Acordo de não persecução penal poderá valer para condenados

STF deverá decidir a questão ainda neste semestre. MPF recomenda ANPP antes da denúncia/Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
STF deverá decidir a questão ainda neste semestre. MPF recomenda ANPP antes da denúncia/Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Tema, que está sendo analisado pelo STF, não atingirá quem comete crimes contra mulheres.
Fecha de publicación: 21/03/2022

Mesmo se decidir por autorizar o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) após o trânsito em julgado, o Supremo Tribunal Federal (STF) não deverá estender o benefício a criminosos condenados por violência doméstica ou reincidentes. A questão remete a um dos principais debates do judiciário neste início de ano. A Suprema Corte julga o caso de uma pessoa já sentenciada que pede o direito ao acordo.

A advogada Cecília Mello lembra que o acordo de não persecução penal, introduzido pela Lei Federal nº 13.964/19, (especialmente art. 28-A do CPP) foi mais um passo na evolução da justiça consensual criminal que se iniciou com a implementação das medidas de transação penal e a suspensão condicional do processo. 

“O acordo de não persecução penal tem largo alcance em relação às infrações penais previstas em nosso ordenamento jurídico. Com a sua celebração - e cumprimento - deixa de haver uma condenação penal e todas as consequências que dela decorrem, constituindo nova causa de extinção da punibilidade”, explica. 


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Eneida Orbage Taquary de Britto, professora de Direito da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília, explica que, antes ou depois da denúncia, a regra de aplicação da ANPP continua não valendo para alguns casos específicos, como por exemplo se for cabível transação penal de competência dos juizados especiais criminais ou se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional. 

“Também não terá direito aquele que tiver sido beneficiado nos anos anteriores ao cometimento da infração e, finalmente, em situações de crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino”, afirma.

O caso tem ganhado repercussão. Recentemente, o subprocurador-geral da República Wagner Natal manifestou à Suprema Corte um pedido do Ministério Público Federal (MPF) para que o ANPP fique restrito ao ato de recebimento da denúncia. Segundo ele, a finalidade desse tipo de acordo é evitar que se inicie o processo e não se justifique a sua composição.

Natal acredita que o STF entende a Lei 13.964/2019, no trecho em que instrui o ANPP, como Lei Penal de Natureza Híbrida. Dessa forma, a norma tem, ao mesmo tempo, natureza processual, ao estabelecer a possibilidade de composição entre as partes para evitar a instauração de uma ação penal, e natureza material, com a possibilidade de extinção da punição de quem cumpre tudo o que estiver determinado no acordo.

Mas o ideal, segundo Eneida Brito, é a aplicação do ANPP após o recebimento da denúncia, com fundamento no princípio da retroatividade da lei mais benigna, extraído do texto constitucional, art. 5º, inciso XL, que diz que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu, observadas todas as demais condições. "O princípio constitucional assegura um direito fundamental, um direito humano, consagrado em todas as nações democráticas”, diz a professora.

Para Cecilia Mello, “é de extrema importância registrar a existência de um consenso no sentido de que as normas processuais que versem sobre garantias penais devem obedecer à regra da retroatividade da lei mais benéfica, em decorrência do princípio do favor rei. O cumprimento do ANPP gera nova hipótese de extinção da punibilidade, adequando-se ao conceito de norma processual com conteúdo material, portanto, de aplicação retroativa”, argumenta.

A advogada acredita que o julgamento, que deverá se dar em harmonia com o art. 5°, XL, da Constituição Federal, tende a conceber a aplicação retroativa do ANPP para os processos em curso, reabrindo, inclusive, a possibilidade de confissão. 


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Após o trânsito em julgado

A Corte julga o caso, que começou no Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), de uma pessoa condenada devido ao porte ilegal de uma arma de fogo. Em apelação à segunda instância, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a defesa pontuou que houve constrangimento ilegal constante porque foi negado o direito ao acordo, sendo que o réu possuía todos os requisitos previstos no 28-A, do Código de Processo Penal (CPP).

O ministro Olindo Menezes negou o pedido, alegando que não cabe retroatividade do artigo, após recebida a denúncia. Manteve a decisão, reiterando que “o ANPP incide aos fatos ocorridos antes da entrada em vigor da Lei 13.964/2019, desde que ainda não tenha ocorrido o recebimento da denúncia”. Recorrendo à última instância, agora, a defesa quer a total anulação da decisão do TJSC, além da intimação do MP para propor o ANPP ao paciente.

Os advogados reiteram, ainda, que não há jurisprudência consolidada acerca do ANPP retroativo, somente uma decisão da 1ª Turma do STF, no HC 191.64/SC, que serviu de paradigma para a denegação da ordem.

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