joint venture é pior para a Boeing do que para a Embraer. “Os brasileiros perdem mercado, mas não vão perder tanto. A Embraer teve uma postura pró-mercado, sai fortalecida e pode ser um ativo interessante para empresas asiáticas”, diz.

 

Nos Estados Unidos, a Boeing enfrenta uma das maiores crises de sua história, com os acidentes do 737 Max e a crise causada pelo coronavírus no setor aéreo em todo mundo. Há inclusive a possibilidade de que o governo americano auxilie a companhia para evitar uma possível falência.

 

Em São José dos Campos, no interior de São Paulo, onde fica a sede da Embraer, o Sindicato dos Metalúrgicos comemorou o fim do acordo e pediu que a companhia fosse reestatizada. "A Embraer é um patrimônio nacional estratégico para o país e não precisa de aliança com parceiros internacionais para sobreviver."

 

Segundo fontes ligadas ao governo brasileiro, a ala militar também comemorou a quebra do acordo. Eles defendem cuidado na política de privatizações, acreditam que o setor é estratégico e eram contra a transferência de tecnologia para os norte-americanos.

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