Um ano movimentado como poucos antes, 2021 agora abre espaço ao que promete ser um dos mais definidores momentos da história do país: uma eleição que indica ser marcada por uma dura polarização entre esquerda e extrema-direita ocorre em um momento que o país, abalado social e economicamente, tenta sair da pandemia mais mortal em 100 anos.
Então não é um exagero dizer que 2022 será um ano, sim, especial. Mas temas de interesse para escritórios de advocacia merecem um olhar especial. Pensando nisso, LexLatin ouviu três advogados especialistas na capital federal para entender o ano que se passou, e as expectativas que é possível ter para o próximo ano.
Um último olhar sobre 2021
A sócia do Machado Meyer em Brasília, Cristiane Romano, aponta o ano de 2021 como aquele onde o governo apresenta ao Legislativo uma série de medidas para conseguir ter mais caixa, quase sempre sem sucesso. “A Reforma Administrativa é tímida, não anda, pois não se consegue tirar privilégios da administração pública e servidores públicos”, ponderou. “Em vez de arrumar essa casa, se vai em busca de mais dinheiro para sustentar essa casa pesada.’
A advogada entende que o Supremo passou a adotar um viés bastante fazendário em matéria tributária, julgando pró-fisco na maioria das vezes. Apesar de vitórias importantes - como a conclusão da tese sobre o ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins, em maio, as vitórias dos contribuintes seriam compostas por peculiaridades - como a definida em dezembro: a Corte formou maioria para impedir a majoração do ICMS para o setor de energia elétrica e telecomunicações. A tese, no entanto, vai valer apenas a partir de 2024, uma modulação inédita segundo a advogada.
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Para Cristiane, o retorno aos trabalhos presenciais em 2022 mostrará o quanto a pandemia alterou no dia a dia dos tribunais. A nova rotina semipresencial, na visão da advogada, tornou mais difícil de conseguir acesso aos magistrados para audiência, e julgamentos com mecanismos que atrapalham o trabalho da defesa.
“A parte fica sem saber como está se desenrolando o seu julgamento”, indica a sócia do Machado Meyer. “Há dificuldade muito grande de acesso aos ministros”, afirma, referindo-se ao caso da Suprema Corte- “fora isso, o julgamento virtual é somatória de votos, e não há um debate efetivo - o ministro coloca o voto lá e vai fazer suas coisas.”
Um freio no ímpeto liberalizante
Para 2022, por maior que seja o ímpeto reformista dos 513 deputados e 81 senadores, estes parlamentares dificilmente irão votar temas estruturantes ou que requerem grandes debates. “Em ano de eleição não é comum o Congresso votar propostas estruturantes, pois geralmente envolvem medidas impopulares, como por exemplo, a reforma administrativa, que pode contrariar interesses de servidores públicos”, lembra o sócio do Perdiz de Jesus Advogados, Rodrigo Neiva Pinheiro.
A PEC 32/2020, que propõe a reformulação do serviço público, já encontrou dificuldades no ano passado e muito dificilmente entrará em pauta até o final deste ano. Um novo parlamento, menos liberalizante como o atual, poderia enterrar a proposta de maneira definitiva. Outro exemplo que naufragou foi o PL 591/2020, que trata da privatização dos serviços postais. A proposta perdeu tração após um dos principais pontos da proposta ficar sem sentido: os Correios registraram lucro líquido de R$1,9 bilhão em 2020, e não seria um fardo (e sim um ativo) ao poder público.
O sócio da Ana Frazão Advogados, Angelo Prata, concorda com a avaliação - mas, para ele, certas questões acabam sendo incontornáveis. “Os parlamentares certamente virão a enfrentar questões relevantes cujas discussões já estão em curso, como é o caso do Marco Legal da Inteligência Artificial”, lembrou.
O Projeto de Lei 21/2020, que estabelece fundamentos, princípios e diretrizes para o desenvolvimento e a aplicação da inteligência artificial no Brasil foi aprovado na Câmara dos Deputados em setembro do ano passado. A matéria agora segue para o Senado - que, este ano, deve ter apenas um terço de sua composição renovada. Com mais parlamentares focados em suas atividades, isso aumenta a chance de projetos mais complexos serem levados à votação.
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Nas cortes superiores
Nos tribunais, Rodrigo aponta alguns temas que devem atrair a atenção neste novo ano: o STF deve concluir o julgamento do marco temporal das terras indígenas; e o STJ pode julgar o tema 987, que decide se, no Marco Civil da Internet, deve se exigir a prévia e específica ordem judicial de exclusão de conteúdo para a responsabilização civil do provedor de internet, websites e aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos praticados por terceiros.
Outra questão que deve passar pelos escaninhos do Superior Tribunal de Justiça é se a lista de procedimentos de cobertura obrigatória para os planos de saúde, instituída pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), é exemplificativa ou taxativa. O caso está suspenso para vista da ministra Nancy Andrighi.
Angelo Prata, do Ana Frazão Advogados, lembra de um caso que também foi afetado pela sistemática dos recursos repetitivos: a discussão sobre a possibilidade de fechamento unilateral de contas correntes, recentemente afetada para o julgamento pelo rito dos recursos repetitivos irá passar pela 2ª Seção da Corte, que julga direito privado.
Cristiane não indica casos ou teses específicas, mas aposta em um aumento das causas políticas no Plenário da Suprema Corte. “Serão eleições muito polarizadas e, de parte a parte, de posições muito aguerridas sem muita abertura para um diálogo”, diz.
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