Brasil quer diminuir violência contra as mulheres com mais penalidades

Maria da Penha lutou para que seu ex-marido fosse a julgamento por agredi-la / Edilson Rodrigues/ Agência Brasil
Maria da Penha lutou para que seu ex-marido fosse a julgamento por agredi-la / Edilson Rodrigues/ Agência Brasil
Leis que mudaram o Código Penal aumentam a rede de proteção, mas violências continuam.
Fecha de publicación: 24/11/2021

Desde 1999, quando a ONU (Organização das Nações Unidas) fixou o dia 25 de novembro como o dia internacional de luta contra a violência contra a mulher, a legislação brasileira tem avançado sobre a necessidade de combater este tipo de crime. O esforço é bem-vindo, uma vez que ajuda a combater um problema quase endêmico no país: de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2020 o país registrou um caso de homicídio contra a mulher a cada seis horas e meia. Ao final do ano, eram 1.350 casos.

A abordagem, no entanto, também encontra barreiras. Parlamentares indicam que, por mais importantes que sejam as mudanças legais, a abordagem é por demais focada em punições e menos na prevenção dos crimes cometidos por homens contra mulheres. 


Veja também: Câmara vai atrás do AirBNB e similares para custear fundo de turismo


Há também a sensação de que boas leis não são aplicadas em todo o território nacional. “Tem se priorizado responsabilizar e punir o agressor, criar novos tipos penais e aumentar a pena”, explica a deputada Talíria Petrone (PSOL). “E tem ficado um pouco para trás o que é a prevenção da violência contra a mulher. Se a gente entende que a violência é construída socialmente e que há uma desigualdade de gênero que constrói nosso país, com a ideia de que a mulher é mais sensível e o homem é mais durão, isso acaba por produzir violências mais para frente.” 

“O menino adolescente que rouba um beijo numa menina numa festa”, exemplifica a deputada. “O mecanismo que faz o menino achar que pode tocar no corpo dessa menina é o mesmo mecanismo que faz o homem achar que possa impedir uma mulher de usar uma roupa, e agredir essa mulher por não usar essa roupa. E essa agressão gera mais agressão e morte.”

O mais lembrado destes dispositivos é a Lei Maria da Penha (11.340/2005), nomeada em homenagem à farmacêutica do Ceará que lutou para que seu ex-marido fosse a julgamento por agredi-la. O texto aprovado pelo Congresso inova ao regulamentar o que é a violência doméstica e violência familiar contra a mulher, garante assistência à mulher e determina como deve ser o atendimento policial às vítimas deste tipo de violência. O texto legal têm sido atualizado desde então - a mais recente em julho deste ano - retirando do lar o homem que possa demonstrar risco iminente de violência. 

Outra norma mais recente, mas que teve iguais efeitos na sociedade, é a Lei 13.104, que desde 2015 institui o crime de feminicídio no Código Penal. A partir desse momento, o crime contra a mulher simplesmente por razão de sua existência passou a ser caracterizado pela presença de violência familiar e desprezo ao gênero. A lei também prevê um aumento de ⅓ da pena se o crime é cometido contra grávidas, idosos, jovens ou na presença de filhos e pais da vítima.

As inovações jurídicas nascidas por casos de violência contra a mulher acabam, às vezes, transformadas em leis que atendem a toda a população. Um exemplo claro ocorreu nesta terça-feira (23), quando o presidente Jair Bolsonaro sancionou a chamada “Lei Mari Ferrer”, nomeada em homenagem à modelo que acusa ter sido estuprada em uma boate em Santa Catarina.

Motivado pelo julgamento do caso - quando Mari foi destratada em público pelo advogado do suposto estuprador, sem ser defendida pelo juiz ou pela promotoria - o Congresso aprovou uma nova lei para garantir que, em audiências de instrução e julgamento, todos os participantes devem zelar pela integridade física e psicológica das vítimas, independente do caso.

Autora da proposta que virou lei, a deputada Lídice da Mata (PSB-BA) ocupa o cargo de segunda procuradora-adjunta da Mulher na Câmara dos Deputados. A parlamentar  disse que o que houve foi um aumento de consciência sobre a questão da violência de gênero. “O Congresso, como um todo, em particular a bancada feminina, se voltou para a votação de projetos que buscam melhorar o atendimento às mulheres, combater a violência e adaptar a Lei Maria da Penha a esta realidade”, diz.

“E esta pauta ganhou ainda mais visibilidade durante a pandemia”, ressalta a parlamentar, lembrando que o isolamento agravou os casos de violência contra a mulher, tanto pelo fato de, no isolamento social, elas estarem mais com seus agressores, como pela dificuldade de efetuar as denúncias. “Ainda há muito a ser feito no que se refere à legislação de proteção e defesa das mulheres, pois uma coisa é aprovar as leis; outra é garantir, na prática, sua plena efetivação e aplicabilidade”. 

A deputada considera a Lei Maria da Penha como importante, mas que ainda não é totalmente executada em todo o país.

A deputada Talíria Petrone defende que a penalização deve vir com maior capacidade no orçamento para adoção de medidas de prevenção, assim como estratégias desde a infância, como campanhas contra a violência de gênero. “Infelizmente a gente está bastante atrás do que seria o ideal em relação a estes temas”, reconhece a deputada. 


Leia também: ProUni e políticas de educação estão em risco com reformas tributárias?


Nesta semana, os deputados devem se apressar em votar uma pauta específica para o tema: há um projeto que permite incluir os programas de combate e prevenção de violência contra a mulher como modalidade de projeto apoiado pelo Fundo Nacional de Segurança Pública; outra matéria propõe a concessão de auxílio aluguel a mulheres em condições de vulnerabilidade social vítimas de violência. 

Apenas uma dessas propostas está realmente pronta para ser votada, para ampliar a pena dos crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria) e ameaça cometidos no contexto de violência doméstica e familiar contra mulher. O Senado, no entanto, não tem nenhum debate sobre o tema em vista. Tanto a Câmara quanto o Senado farão sessões especiais para tratar do dia.

Add new comment

HTML Restringido

  • Allowed HTML tags: <a href hreflang> <em> <strong> <cite> <blockquote cite> <code> <ul type> <ol start type> <li> <dl> <dt> <dd> <h2 id> <h3 id> <h4 id> <h5 id> <h6 id>
  • Lines and paragraphs break automatically.
  • Web page addresses and email addresses turn into links automatically.