Câmara acelera discussão de um já apressado Código Eleitoral

Câmara começou a debater o código em fevereiro, e quer colocá-lo em prática em 2022/ Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Câmara começou a debater o código em fevereiro, e quer colocá-lo em prática em 2022/ Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Texto com 900 artigos está em tramitação há seis meses e meio e vai à Plenário
Fecha de publicación: 02/09/2021

A Câmara dos Deputados tem demonstrado que quer aprovar projetos de lei de relevância enquanto há tempo e capital político para isso. Prenunciando um ano de 2022 onde as eleições tiram grande parte das negociações no Congresso, deputados têm no radar próximo de votações a Reforma Administrativa do serviço público, além de parte da reforma tributária. Os deputados já buscaram, há duas semanas, retomar as coligações nas eleições.

Nesta quinta-feira (2), a Câmara havia se preparado para uma longa sessão para aprovar, de uma vez, o Código Eleitoral. A proposta, que em sua versão mais recente tem 905 artigos, busca unificar toda a legislação eleitoral e substituir o texto antigo, sancionado em 1965 pelo então presidente Humberto Castello Branco, o primeiro da ditadura militar.


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A vontade de passar o projeto era tanta que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), indicou que a votação poderia ocorrer durante todo o dia, com suspensão de sessão se necessário, até que pontos polêmicos fossem acordados. A gana em aprovar rapidamente a proposta acabou sendo punida pela própria pressa em aprovar reformas.

Este pequeno atraso não esconde o fato de que a proposta do Código Eleitoral (PLP 112/2021) teve uma tramitação muito rápida, sem muitos debates - que foram limitados por conta da pandemia de Covid-19. O projeto começou a ser desenhado em fevereiro deste ano, quando Arthur Lira - então em seus primeiros dias como presidente - designou a correligionária Margarete Coelho (PP-PI) para comandar a comissão especial que analisaria o tema. Advogada eleitoral, Margarete comanda a produção do relatório, que deve ser apresentado na próxima semana em Plenário.

A comissão fez apenas sete audiências públicas em um período de cerca de 35 dias. Foram ouvidas, de maneira virtual, advogados, especialistas em eleições e membros de plataformas virtuais como o Google. O texto teve sua primeira versão publicada apenas no início de agosto e, com 372 páginas, busca regulamentar diversos temas, como a organização das eleições, debates eleitorais pela TV e mesmo crimes relacionados ao processo eleitoral.

O artigo 882 do texto prevê o crime de “divulgar ou compartilhar, a partir do início do prazo para a realização das convenções partidárias, fatos que sabe inverídicos ou gravemente descontextualizados, com aptidão para exercer influência perante o eleitorado”. Quem espalhar fake news, de acordo com a nova legislação, poderia ser punido com um a quatro anos de prisão, pena que pode ser aumentada se agravantes forem constatadas, tal como fake news contra as urnas eletrônicas e o processo eleitoral.

A pressa incomodou alguns líderes partidários. A deputada Adriana Ventura (Novo-SP) recorreu à presidência da Câmara para pedir que o texto fosse analisado com mais calma, passando também pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). 

Um projeto de código não é similar a outras leis; seu objetivo é coordenar e sistematizar as relações jurídicas de natureza igual”, argumentou a parlamentar no requerimento. “Portanto, não são leis aleatórias colocadas sob o mesmo número de lei; ao contrário, ele é elaborado sobre a mesma base jurídica e de princípios para, a partir daí, ter suas normas e regras reunidas e concatenadas, de forma a dar um quadro regulatório harmônico para um determinado assunto.”

A professora de direito eleitoral e constitucional Ana Cláudia Santano concorda que a proposta tem méritos ao uniformizar a lei, permitindo que se elimine distorções e contradições em normas já existentes. Ela, no entanto, também se mostra preocupada com o excesso de rapidez das mudanças - que, se aprovadas até outubro pelo Senado, podem valer em parte para as eleições do ano que vem.

Fica difícil dizer que o texto é maduro, pois não temos a versão final dele. A gente vê que existe um ânimo pela aprovação do texto, mas esse ano não está aberto a todas e todos, e existe muita incerteza sobre o texto”, pondera a professora. 

Muitas versões foram apresentadas e elas são diferentes entre si. Se antes existia um Código que existia para uniformizar a lei, essa proposta passa a trazer questões que são inéditas. São temas que eventualmente podem não estar maduros justamente por este ineditismo”. Questionada, Ana Claudia diz que esta pressa pode resultar em maior judicialização do tema na Suprema Corte.


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A professora lembra que, se o texto fosse pensado para começar a valer apenas em 2024, não haveria maiores problemas, uma vez que haveria tempo de se sedimentar algumas questões. “O que se vê também é uma pressa devido ao princípio da anualidade do artigo 16 da Constituição. Só que, se há uma pressa por conta deste prazo, este projeto deveria ter vindo antes”, argumenta. “Se ele só veio agora, a apreciação do conteúdo não pode ser prejudicada por conta do artigo 16.” 

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